Risco financeiro: sucesso como influencer é privilégio para poucos
Sonho pode virar uma ilusão, tanto pela demanda de trabalho necessária para se ter sucesso, quanto pela concorrência no setor

A profissão de influenciador digital se tornou um dos grandes sonhos da nova geração de jovens: já é o desejo de 75% da população com até 29 anos no País, segundo levantamento feito pela consultoria Nielsen.
Porém, ter sucesso com a atividade é privilégio para poucos. E o sonho vira uma ilusão maior do que a de outros desejos de jovens e adolescentes, tanto pela demanda de trabalho necessária para se ter sucesso, quanto pela concorrência no setor, já que há pode “faltar produto” para tantos influenciadores venderem com seus conteúdos.
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Um estudo realizado pela Kantar mostrou que avanços tecnológicos, como as Inteligências Artificiais, mudanças nos hábitos de consumo e uma maior demanda por alinhamento das marcas a pautas sociais tornou o trabalho de influenciadores mais concorrido e complexo.
“Cada vez mais, consumidores compram não apenas produtos, mas histórias, verdades e coerência. A autenticidade está valendo mais do que o alcance”, conta o empreendedor Carlos Busch.
A influenciadora digital Aline Zanardo, que já atua no ramo há dez anos, conta que muitos jovens subestimam certas exigências que são essenciais para o sucesso na área.
“O influenciador tem de atuar basicamente como um empreendedor. Exige muita disciplina e organização. É preciso montar sua própria agenda, definir seus horários, ter uma rotina e responsabilidade com prazos. Muitos jovens entram nesse ramo de qualquer jeito e acabam tendo grandes decepções”.
A ilusão de obter o mesmo sucesso de outros influenciadores digitais acaba afetando a saúde mental de jovens que não compreendem que a profissão, além de concorrida, exige muita disciplina.
“Vivemos em uma era que estimula a busca por reconhecimento rápido. A promessa de fama, flexibilidade e ganhos elevados atrai os jovens, que precisam entender que ser influenciador de sucesso é exceção, e não regra”, disse o mentor de carreiras e consultor de desenvolvimento humano Elias Gomes.
Psiquiatra com especialidade na área da infância e adolescência, Rodrigo Eustáquio Telles Vieira explica que “sonhos da juventude”, ao não se perpetuarem, podem causar grande impacto na saúde mental dos jovens, especialmente em uma geração imediatista.
“Estamos em uma geração imediatista. Não é à toa que os casos de depressão, ansiedade e estresse em crianças e adolescentes têm aumentado significativamente”, conta.
Jovem que tentou se tornar influenciador: “Decepção e ansiedade forte”
Um jovem estudante de Economia desistiu de ser influenciador digital após sofrer com crises de ansiedade e se decepcionar com o baixo retorno financeiro. Ele conversou com a reportagem e contou sua experiência.
A Tribuna - Sobre o que era o conteúdo que você produzia?
Influencer - Eu tinha um site, rede sociais e até um podcast voltado para luta-livre profissional, que é mais conhecida no País com o nome de Telecatch ou WWE. Até chegamos a ter mais de 13 mil seguidores no X.
Você chegou a ter ganhos?
Inicialmente, eu tentei buscar formas de viver exclusivamente daquilo. Mas as únicas ofertas que tive foram de sites de apostas, mas eu não queria aceitar aquelas ofertas.
E o que te fez desistir?
Acabei abandonando o projeto porque comecei a sentir uma ansiedade muito forte com tudo isso, e a decepção estava me atrapalhando até para estudar. Tive de escolher e optei por focar na faculdade.
Caminho duro até o sucesso
Esgotamento
O trabalho como influenciador digital tem causado esgotamento, depressão e ansiedade entre quem atua na área, ao ponto de muitos chegarem a desistir ou a pelo menos considerarem a possibilidade.
Pesquisa global da agência Billion Dollar Boy mostrou que mais da metade dos influenciadores digitais sofrem de síndrome de burnout e já cogitou em algum momento desistir da carreira. Esse burnout é causado pori nstabilidade financeira, fadiga criativa e alta pressão.
A Sindrome de Burnout é um estado de esgotamento físico, mental e emocional causado por estresse crônico no trabalho, resultando em cansaço extremo, desmotivação, cinismo e ineficácia. Os sintomas incluem fadiga, dificuldade de concentração, alterações de humor, e podem manifestar-se fisicamente com dores, problemas gastrointestinais, insônia e fraqueza do sistema imunitário.
Trabalho duro
Para muitos, o influenciador não consegue simplesmente “desligar”. Eles são a marca e o produto, e isso gera uma cobrança permanente. Sem uma equipe de apoio, o desgaste só aumenta.
Muitos cogitam desistir
Segundo o relatório “Creator Burnout” da Vibely, 71% dos criadores de conteúdo na internet já pensaram em desistir de atuar na área por conta do Burnout. De acordo com a Vibely, as causas mais citadas do burnout entre criadores são:
Mudanças nos algoritmos (65%);
Dificuldade para ganhar a vida (59%);
A necessidade constante de pensar em novas ideias e atuar nas mais diversas plataformas (51%);
Ansiedade com o número de seguidores (51%);
Ódio e bullying online (42%);
Síndrome do impostor (29%);
e Reações negativas (backlash) (19%)
Vida dupla
Se os jovens pensam ser possível viver exclusivamente de ganhos com as redes sociais, levantamentos recentes mostram que a realidade é mais difícil do que isso: pesquisa da Wake Creators, publicada em março do ano passado, mostrou que só 9% dos influenciadores no Brasil conseguem viver exclusivadamente dessa renda.
Análise
“Liberdade só vem com planejamento financeiro”

“O que tem levado muitos jovens a não trabalharem como CLTs e, consequentemente não contribuírem com o INSS, é o discurso da independência. Eles querem ser livres para escolher, mas no fim das contas atuam como MEIs em um local que usa o trabalho deles da mesma forma que um celetista, só que sem os direitos trabalhistas que eles poderiam ter se fossem CLTs.
Ou seja, não há planejamento ou cuidado com o próprio futuro. Muitos não fazem um planejamento para terem reservas financeiras, o que deveria ser fundamental para quem quer trabalhar por conta própria. É um paradoxo, pois é uma geração que fala sobre liberdade, mas não está fazendo planejamento para ser livre. Claro que há exceções.
Isso se torna um problema não só para eles, mas para as empresas, porque os empresários, que batalharam pela flexibilização das regras trabalhistas, acabaram vendo isso virar contra si, já que justamente por isso, há dificuldade em se conseguir trabalhador de carteira assinada”.
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