Mães são investigadas por permitir abusos contra filhos no ES
Segundo dados do Ministério Público do Estado, 70% dos casos de abuso sexual infantil são praticados por familiares das vítimas

“Não fale com estranhos!” Esta é uma orientação que a maioria das famílias ensina desde cedo, para as crianças, para tentar protegê-las de abusos e outras violências.
Mas, e quando quem deveria proteger os menores se omite e permite que sejam violentados e espancados? Uma realidade cada vez mais comum é que mães estão sendo investigadas por permitir abusos e espancamentos de filhos.
“A mãe tem o dever de cuidado, proteção e vigilância sobre seus filhos. O abuso sexual é uma realidade muito mais complexa para a criança e o adolescente quando ocorre dentro do seu ciclo de proteção”, afirma o dirigente do Centro de Apoio Operacional Criminal, do Ministério Público do Estado (MPES), promotor de Justiça Ronald Gomes Lopes.
De acordo com o promotor, 70% dos casos de abuso sexual infantil são praticados por familiares das vítimas.
A adjunta da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), delegada Sabrina Kiesel Schons, afirma que há casos em que mães são investigadas por omissão sobre abusos sexuais e também sobre espancamentos.
Ela observa que são os homens que cometem a maioria desses crimes e que a omissão, muitas vezes, ocorre devido à dependência em relação ao companheiro.
“Muitas vezes, essa mulher tem uma dependência financeira e emocional deste parceiro, se omite e não denuncia”, afirma.
De acordo com dados da Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), atualmente 28 mulheres estão presas, no Estado, pelo crime de estupro de vulnerável.
Tanto a delegada quanto o promotor dizem que quando há a omissão a pessoa responde como coautora do crime.
“Se ela se omite, ela entra como coautora do crime, por ter o dever de proteção. Porém, cada caso deve ser analisado, pois há casos que a mulher não denuncia por estar sendo também vítima de violência”, destaca o promotor Ronald Gomes Lopes.
As denúncias, então, partem de vizinhos, das escolas e de hospitais onde a criança recebe atendimento.
“A criança começa a se isolar, apresenta depressão e apresenta lesões, que podem ser reiteradas, são coisas que chamam a atenção”, observa o promotor.
Mãe condenada com padrasto
A mãe de duas menores foi condenada por omissão dolosa diante dos abusos que elas sofriam por parte do padrasto. O caso, que ocorreu em Montanha, Norte do Estado, foi divulgado na semana passada, pelo Ministério Público do Estado, que apresentou a denúncia.
A Justiça condenou o padrasto por estupro de vulnerável e estupro qualificado, a 53 anos, 2 meses e 2 dias de reclusão, em regime inicialmente fechado.
Em razão da continuidade delitiva contra vítimas distintas, foi aplicada a regra do concurso material, artigo 69 do Código Penal à mãe, condenada por omissão dolosa, à pena de 48 anos e 9 meses de reclusão, em regime fechado.
Ministério Público lança campanha para alertar crianças

Tão importante quanto alertar toda a sociedade sobre a violência contra crianças e como denunciar abusos e espancamentos, é informar às próprias vítimas como identificar possíveis violações de que possam ser alvos.
Diante dessa realidade, o Ministério Público do Espírito Santo (MPES) está desenvolvendo uma ação específica, com a divulgação da campanha “Guardiões da Infância”, que será lançada ainda este ano.
De acordo com o dirigente do Centro de Apoio Operacional Criminal do MPES, promotor de Justiça Ronald Gomes Lopes, a campanha visa orientar crianças nas escolas, em parceria com os municípios.
“Uma das atividades será a exibição de um desenho nas escolas, para informar sobre comportamentos estranhos. Por exemplo, que as partes íntimas não podem ser tocadas, que a criança não deve ser filmada nua, alertar sobre os comportamentos que precisam ser denunciados, independentemente de quem é o autor”, explica.
Ronald Lopes destaca que a campanha, que ainda não tem data para ser lançada, é uma orientação para as crianças e toda a rede de apoio que envolve os menores. O promotor informa ainda que o MPES recebe denúncias pelo 127 e site da Ouvidoria do MPES: https://ouvidoria.mpes.mp.br
SAIBA MAIS
Crimes
Mães estão sendo investigadas por permitir abusos e espancamentos de filhos.
Junto com os pais, elas têm o dever de cuidado, proteção e vigilância sobre seus filhos.
70% dos casos de abuso sexual infantil são praticados por familiares das vítimas.
Além dessa violência, há ainda situações em que as crianças são espancadas.
Prisões
Atualmente, 28 mulheres estão presas no Estado pelo crime de estupro de vulnerável.
O crime é definido no artigo 217-A do Código Penal.
Art. 217-A: Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos: Pena - reclusão, de 10 a 20 anos.
Quando há a omissão, a pessoa responde como coautora do crime.
Onde denunciar
Ciodes 190: em caso de flagrantes.
Disque denúncia 181 - através deste número a população pode fazer denúncias ou repassar informações que ajudem as polícias em investigações. O anonimato é garantido.
O serviço pode ser acessado também na internet, no: https://disquedenuncia181.es.gov.br/
Delegacias de Polícia Civil: denúncias podem ser feitas, presencialmente, em qualquer delegacia.
Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente ( DPCA): Rua Lizandro Nicoleti, s/nº. Jucutuquara - Vitória-ES, de 8h às 18h.
Ouvidoria do mpes: no 127 e https://ouvidoria.mpes.mp.br
Disque 100: é um serviço de utilidade pública do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania para denunciar violações de direitos de pessoas em vulnerabilidade.
Conselhos tutelares.
Fonte: Especialistas e pesquisa AT.
“Pais possuem a obrigação legal de zelar pelos filhos”, analisa Cássio Rebouças, advogado criminalista

“No Direito Penal brasileiro é possível atribuir responsabilidade pela prática de um crime a pessoas que, embora não tenham praticado diretamente os fatos, tinham ‘por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância’ e deviam (e podiam) ‘agir para evitar o resultado’ (art. 3, § 2º, do Código Penal).
O caso clássico de ‘dever de cuidado’ é o dos pais, que possuem esta obrigação legal de zelar pelos filhos.
Assim, da mesma forma como um pai ou mãe podem responder por homicídio (e não apenas uma omissão de socorro) caso vejam um filho se asfixiando e, podendo, não o socorram, a mãe que tem o dever legal de evitar um estupro do(a) filho(a) por parte do companheiro (ou quem quer eu seja) e, podendo, não o faz, responde pelo resultado uma vez que a omissão dolosa, diante de dever legal de agir, equivale à ação.
É nesse contexto que se inserem os casos de mulheres presas por estupro de vulnerável ou maus-tratos, não apenas como autoras diretas, mas também como responsáveis por não impedir a agressão.”
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