Desportiva faz denúncia de fraude e acusa empresário
Presidente do clube acusou ex-parceiro em sociedade de usar o estádio Engenheiro Araripe como “garantia em dívidas pessoais ou empresariais”
Escute essa reportagem
O estádio Engenheiro Araripe, em Cariacica, está no centro de uma investigação criminal. O Ministério Público Estadual (MP-ES) encaminhou à delegacia de Vila Velha investigação para apurar possível estelionato em um leilão da propriedade.
A denúncia foi feita pela Desportiva Ferroviária, clube historicamente ligado ao estádio.
Leia mais sobre Esporte Capixaba
Marcelo Villa-Forte de Oliveira, principal executivo da Villa-Forte & Oliveira Empreendimentos e Participações S/A, antigo parceiro da Desportiva na sociedade que resultou na criação da Desportiva Capixaba, teria, segundo os documentos, usado supostamente o imóvel do clube como garantia para saldar dívidas pessoais ou empresariais.
“Ele tentou vender algo que não é dele. Na época da formação da Desportiva Capixaba, em 1999, a Desportiva Ferroviária entrou com 49% do capital, e o grupo dele entraria com 51%. Nós integralizamos de imediato os 49%, mas ele não integralizou a parte dele. Houve um pedido de dissolução da sociedade em 2012, e em 2014 a dissolução ocorreu. O grupo dele só pagou 10%”, disse o presidente da Desportiva Ferroviária, Carlos Farias.
O presidente afirma que Marcelo teria, em 2022, contratado uma empresa de leilões e tentado realizar um leilão sem autorização judicial.
“Ele tentou vender algo que não é dele. Ele se apresentou como presidente da Desportiva, só que a Desportiva Capixaba está dissolvida desde 2014. O que ele fez, para nós, foi criminoso. Fomos ficar sabendo do leilão três dias antes”.
Segundo documentos a que a reportagem teve acesso, as acusações são de que o estádio estaria sendo usado por Marcelo como garantia para quitação de dívidas pessoais ou de empresas, em acordos negociados até com a Fazenda Nacional.
Farias diz ter sido surpreendido com uma ordem de desocupação do estádio, feita pelo administrador judicial Vener Corrêa. Ele destaca que há pedidos à Justiça que ainda aguardam avaliação, incluindo propostas de locação do estádio e pagamentos de parte das dívidas da Desportiva Capixaba.
“Não houve decisão judicial ainda. Ele está pegando uma emissão de maio de 2023 para fazer isso. No dia 1º, o juiz deu 15 dias para que as partes formulassem questões, e estamos aguardando manifestação do juiz após isso. O administrador judicial, na verdade, não quer aguardar a decisão judicial”.
Farias diz que o administrador judicial “não é imparcial” e que Marcelo pretende retomar o estádio para shows. “Desde que esse administrador entrou, o foco dele é vender o estádio. Inclusive, o Marcelo tem acordo com a Fazenda Nacional para reduzir as dívidas de suas empresas, mas esse acordo até agora não foi executado pelo administrador”.
“Meta é desestabilizar”, diz advogado sobre acusação
Representante da empresa Villa-Forte & Oliveira Empreendimentos e Participações S/A e do empresário Marcelo Villa-Forte de Oliveira, o advogado Rubens Laranja Musiello afirmou que não há ato ilícito que justifique a denúncia da Desportiva Ferroviária ao Ministério Público.
Segundo Musiello, essa denúncia é uma forma de mudar o foco da situação, da desocupação do estádio Engenheiro Araripe. “Não existe ato criminoso. O objetivo é desestabilizar a parte contrária. O Marcelo já se defendeu e em breve vamos ver que não terá nada”, disse.
O advogado disse também que o esvaziamento da área do estádio não está sendo cumprido: “Hoje (segunda-feira, 13) o advogado Sávio Corrêa Simões esteve lá para o cumprimento de um ato natural do processo liquidante, mas foi impedido por diretores da Desportiva. Então foi colocado no portão o número do processo, que é público”.
Sávio representa a sociedade que criou a Desportiva Capixaba e acompanha as ações do perito, também conhecido como liquidante: “Tivemos uma reunião na quinta-feira passada para informar sobre o fechamento do estádio”.
Presidente nega que clube tenha dívida de R$ 800 milhões
O presidente da Desportiva Ferroviária, Carlos Farias, negou que o clube esteja com dívidas de “quase R$ 800 milhões”. Segundo ele, a dívida do clube gira em torno de R$ 5 milhões a R$ 6 milhões.
“Ele (Marcelo Villa-Forte) tirou esse número (R$ 800 milhões) da cabeça dele. A dívida das empresas dele que são grandes, mas estão longe de um valor tão alto: eram de R$ 153 milhões e ele fez um acordo com a Fazenda Nacional para reduzi-las a R$ 50 milhões, e deu como garantia metade de uma jazida de minério localizada em Brumadinho (MG)”, afirma.
Além disso, outro ponto controverso envolve a presença de duas escolas localizadas na área que se pretende leiloar.
“Era do Sindicato dos Ferroviários e passou para a prefeitura, que investiu muito dinheiro lá. Curiosamente, ele mandou desocupar o estádio, mas não as escolas que estão lá. A gente não quer que as escolas saiam dali, mas é preciso explicar o motivo de só a Desportiva Ferroviária ter de desocupar o local”, afirma Farias.
Segundo os advogados da Villa-Forte & Oliveira Emprendimentos, o acesso à escola não seria interrompido durante o ano letivo e que esse tema é assunto de outro processo que tramita na Justiça Estadual.
Entenda o caso
Panorama histórico
Para explicar essa história, é necessário voltar 25 anos. Em 1999, o grupo Villa-Forte & Oliveira e a Desportiva Ferroviária firmaram uma parceria e transformaram a “Tiva” em Sociedade Anônima, nascendo assim a Desportiva Capixaba.
No acordo entre as partes, o clube ficou com 49% das ações da S.A., pagando com o próprio patrimônio, incluindo o estádio, enquanto o grupo prometeu 51% a serem pagos em dinheiro, um total de R$ 1.040.910,00.
A promessa do grupo foi pagar 10% de forma imediata, enquanto os outros 41% seriam pagos em 20 parcelas mensais de R$ 30 mil e, além disso, o acordo também incluía a construção de um posto de gasolina no valor de pouco mais de R$ 330 mil.
Mas o grupo pagou apenas os 10% prometidos, ou seja, R$ 104.091. Após diversos problemas, os sócios desfizeram a parceria em 2014, quando o grupo decretou falência.
Mesmo não tendo cumprido o acordo, Marcelo Villa-Forte, proprietário da empresa ex-sócia da Desportiva, teria colocado o estádio como garantia em “diversas penhoras de suas dívidas”, segundo os documentos da denúncia feita pelo clube.
Nomeação e leilão
Ano passado, a justiça nomeou como liquidante judicial do processo de dissolução, que tramita na 2ª Vara Cível de Cariacica, um liquidante judicial que é auditor do Estado.
Segundo o presidente da Desportiva Ferroviária, o auditor teria omitido que é servidor público, informação que poderia ser motivo para que uma das partes bloqueasse sua nomeação, já que por lei não poderia exercer funções paralelamente em âmbito privado.
Também no ano passado, Villa-Forte teria tentado leiloar, de forma extrajudicial, o estádio Engenheiro Araripe, sem a ciência da Desportiva Ferroviária.
Desde a dissolução da sociedade, as partes estavam à espera da nomeação de um novo liquidante judicial, o que ocorreu neste ano. Com a liquidação judicial, será possível entender quais são os direitos das partes com relação ao patrimônio.
Fontes: Carlos Farias, advogados do caso e pesquisa A Tribuna.
Comentários