Aumento de benefício por invalidez depende do STF
Regra do cálculo da aposentadoria por invalidez foi alterada e provoca perda de até 40%. Julgamento do caso ainda sem data
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Uma decisão do início deste mês paralisou os processos que questionam a validade de uma regra que mudou o cálculo da aposentadoria por invalidez e, segundo aposentados, provocou perdas de até 40% no benefício.
Agora, o Supremo Tribunal Federal (STF) deverá decidir se a regra em vigor após a reforma é constitucional ou não. Apenas depois desse julgamento, as ações em curso no Judiciário poderão ser continuadas, seguindo a decisão proferida pela Corte Suprema.
O sobrestamento, ou seja, a interrupção dos processos foi definida pela Turma Nacional de Uniformização (TNU), vinculada ao Conselho da Justiça Federal (CJF).
As ações judiciais contestam o modelo de cálculo implementado pela reforma da Previdência de 2019, que alterou a base dos salários são utilizados para contabilizar o valor a ser pago e o percentual tirado da média.
No modelo de cálculo anterior a 2019, o valor recebido pelos aposentados que tiveram a incapacidade permanente atestada por um perito médico e concedida pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) era definido pela média de 80% dos maiores salários desde julho de 1994, recebendo 100% desse valor.
Com a reforma promovida durante a gestão do ex-presidente Michel Temer, o cálculo passou a ser em cima de todas as remunerações do período, ficando estabelecido como remuneração 60% da média desses salários.
O valor do benefício hoje chega a ser menor do que o pago para quem recebe o benefício por incapacidade temporária, o antigo auxílio-doença, relatou a advogada previdenciarista Julya Lagassi.
“Há muitos casos onde o segurado recebia um auxílio-doença pré-reforma em um valor e quando se aposentou por invalidez após a reforma, seu benefício foi drasticamente diminuído, pois, além de alterar o coeficiente de pagamento, ainda foi alterada a base de cálculo”.
A advogada Adriana Bramante, do conselho do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), contestou a diferença entre os benefícios. “Acho incompreensível a gente ter uma pessoa com incapacidade total e permanente, em grau que deixa a pessoa incapaz para o trabalho, com renda menor do que a que recebe um benefício temporário”.
Até o momento, o tema não tem data para ser apreciado pelo STF.
Redução de R$ 680 por mês
O aposentado por invalidez Jomy Moraes Ferreira, de 66 anos, conta ter sentido a redução do benefício de aposentadoria por invalidez após a mudança na Justiça. Com renda mensal de R$ 1.420, o segurado afirma que, pela regra antiga, deveria estar recebendo hoje pelo menos R$ 2.100, considerando a remuneração que tinha quando estava empregado. Hoje, tem perda mensal de R$ 680.
“Coloquei (o caso) na mão do advogado, mas até hoje não saiu. A justificativa que ele dá é que o Alexandre de Moraes (ministro do STF) ainda não julgou. O que eu sei é que era para estar ganhando um salário e meio”, relata.
Jomy teve uma perna amputada após um acidente de trabalho, em janeiro de 2.000. Hoje, usa uma prótese e toma remédios regulares.
"É uma enorme injustiça"
O coordenador do Sindicato dos Aposentados, Pensionistas e Idosos no Espírito Santo (Sindnapi-ES), Jânio Araújo, ressaltou que aposentados por invalidez precisam desses recursos para realizar o tratamento da própria condição de saúde.
“É uma enorme injustiça. Pela própria natureza da aposentadoria, esse aposentado precisa ter um benefício melhor, até mesmo para poder conseguir sobreviver com essa invalidez, pois passa a ter um gasto muito maior”, comentou.
Aposentados vêm procurando o sindicato, segundo Araújo, para saber o que pode ser feito em relação às perdas no benefício. “O que estamos fazendo é aguardar o julgamento do STF para ver qual é a orientação”, relata.
A advogada previdenciarista Julya Lagassi, que representa clientes que contestam a forma de cálculo, apontou que o cálculo da aposentadoria por idade é o mesmo da aposentadoria por invalidez e questionou a incoerência.
“Não faz o menor sentido, tendo em vista que o segurado que se aposenta por invalidez necessita de cuidados muito maiores que o que aposenta por idade. É perceptível que aqueles que se aposentaram após a reforma tiveram grande prejuízo”, diz.
Análise
"Existem casos de desrespeito ao princípio da isonomia"
É incongruente que uma pessoa com incapacidade temporária passe a receber, na grande maioria dos casos, um valor maior do que uma pessoa que fica incapacitada permanentemente. Isso fere o princípio da isonomia.
Outro ponto questionado é o desamparo com diminuição drástica do valor do benefício do segurado que se encontra doente, ou seja, no momento em que mais precisa do seguro social. Com isso, há violação do princípio da vedação ao retrocesso social, além de não observar a razoabilidade e proporcionalidade.
Com o sobrestamento desse tema pela Turma Nacional de Uniformização (TNU) de Jurisprudência, todos os processos do País com valor de causa acima de 60 salários-mínimos, terão que aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal que unificará as decisões. O grande problema é que muitas vezes o STF demora para julgar os casos sobrestados, sendo que ainda não há uma data definida para o Supremo julgar essa matéria.
Com a paralisação desses processos, o segurado pode ficar longo período sem parte considerável da verba que possui em caráter alimentar, e com isso, fica sem atendimento de suas necessidades básicas.
Fique por dentro
O que mudou
A aposentadoria por invalidez é um dos benefícios que sofreu maior redução após a aprovação da emenda constitucional 103. Antes, o beneficiário recebia como aposentadoria 100% da média salarial calculada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sobre os seus 80% maiores salários após julho de 1994.
Com a reforma, houve duas reduções. A primeira, no cálculo da média salarial, que agora leva em conta 100% dos salários do trabalhador desde julho de 1994, ou seja, não descarta os 20% menores.
O segundo redutor está no cálculo da própria aposentadoria, que é hoje de 60% da média salarial mais 2% a cada ano extra de contribuição ao INSS que ultrapassar 15 anos, no caso das mulheres, e 20 anos, no dos homens.
Pedido de revisão
Os segurados que se sentem prejudicados pelo cálculo podem acionar a Justiça, mas o processo ficará parado devido à necessidade do julgamento no STF. Se houver decisão final favorável no Supremo, o INSS terá de fazer revisão.
O julgamento do cálculo da aposentadoria por invalidez no STF, porém, ainda não tem data. A ação integra um grupo de outros nove processos, todos sob a relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, hoje presidente do Supremo. Barroso defende a constitucionalidade da reforma da Previdência.
Quem tem direito
A aposentadoria por incapacidade permanente é paga ao cidadão que fica totalmente incapacitado para o trabalho, seja por doença ou acidente.
O benefício é liberado pela perícia médica, ou seja, o segurado do INSS não faz o pedido para ter essa renda.
Se o segurado recuperar a capacidade, volta ao trabalho. Se vier a óbito, o benefício é cancelado, deixando de ser pago pelo instituto.
Uma reavaliação pela perícia médica do INSS é feita a cada dois anos para comprovar a incapacidade.
Fonte: Folha de S. Paulo
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