Abusos psicológicos e agressões: crimes contra crianças surpreendem a polícia
Abusos psicológicos, agressões físicas e lesões corporais são alguns casos relatados por quem lida com o problema diariamente
Escute essa reportagem

Crimes contra crianças e adolescentes muitas vezes são “invisíveis”, pois dificilmente têm testemunhas e são praticados contra pessoas vulneráveis. Entre eles, estão abusos psicológicos, agressões físicas e casos ainda mais graves, como lesão corporal, que resultam até em morte.
Mesmo lidando diariamente com esse tipo de violência, os casos surpreendem a polícia, o Ministério Público do Estado e os conselhos tutelares – além da própria sociedade.
“Até hoje a gente fica surpreendida, em razão da gravidade”, afirma a delegada Thais da Cruz, adjunta da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).
Jéssika Lima da Luz é promotora de Justiça da Infância e Juventude de Vitória e subcoordenadora do Núcleo de Proteção aos Direitos da Juventude. Ela conta que o abuso sexual é o crime mais frequente contra essas vítimas. E há outros, que também a chocam.
“Até hoje me emociona quando eu lembro. A criança chegou toda machucada de cigarro, tinha menos de 3 anos. Uma das formas de violação era essa: a pessoa queimava a criança com cigarro”, afirma.
O conselheiro tutelar da Região I (Itacibá), em Cariacica, Marcos Paulo Fonseca, conta que, na semana passada, uma criança de 4 anos relatou na escola que estava sendo violentada pelo pai, e o conselho a encaminhou para acholhimento.
“As escolas têm papel fundamental. Às vezes, as crianças nem sabem que estão sendo submetidas a abusos e violência. Elas contam sem ter o conhecimento de que são vítimas. Há aquelas que precisam de atendimento psicossocial para relatar o que sofrem”.
A violência também se reflete em números. Os homicídios de bebês e crianças de até 4 anos cresceram 15,6%, em 2023 (170 casos), em relação a 2022 (147) no País, aponta o Atlas da Violência 2025, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
O Estado teve aumento de 25%, de 2022 (4 casos) a 2023 (5 casos), segundo o Atlas. Dados da Secretaria de Estado da Segurança apontam queda de 15,4% das lesões corporais em crianças abaixo de 12 anos: 435 (2023) para 368 (2024).
Menina revela estupro em desenhos
No lugar da voz, traços e letras. Sem conseguir dizer nem sequer uma palavra sobre a violência sexual que sofria dentro de casa, uma menina de 7 anos revelou, na escola, os abusos que sofria por parte do próprio pai.
Ela fez de quatro páginas em branco, por meio de seus desenhos e frases, o seu pedido de socorro.
“A menina pediu as folhas para a professora, pois ela queria se expressar sobre o abuso”, afirma o conselheiro tutelar da Região I (Itacibá), em Cariacica, Marcos Paulo Fonseca.
Em todos os desenhos, a menina escreve ao lado “PAI” ou “PAPAI” e “EU”. “Ela representou a si e ao pai em mais de uma situação de abuso”, destacou o conselheiro tutelar.
Em uma das folhas, a menina desenhou um pênis e o rosto de uma criança assustada.
Em outro papel, a criança desenhou a representação de duas figuras humanas, uma maior do que a outra.
Em um primeiro desenho, a mão esquerda do homem estava ligada ao órgão sexual dela. Na segunda representação, as duas pessoas desenhadas se beijam na boca. A figura da criança, apesar de ser ainda menor que a primeira, está na mesma altura do pai, mas sem que seus pés toquem o chão.
Há ainda a frase “beijo de língua”, seguida da palavra “triste”.
Uma terceira folha de papel foi usada pela menina. Ela desenhou uma criança deitada em uma cama e um homem de pé, na frente, com os braços direcionados a ela.
Outros dois papéis foram usados. Em um deles, ela somente escreveu que o pai disse que iria continuar com os abusos e, em outra, escreveu que sentia dores e que o pai batia nela e na mãe.
O caso aconteceu no ano passado e chocou o conselheiro. “O pai foi preso e a menina está com a mãe”, afirma Marcos.
O conselheiro, a delegada Thais da Cruz e a promotora de Justiça da Infância e Juventude Jéssika Lima da Luz reforçam a importância das denúncias para proteger crianças e adolescentes.
“Precisa se envolver, sim, quando vê uma criança sendo agredida, ou quando ouve alguma coisa no vizinho, ou quando suspeita de algum familiar”, diz Jéssika da Luz.
Denúncias podem ser feitas no 181, Disque 100, 190 (flagrante) ou no disquedenuncia181.es.gov.br
Saiba mais
Homicídios
Crianças de 0 a 4 anos
Brasil
Aumento de 15,6%
2022 - 147
2023 - 170
Espírito Santo
Aumento de 25%
2022 - 4
2023 - 5
Crianças de 5 a 14 anos
Brasil
Redução de -2%
2022 - 348
2023 - 341
Espírito Santo
Redução de -33,3%
2022 - 12
2023 - 8
Fonte: Atlas da Violência 2025
Espírito Santo - criança (abaixo de 12 anos)
Lesão corporal
Redução de -15,40%
2023 - 435
2024 - 368
2025 - 117 (até março)
Lesão corporal seguida de morte
Variação 0%
2023 - 1
2024 - 1
2025 - 0 (até março)
Homicídios de crianças
2024 - 12
2025 - 1 (até abril)
Homicídios de adolescentes
2024 - 57
2025 - 13 (até maio)
Fonte: Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp)
Casos
Suspeito de violentar menina de 3 anos
Um idoso, 84, foi preso suspeito de estuprar uma menina, de 3 anos, no dia 6, na Serra. A criança disse à mãe que ele a beijou na boca, mostrou os órgãos genitais e passou a mão nas partes íntimas dela.
Os pais da vítima acionaram a polícia. Na delegacia, o idoso negou, mas foi autuado por estupro de vulnerável e foi para o presídio.
Prisão por morte de menina de 1 ano
A Justiça aceitou, em maio, a denúncia do Ministério Público do Estado contra a mãe, Juliele Vieira de Amorim, de 25 anos, e a companheira da mãe, Myllena Carla Andrelino, de 27 anos, por crime contra Maria Isis Vieira de Amorim, de 1 ano e 10 meses, por estupro de vulnerável, tortura e homicídio.
O caso ocorreu em Colatina, Noroeste do Estado. Também foi decretada a prisão preventiva delas.
Sobrinhos de 2 e 4 anos sofrem abuso sexual
Um suspeito de estuprar os sobrinhos – um menino de 2 e uma menina de 4 anos – no banheiro de uma lanchonete, em Vila Velha, foi preso em abril.
Clientes estranharam quando ele entrou no banheiro com as crianças, e acionaram a PM ao escutar gritos do menino. O tio foi autuado em flagrante por estupro de vulnerável (2x) e resistência, pois teve de ser contido.
MATÉRIAS RELACIONADAS:




Comentários