Apagão de profissionais desafia padarias, construtoras e hospitais no ES
Faltam profissionais para atuar em pelo menos 30 profissões no Estado, o que força investimentos em tecnologia e impede novos projetos

Muita oferta de vagas e pouca procura: a taxa de desemprego no Espírito Santo em 3,1% — menor da série histórica — é um sinal do “apagão” de mão de obra, com empresas de praticamente todos os setores em dificuldades para contratar, sejam profissionais com alta qualificação ou não, em pelo menos 30 áreas.
A escassez engloba funções desde as que exigem maior qualificação, como engenheiros e na área de saúde, até as que exigem menos, como pedreiros, açougueiros, padeiros e garçons
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-ES), Fernando Otávio Campos, relata que o “apagão” ocorre em diversos segmentos, incluindo o dele.
Ele diz que o Estado tem 927 mil empregos formais ativos e vem mantendo saldo positivo de contratações, e há regiões e setores onde as vagas ficam abertas por falta de profissionais disponíveis.
“Não é só problema de qualificação, mas de disponibilidade de mão de obra. Em muitos municípios , há a concorrência direta com a colheita do café, a construção civil e a indústria, que oferecem ganhos imediatos e acabam atraindo trabalhadores”.
Outro fator, diz ele, é o número de beneficiários de programas sociais. “Muitos preferem complementar renda no trabalho informal, até para seguir com o benefício. Por isso, hotéis e empresas deixaram de expandir ou reduziram operações”.
A indústria automotiva também relata falta de profissionais, afirma Eduardo Dalla Mura do Carmo, vice-presidente do sindicato do Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos. “Falta sobretudo mecânicos. Automatizamos onde é possível pela dificuldade com profissionais, e isto aumenta preços”.
O setor de transportes também vive problemas, especialmente com motoristas.
O presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas & Logística (Transcares), Luiz Alberto Teixeira, relata que o setor, via Serviço Social do Transporte e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Sest Senat), chegou a oferecer curso com carteira gratuitos, mas poucos finalizaram.
“Recentemente, abrimos 60 vagas para o curso em Cachoeiro, e 70 pessoas se inscreveram, 50 apareceram no primeiro dia, e só 16 finalizaram o curso. “O problema da falta de mão de obra também envolve eletricista, mecânico, pessoal de escritório, encarregado, conferente... está em todas as funções, não só com motoristas”.
Já na construção civil, Douglas Vaz, presidente do sindicato da indústria do setor (Sinduscon-ES), relata um envelhecimento na mão de obra regional que atua em obras.
“A idade média está aumentando. O número de entrantes para trabalhar é pequeno em relação ao passado”.
Panfleto impresso

A escassez de profissionais tem feito com que algumas empresas adotem a estratégia de anunciar vagas em diversos locais, incluindo por meio de panfletos impressos.
Acima, um panfleto do Grupo Coutinho encontrado pela reportagem no bairro Goiabeiras, em Vitória, descreve os benefícios oferecidos para os trabalhadores, incluindo tíquete-alimentação, plano médico, café da manhã, café da tarde e até almoço.
Pedido por mudanças na CLT

Empresários do Estado defendem mudanças na legislação trabalhista para trazer maior flexibilidade e reduzir a informalidade.
“O sistema atual não satisfaz nem os trabalhadores, nem os empresários”, avalia o presidente do Sindicato dos Restaurantes, Bares e Similares do Espírito Santo (Sindibares), Rodrigo Vervloet.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Estado (ABIH-ES), Fernando Otávio Campos, explica que o regime CLT foi criado em outra realidade e que hoje, em sua avaliação, falta flexibilidade. Ele detalha que a legislação e a carta tributária atual impedem inclusive o crescimento da renda do trabalhador.
“Meu filho teve de passar a atuar no regime de Pessoa Jurídica para poder receber mais de uma empresa de desenvolvimento de software, por exemplo”, conta.
Para a advogada Patricia Pena da Motta Leal, algumas mudanças são urgentes.
Ela cita a ampliação do contrato por hora ou por dia trabalhado, com pagamento proporcional de encargos e direitos; a regulamentação clara do trabalho por demanda, especialmente via plataformas; e o fortalecimento da negociação coletiva para permitir escalas mais flexíveis, sem a rigidez das jornadas fixas previstas na CLT.
“É preciso atualizar o modelo legal sem precarizar: a modernização deve garantir segurança jurídica e viabilidade econômica”.
Profissionais em falta
1. Padeiro
Embora o setor de padarias esteja em crescimento, empresários relatam dificuldade para contratar funcionários e seguimento a projetos de expansão.
o sócio-proprietário da Padaria e Confeitaria Monte Líbano, Flávio Mendes, destaca que há casos em que estabelecimentos como esse, em bairros e estruturas menores, acabam sendo vendidos por não conseguir funcionários para trabalhar.
2, 3, 4 e 5. Açogueiro, embalador, repositor e operador de caixa
As funções estão entre as dez que os supermercados mais empregam, mas mesmo assim, há forte escassez de profissionais. No caso dos açogueiros, o problema é mundial, com empresas da Europa e América do Norte chegando a abrir oportunidades para estrangeiros.
6. Atendente de Loja
Segundo o presidente da Federação de Comércio do Estado (Fecomércio-ES), José Carlos Bergamin, o varejo enfrenta grande dificuldade em contratar profissionais para o atendimento ao público.
“O setor tem perdido também muitos profissionais para outros segmentos e para a informalidade, por exigir presencialidade, inclusive com trabalho aos sábados, e, às vezes, com trabalho noturno e até aos domingos, algo que não é exigido em outras áreas”.
7, 8 e 9. Auxiliar de Cozinha, camareira e recepcionista
Conforme explicou o presidente da ABIH-ES Fernando Otávio Campos, essas profissões são algumas das que mais sofrem com escassez de profissionais no ramo de hotelaria.
10. Motoristas de transporte de carga
A escassez é nacional e foi agravada pelo envelhecimento da frota e pela falta de interesse dos jovens, resultando na perda de profissionais nos últimos anos. Pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT) revela que a falta de motoristas qualificados é o principal entrave para 65% das empresas do setor.
11. Gestor de hotelaria
Fernando Otávio Campos também crescentou que profissionias para gerir hoteis estão cada vez mais escassos. A função, que geralmente exige formação em ensino superior em hotelaria, turismo ou administração, vive uma crise no Estado por falta de mão de obra qualificada.
12, 13, 14, 15, 16 e 17. Pedreiros, carpinteiros, armadores, caldeireiros, eletricistas e montadores
Profissões ligadas à construção civil e à indústria, são funções cada vez mais escassas de se encontrar profissionais.
Segundo o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Espírito Santo (Sinduscon-ES), Douglas Vaz, o envelhecimento na idade média dos profissionais e a falta de interesse dos jovens tem sido, em parte, o motivo dessa situação.
18. Engenheiros civis
O “apagão” de profissionais na construção civil também engloba os engenheiros civis. A área apresentou queda no interesse de jovens e empresas do Estado já relatam dificuldade em contratar e pedem mudanças nos currículos das instituições de ensino
“A escassez é observada no Estado e segue uma tendência nacional, que estima um déficit de aproximadamente 75 mil engenheiros no setor elétrico e da construção civil, impulsionado por evasão universitária e queda no interesse pela graduação”, afirma Elcio Paulo Teixeira, CEO da Heach Recursos Humanos.
19. Mecânicos
Eduardo Dalla Mura do Carmo, vice-presidente do Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos do Estado (Sindirepa-ES), relata que o setor sofre, não só localmente, mas também nacionalmente com a escassez de mecânicos automotivos. Estudo da Oficina Brasil já mostra que uma em cada três oficinas no País sofre com a falta de profissionais especializados.
20. Analista de Logística
O setor, cada vez mais demandado no Estado, sofre com a falta de profissionais qualificados.
21 e 22. Cozinheiros e Garçons
A demanda por cozinheiros não é só dos restaurantes e de bares, mas também da indústria hoteleira. Ambos os setores relatam que há um cenário de escassez de profissionais.
“A situação tem, inclusive, segurado o crescimento de estabelecimentos no Estado. Muitos restaurantes relatam fechamento de turno, porque faltam cozinheiros e garçons”, disse o presidente do Sindibares, Rodrigo Vervloet.
23. Técnicos em manutenção
Segundo Fernando Otávio Campos, os hotéis sofrem com a dificuldade de contratar profissionais para realizar reparos. O problema também é relatado em outros setores.
24, 25, 26 e 27. Desenvolvedores, Especialista em Segurança da Informação, cientista de dados e especialista em IA
O setor de tecnologia tem um déficit de cerca de 24 mil trabalhadores só no Estado, segundo estudo da Brasscom. As áreas citadas são as com maior demanda por profissionais atualmente.
28. Enfermeiros
Tanto enfermeiros quanto técnicos estão em alta demanda no Estado. O problema, aliás, é mundial, com a Organização Mundial de Saúde (OMS) chegando a alertar sobre o tema em agosto.
Alta carga de trabalho e baixas remunerações seriam o motivo do baixo interesse pela área.
29. Cuidador de Idosos
O envelhecimento da população tem feito aumentar a procura por cuidadores. Entretanto, a falta de uma regulamentação da profissão acaba por prejudicar a contratação desses profissionais.
30. Operador de Máquinas
A automação crescente demanda operadores cada vez mais qualificados, e a falta desses profissionais impacta diretamente a produtividade de diversos setores.
Fonte: Empresários consultados pela reportagem e pesquisa AT.
MATÉRIAS RELACIONADAS:




Comentários