A ciência que nasce no quintal
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Toda vez que eu chego em Santa Teresa, na Região dos Imigrantes, sinto que estou entrando num daqueles lugares que misturam história e natureza de um jeito que a gente não encontra em nenhum outro canto do Espírito Santo. E basta atravessar o portão do Instituto Nacional da Mata Atlântica para perceber isso. Ali, onde um dia funcionou a antiga chácara da família de Augusto Ruschi, tudo parece vivo. Como se a floresta tivesse memória própria.
Caminhar por esse espaço é entender por que Ruschi virou referência mundial quando o assunto é beija-flor. Eles cruzam a nossa frente como pequenos clarões coloridos — verdes, azuis, rubros — e transformam o jardim do museu em um espetáculo contínuo. E, enquanto a gente observa, pesquisadores trabalham para desvendar perguntas simples e profundas: esses pássaros ficam aqui todos os dias? Viajam? Quando voltam? Como vivem?
Para responder isso, o Instituto desenvolveu um sistema moderno de monitoramento, que usa microchips minúsculos e leitores automáticos espalhados pelo jardim. Sem capturas frequentes, sem estresse para as aves. É a tecnologia ajudando a decifrar segredos que o próprio Ruschi sonhou estudar, mas nunca pôde acompanhar de forma contínua.
E o mais interessante é que esse projeto não para nos beija-flores. Ele abre caminho para algo maior: a ciência cidadã. Aos poucos, moradores da cidade e produtores rurais serão convidados a participar, instalando pequenos leitores em suas casas, observando o comportamento das aves e compartilhando informações. Santa Teresa está transformando a pesquisa em uma construção coletiva.
E essa rede não se limita ao céu. Nos quintais, os sapos também contam histórias — literalmente. Cada espécie tem um canto único, e o projeto “Cantoria de Quintal” convida as pessoas a gravarem esses sons com o celular. Já apareceram registros raros, espécies ameaçadas e até ocorrências que os cientistas nem imaginavam.
Nas trilhas e pomares, outra equipe acompanha os primatas. Moradores anotam quando o macaco-prego aparece no pomar, quando o sagui da serra cruza uma cerca, quando muriquis passam silenciosos pela mata. Os dados ajudam a entender a saúde das populações, a conservação das florestas e a convivência com as plantações.
E confesso: poucas coisas me emocionam tanto quanto ver ciência e campo juntos. Porque quando o produtor rural participa, não só ajuda a pesquisa — ele vira parte dela. Ele se reconhece como guardião da biodiversidade com que convive todos os dias.
Santa Teresa mostra, com simplicidade e grandeza, que o conhecimento não nasce só nos laboratórios. Nasce também no quintal, no terreiro, no pomar, no silêncio da mata… e na boa vontade de quem decide participar.
Neste domingo (30), eu te levo para viver tudo isso no Programa Negócio Rural, na TV Tribuna / Band.
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