Chuvas no Sul do ES: Heróis em meio à tragédia evitaram mais mortes
Familiares, vizinhos e até mesmo pessoas anônimas arriscaram a vida para resgatar quem estava nas enchentes
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Diante de um cenário de guerra, olhares desolados, choros de quem perdeu tudo, verdadeiros heróis se destacam e mostram que o que há de mais importante em um momento como este é salvar vidas e ajudar a minimizar a dor daqueles que terão que recomeçar.
No cenário, entram vizinhos que arriscaram a vida para resgatar quem estava nas águas e até mesmo pessoas anônimas de todos os cantos do Espírito Santo.
Só que nem todos os heróis poderão contar a sua história ou ganhar um abraço de agradecimento, pois na luta para salvar, alguns perderam a vida.
É o caso do aposentado José Ricardo Queiroz, de 65 anos, que morreu em Apiacá na madrugada do último sábado (23), ao tentar socorrer uma tia acamada.
A prima de José Ricardo, a vendedora Jacira Neto, de 47 anos, contou que ele sempre cuidou da tia e de um sobrinho especial.
“Quando a água começou a subir, ele foi na casa da tia, que estava com a cuidadora em casa. Ainda se disponibilizou a ajudar a levantar os móveis da loja da minha irmã”.
Segundo Jacira, no entanto, não deu tempo. “A cuidadora contou que José Ricardo colocou minha tia primeiro em cima de uma mesa, mas começou a subir mais. Então eles colocaram ela em uma cadeira do papai pois ficaria mais fácil de empurrar se eles tivessem de nadar. Lá pelas duas horas ele chegou a ligar para pedir socorro, mas não tinha como ninguém atravessar por causa da correnteza na rua”.
Jacira revelou que José Ricardo, que tinha problema cardíaco, começou a passar mal. “Ele estava apavorado. Foi um grande herói, o tempo todo pensando em ajudar, segurando a cadeira em que a tia estava, mas ele não resistiu”.
Em Mimoso do Sul, a cidade mais atingida, as histórias de quem se arriscou em meio às águas e lama para ajudar quem precisava eram muitas.
O comerciante Carlos Magno Rodrigues, de 58 anos, na segunda (25) só conseguia agradecer justamente esses heróis anônimos, que se disponibilizavam a ajudar a todos.
Do supermercado dele, nada sobrou. “Não se aproveita nada. A água atingiu o teto e até as lâmpadas estão com água”.
Para ele, apesar da perda, a solidariedade que tem visto é “inacreditável”. “Tem pessoas que eu nunca vi na minha vida ajudando. Tem horas que a gente fica até com vergonha de ver a vontade que as pessoas vieram de trabalhar, pois as vezes a gente perde a força em meio a tantas perdas”.
Os números
- 19 mortes foram confirmadas até ontem
- 65 anos é a idade do aposentado que morreu tentando socorrer tia acamada
Grávida é salva dentro de geladeira
Grávida de oito meses de Maria Cecília, a dona de casa Elivanda de Souza Brandão, de 18 anos, viveu uma experiência em Mimoso do Sul que jamais irá esquecer.
Em um momento de desespero, o seu marido, o pedreiro Rulian Dias Amaral, 20 anos, colocou a esposa dentro de uma geladeira da sua casa e, junto com ela, lutou para sobreviver.
Apesar do sufoco, o casal sobreviveu, mas perdeu tudo o que tinha dentro de casa, inclusive o enxovalzinho do bebê.
À reportagem, Elivanda descreveu os momentos que passou como desesperadores.
O pedreiro também é um dos heróis, pois momentos antes ele tinha saído de casa nadando para salvar vizinhos, inclusive um cadeirante.
“Eu só sabia chorar e gritar para o meu marido voltar para dentro de casa, pois a água estava subindo muito rápido. As coisas estavam tombando. Eu gritava por socorro”, contou Elivandra.
Quando o pedreiro retornou para casa, a água já estava batendo no peito dele. “Foi a hora que ele tirou tudo da geladeira e me colocou dentro para me tirar de casa”.
Elivanda conta que nunca imaginou vivenciar uma cena como essa e descreve: “Eu estava chorando, desesperada. O meu esposo foi nadando, empurrando a geladeira e segurando a mão. Eu fiquei com medo da geladeira virar”.
Depois de nadarem por cerca dois quilômetros, a geladeira virou e, mesmo sem saber nadar, ela conseguir bater os braços e escapar. Para ela, não resta dúvida: “Foi Deus. A minha barriga pesava, a correnteza estava muito forte, mas eu só pedia a Deus para a gente sobreviver e hoje estamos aqui. Foi um milagre, eu não canso de repetir”.
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