Professor paga R$ 150 mil por planta rara do ES
Exclusiva da região Serrana, a espécie é uma das mais desejadas do mundo e não tem sido encontrada no meio ambiente
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Professor de Biologia em Belo Horizonte, Samuel Gonçalves, de 48 anos, é um dos poucos brasileiros que cultiva uma planta chamada Philodendron spiritus sancti. Segundo ele, por ser rara e exclusivamente da região Serrana do Espírito Santo, ele pagou por ela R$ 150 mil.
“Não vou ser hipócrita de dizer que não gosto de planta rara. Eu gosto e quero na minha coleção aquelas que despertam mais desejo”, disse ele, que cultiva cerca de 1.200 plantas em casa.
Samuel é o criador e responsável pelo canal do YouTube “Um botânico no apartamento”, em que exibe plantas de sua coleção e dá dicas de cultivo. A audiência do canal, hoje com 600 mil inscritos, mais do que dobrou durante a pandemia. Em um perfil homônimo no Instagram, ele tem mais de 220 mil seguidores.
O professor até já publicou uma foto ao lado da spiritus sanctis, que descreveu como a planta “mais rara e desejada do mundo” e “o inatingível Santo Graal das plantas”. doutor em Botânica, ele diz ter adquirido a planta de um amigo, que também é colecionador.
“Preciosidade, tesouro, singularidade, originalidade, raridade, extravagância, excentricidade, beleza, santidade”, disse Samuel sobre a espécie, acrescentando que a planta é leiloada no exterior “por valores exorbitantes e quase foi extinta da natureza pelo extrativismo”.
Ele diz ainda que sempre desestimula a retirada de plantas dos ambientes naturais, mas faz uma ressalta: “Toda planta que existe no planeta e é comercializada veio em algum momento da natureza”.
Quando a espécie é pesquisada no Instagram, surgem mais de 4 mil resultados, a ampla maioria de colecionadores que as exibem nos chamados “urban jungles”, os famosos jardins cultivados dentro de casa que se tornaram uma febre global durante a pandemia.
Mas, na última vez em que pesquisadores a procuraram em seu ambiente original, no ano 2000, não acharam nada – nem mesmo nos locais onde ela havia sido vista em 1974 e 1986.
Segundo Samuel, a Philodendron spiritus sancti só vive no topo de árvores altas e tem folhas estreitas e compridas, que formam “orelhas” no ponto de contato com as hastes. “É elegante, mas menos vistosa do que várias de suas parentes da família Araceae, que abrange espécies comuns em jardins”.
Um jardim botânico em casa
Além do professor de Biologia Samuel Gonçalves, outro brasileiro que possui uma Philodendron spiritus sancti em sua coleção, o publicitário Flávio Yukio Motonaga, 45 anos, afirma que muitos coletores de plantas raras, também chamados, segundo ele, de “Mateiros”, “são descendentes de indígenas que usam desse trabalho como parte de sua subsistência”.
Para ele, que mora em São Paulo, muitos colecionadores têm assumido papel de pequenos jardins botânicos, ajudando a conservá-las fora do habitat.
Motonaga, que também diz ter comprado sua Philodendron spiritus sancti de outro colecionador, ressalva a exposição dessas espécies como “troféus”.
Para ele, essa é a “maneira mais popularesca, classista e egocêntrica que há para tratar de uma planta ou de qualquer outro tema possível nas redes sociais”. Ele afirmou ainda: “Sou contra esse 'marketing de luxo'”.
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Porém, para Leyde Nayane, bióloga pela Universidade Estadual do Piauí e doutora em Botânica pela Universidade de São Paulo (USP), a exposição de plantas raras em redes sociais pode estimular sua comercialização.
“Quando alguém coloca um conteúdo sobre uma planta rara, inevitavelmente atrai pessoas interessadas em comprar e vender essa planta”.
Segundo a bióloga, a extração de plantas de seus ambientes naturais gera reações. “A Philodendron spiritus sanctis serve de abrigo para lagartos, sapos e lesmas. A planta habita uma única região serrana, que abriga outras espécies que também só existem ali e dependem de um equilíbrio”.
Espécie está ameaçada
A Philodendron spiritus sancti está na Lista Vermelha do Centro Nacional de Conservação da Flora, principal instituição brasileira a monitorar as espécies de plantas ameaçadas.
Pertence à categoria “em perigo”, que se aplica às espécies sob “risco muito elevado de extinção na natureza”. Essa é a penúltima categoria no grau de ameaça, só abaixo das espécies criticamente em perigo.
A planta capixaba é uma das espécies mais visadas por contrabandistas. Em abril de 2021, a Polícia Federal prendeu um homem que tentava embarcar no aeroporto de Rio Branco, no Acre, com 28 mudas. Segundo a polícia, ele pretendia levar as plantas para a Bolívia.
No Brasil, é proibido coletar direto da natureza plantas que estejam na lista das espécies ameaçadas. Possuir essas espécies em coleções privadas não é ilegal.
No exterior, plantas raras brasileiras desfrutam de status especial entre colecionadores e podem ser vendidas legalmente. No portal de vendas Etsy, há exemplares da Philodendron spiritus sancti anunciados por até R$ 152 mil.
No Instagram, a espécie é exibida em perfis dos Estados Unidos e Europa, mas também de países asiáticos como Japão e Tailândia.
O youtuber e vendedor de plantas Fahri Orchid, da Indonésia, já revelou que indivíduos jovens da planta costumam ser vendidos no país por 100 milhões de rúpias indonésias – cerca de R$ 39 mil.
os números
152 mil é o valor da planta em um site
28 mudas foram apreendidas em Rio Branco
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Curiosidades
O nome Philodendron, em Latim, significa amigo da árvore. No mesmo idioma, spiritus sancti significa Espírito Santo, estado nativo da espécie.
Foi catalogada pela primeira vez em Domingos Martins, na região Serrana do Estado.
Há documentos que comprovam que a planta foi encontrada nas florestas capixabas pela primeira vez em 1974.
Costuma crescer em locais com cerca de 800 metros de altitude.
As folhas costumam ter 63 centímetros de comprimento e 12 cm e meio de comprimento.
Além de ser rara, o crescimento dessa espécie e bastante lento e isso contribui para o aumento do preço.
Fonte: Pesquisa A Tribuna.
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