Retrocesso ou avanço? A exclusão do cônjuge da herança
Reforma do Código Civil propõe mudanças polêmicas na sucessão e na herança
O Projeto de Lei nº 4 de 2025, em tramitação no Senado Federal, traz a mais ampla proposta de reforma do Código Civil desde sua entrada em vigor, em 2002. Elaborado a partir de estudos de uma comissão de juristas coordenada pelo ministro Luís Felipe Salomão, o texto pretende atualizar institutos jurídicos diante de novas realidades sociais, econômicas e tecnológicas.
Entre os pontos mais sensíveis, estão as mudanças nas regras de sucessão, que afetam diretamente o destino do patrimônio após a morte e exigem maior atenção da sociedade.
O projeto reduz a parte da herança reservada obrigatoriamente aos herdeiros necessários, chamada legítima, de 50% para 25%. A alteração amplia a liberdade do testador, que poderá dispor de até 75% dos seus bens conforme sua vontade. Na prática, pais e mães terão maior margem para beneficiar determinados filhos, instituições ou terceiros, sem ficarem tão presos à divisão igualitária. Por outro lado, críticos alertam para o risco de desequilíbrios patrimoniais e potenciais litígios familiares.
Outro ponto polêmico é a exclusão do cônjuge e do companheiro do rol de herdeiros necessários. Hoje, em determinadas situações, o viúvo ou viúva concorre com descendentes e ascendentes. Caso a reforma seja aprovada, sua proteção sucessória será limitada apenas à meação, isto é, à parte que lhe cabe conforme o regime de bens do casamento ou união estável. Se não houver disposição testamentária em seu favor, pode acabar afastado da herança. Para especialistas, a mudança representa um retrocesso na valorização da família conjugal, enquanto defensores alegam que a medida reforça a autonomia privada e evita conflitos entre cônjuges e descendentes.
O texto inova ao incluir expressamente os bens digitais no rol de patrimônio sucessível. Contas em redes sociais, senhas de acesso, criptomoedas e ativos digitais poderão ser herdados, respeitada a privacidade do falecido. Outra novidade é o reconhecimento de filhos concebidos por reprodução assistida após a morte de um dos genitores como herdeiros legítimos.
A reforma também prevê hipóteses de exclusão de herdeiros por abandono afetivo ou falta de assistência, reconhecendo juridicamente condutas que rompem laços familiares essenciais. Essa previsão responde a demandas sociais por maior responsabilização, mas abre espaço para debates sobre critérios objetivos e provas em casos tão delicados.
Os impactos vão além das normas técnicas. Se por um lado amplia a autonomia individual, por outro impõe à sociedade a necessidade de repensar o planejamento sucessório. Sem testamento ou instrumentos societários, cônjuges e companheiros podem ficar desprotegidos, o que deve estimular a procura por orientação jurídica. A reforma do Código Civil, caso aprovada, exigirá das famílias maior organização patrimonial e reflexão sobre o futuro de seus bens.
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