Especialistas explicam quando reclamar do vizinho
Assunto veio à tona após internauta receber de vizinha uma carta pedindo que parasse de andar de sutiã dentro de casa
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Usando X (antigo Twitter), uma internauta compartilhou um bilhete que recebeu de uma vizinha. A mensagem dizia: “Gostaria de pedir para a senhora parar de transitar em sua casa de sutiã, somos evangélicos e meu marido fica em casa de home office. Tenha decência”.
Mas, afinal, essa reclamação poderia ser feita? Buscando essa resposta, a reportagem ouviu juristas, que apontaram exemplos não somente sobre o caso específico.
Presidente da Comissão de Direito Condominial da Ordem dos Advogados do Brasil seccional capixaba (OAB-ES), Leidiane Malini, conta que já se deparou com um caso parecido no Estado.
Vizinhos se queixavam de um morador do prédio ao lado que constantemente ficava sem roupas em seu apartamento. “É um caso complexo, mas que a princípio não configura qualquer infração legal, uma vez que as pessoas têm o direito de ficarem sem roupa no interior de suas casas, isso quer dizer que não há muito o que se fazer”.
Nessas circunstâncias, como ela orienta, é importante informar ao vizinho que é possível visualizá-lo sem roupas na sua unidade. “Até porque, muitas vezes, as pessoas não têm sequer consciência dessa possibilidade, mas isso não quer dizer que se possa obrigá-lo a fechar as janelas ou deixar de se vestir como quer dentro do seu espaço privado, inclusive com roupas íntimas, como foi o caso compartilhado nas redes sociais”.
Segundo Gedaias Freire da Costa, que é advogado e presidente do Sindicato Patronal de Condomínios e Empresas Administradoras de Condomínio do Estado (Sipces), qualquer cidadão pode reclamar do vizinho desde que tenha prova do fato e que ele cause danos a saúde, segurança e sossego. “Nesse caso pode notificar o vizinho e, caso continue, ajuizar uma ação”.
Segundo ele, barulho, até mesmo com toques nas paredes, estão entre as queixas de moradores.
Gilberto Raizem Spalenza, advogado especialista em Direito Civil e Processual Civil, destaca que o Código Civil oferece poucos dispositivos para regular os direitos entre vizinhos ou condôminos, limitando-se a listar algumas situações gerais e proibitivas.
“Nesse sentido, é crucial considerar as particularidades de cada conflito, as normas internas de cada condomínio e, sobretudo, aplicar o bom senso”.
Alarme disparado
Na madrugada do último domingo (18), uma moradora ficou revoltada com um alarme do carro de vizinhos que disparou em um condomínio em Coqueiral de Itaparica, em Vila Velha. O causador do barulho, segundo o síndico profissional Leonardo Nascimento, foi um gato que circulava no estacionamento do condomínio.
“A moradora desceu e quebrou o carro do vizinho todo e fez uma gritaria danada. Foi registrado um boletim de ocorrência e será aplicada uma multa, cujo valor está sendo definindo pela assessoria jurídica, mas deve ser algo em torno de R$ 600, além dos prejuízos causados”.
Barulho e cigarro
Recentemente, a advogada Leidiane Malini atuou em duas situações que são muito corriqueiras quando falamos de vizinhos: barulho e cigarro.
“Em ambos os casos, os vizinhos estavam em conflito. No primeiro, um acusava o outro de fazer muito barulho em horários impróprios. E no segundo, um reclamava da fumaça do cigarro do outro que fumava em sua unidade”, contou.
A saída adotada pelo condomínio foi reunir os envolvidos e buscar uma solução conjunta. “Nem sempre essa ação é efetiva, sobretudo quando uma das partes não está suscetível a acordos, mas muitas vezes um processo judicial é evitado com esse tipo de iniciativa”.
Tire suas dúvidas
1- Quais são os tipos de queixas que o vizinho pode fazer?
Os condôminos podem fazer queixa de qualquer situação que entendam ser contra a convenção, regimento interno ou até mesmo a lei, como destaca a presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB-ES, Leidiane Malini.
A partir disso, caberá à administração, na figura do síndico verificar se a reclamação é, de fato, uma infração às normas internas ou à lei.
Ela ressalta que caso a queixa seja feita por processo judicial, o julgamento ficará a cargo de um juiz, logicamente. Mas é importante lembrar que nem toda queixa tem fundamento, por isso é imprescindível, caso seja uma reclamação à administração de um condomínio, uma análise criteriosa, imparcial e técnica da situação apresentada.
2- Quais são as principais reclamações?
Barulho, como de festas em área de lazer, cigarro, animais, vagas de garagem (carros maiores que a vaga, acidentes e furtos), objetos que caem na varanda do vizinho, obras irregulares e uso das áreas comuns.
O barulho também é bastante discutido na Justiça, não apenas de som alto depois das 22 horas e sim durante o dia, como salienta Gedaias Freire da Costa, que é advogado e presidente do Sindicato Patronal de Condomínios e Empresas Administradoras de Condomínio do Estado.
3- Vizinhos têm direito de reclamar de pessoas peladas em apartamento?
Esse tema divide opiniões. No entendimento de Gilberto Raizem Spalenza, advogado especialista em Direito Civil e Processual Civil, por exemplo, há sim direito do condômino que se sentir lesado reclamar de conduta alheia aos bons costumes, como prescreve o artigo 1.336, IV, do Código Civil.
No entanto, ele reforça que a melhor opção é sempre o diálogo com o condomínio vizinho. “Acaso não haja possibilidade de conversa, a reclamação pode ser direcionada a administração do prédio ou, eventualmente, partir para a tentativa de resolução judicial da questão.
4- É importante saber quais regras constam no regulamento?
No caso dos moradores de condomínios residenciais, é fundamental que avaliem as especificações contidas no regulamento interno antes de apresentar qualquer reclamação, como sugere o advogado Gilberto Raizem Spalenza.
O Código Civil garante ao vizinho prejudicado o direito de exigir o fim de interferências que afetem sua segurança, sossego e saúde, causadas pelo uso da propriedade vizinha.
Isso inclui solicitar a remoção de objetos pendurados no muro divisório que invadam seu terreno ou que, mesmo não invadindo, causem prejuízos à sua saúde, sossego ou segurança. Além disso, a lei ensina que raízes, ramos e galhos de árvores que ultrapassem os limites do prédio vizinho podem ser cortados pelo proprietário do terreno invadido até o plano vertical divisório.
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