“Brechó chique atrai quem quer autenticidade”
Sustentabilidade é um dos pilares do crescimento dos brechós de luxo e da moda de segunda mão
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As reflexões em torno da sustentabilidade impulsionam o crescimento dos brechós de luxo de segunda mão. O cenário tem, ainda, um aliado forte: o desejo do público em construir uma imagem pessoal autêntica.
Em entrevista ao jornal A Tribuna, o head de estilo da plataforma de artigos seminovos de alto luxo Cansei Vendi, Arlindo Grund, analisa as transformações da moda de luxo “second hand” e aponta perspectivas futuras desse cenário.
A Tribuna – Qual é o panorama da moda de segunda mão como um mercado de luxo no antes e no depois da pandemia?
Arlindo Grund – Como consumidor de peças e de itens de luxo de segunda mão, posso te atestar que esse é um movimento que já existia há muito tempo, mas, com a pandemia, as pessoas começaram a buscar mais autenticidade para o seu estilo e mais originalidade para a sua marca pessoal. Eu tenho percebido isso de uma maneira muito latente.
Quando as pessoas se deparam com a quantidade de possibilidades que têm à disposição, acabam se encantando e entendendo que aquela peça que, às vezes, está na loja por um preço inacessível, na plataforma de segunda mão vai estar por um preço mais acessível.
- Há preconceito com peças usadas?
Na nossa cultura, consumir moda de segunda mão não é um costume. Eu adoro brechó. Adoro pegar peças que o meu pai não usa mais e montar, hoje, algo que tem a ver com o meu estilo. Tenho peças raríssimas que garimpei em brechó.
As redes sociais fizeram as pessoas começarem a enxergar novas possibilidades de consumir moda. Os brechós de luxo atraem quem busca autenticidade e o principal alicerce é a moda circular e a sustentabilidade. Ao consumir em plataforma de luxo, você acaba contribuindo também para o futuro do planeta. Existe uma mensagem social atrelada a esse tipo de mercado.
- Muitas grifes lançam algumas coleções com marcas mais populares. Isso tende a se tornar mais comum?
Muitas marcas precisam mostrar a sua função social e o que elas estão fazendo para o futuro do planeta. Então, com isso, estão pegando tecidos parados do estoque para determinadas colaborações. Isso é um movimento que está acontecendo desde a marca de luxo até o fashion.
- Quais são as perspectivas futuras para esse mercado?
As grifes sempre estão olhando para o que é novo. Para as gerações futuras, acho que as pessoas já não terão mais o pensamento de que: “Ah, estou comprando uma roupa em brechó e ela vem com a energia da outra pessoa”.
Novo comportamento
Custo menor
Depois de uma temporada na Alemanha, em 2016, a proprietária do brechó de luxo Desapegue, Júlia Bottecchia, 30, percebeu novos comportamentos do consumo de moda.
O guarda-roupa lotado, com roupas que já não faziam sentido para ela, era o que ela precisava para entrar no mercado de “second hand”.
Ela explica alguns dos principais motivos para a procura pelas peças de segunda mão.
“Vemos o aumento da procura por diversos fatores. O primeiro, de fato, é o preço. São peças que custam até 50% a menos do que a nova. Além disso, são únicas. Em lojas convencionais, veremos sempre as mesmas coisas. No brechó, é possível ver mais autêntico”.
Grifes fazem até cadastro para selecionar clientes
A exclusividade do mercado de luxo é tão grande que algumas grifes fazem até cadastro para oferecer produtos apenas para clientes selecionados. O método fortalece o status da marca e atrai clientes de alto poder aquisitivo, diz especialista.
A seleção de clientes é polêmica. Uma brasileira já recebeu até recusa ao tentar comprar uma bolsa modelo Kelly da luxuosa Maison Hermès, em Paris, na França.
A brasileira contou ao jornal Folha de São Paulo que a estratégia utilizada pela marca de luxo foi dizer que a bolsa estava em falta. Na terceira tentativa de compra, no Caribe, ela conseguiu comprar o item, que custou, em média, R$ 17 mil.
A professora Marielle Vasconcellos Monjardim, do curso de Design de Moda da Faesa, conta que há diversas estratégias da psicologia do consumo por trás das marcas de luxo, como, por exemplo, o lançamento de edições limitadas e a seleção de clientes para eventos e experiências exclusivas.
“As marcas de luxo criam uma série de estratégias para alcançar a percepção de exclusividade, com eventos e experiências exclusivas para enfatizar a escassez. As marcas organizam, por exemplo, exibições privadas, desfiles ou festas exclusivas para as quais apenas pessoas selecionadas são convidadas”.
Os clientes com acesso à exclusividade se sentem pertencentes a um grupo privilegiado, principalmente ao adquirirem edições limitadas de produtos. “Isso cria um certo orgulho e status para quem as possui”, explica a professora.
Entenda
Mercado de luxo
O mercado de luxo é um segmento de produtos de alto valor agregado, voltados para um público com poder aquisitivo elevado. Tradição, design sofisticado, inovação e exclusividade estão entre os pilares do luxo.
Na moda, a França e a Itália são os países com as marcas de luxo mais valiosas do mundo. Chanel, Louis Vuitton, Gucci, Prada e Hermès estão entre as principais.
As marcas de luxo criam uma série de estratégias para alcançar a percepção de exclusividade. O lançamento de edições limitadas, por exemplo, gera um certo orgulho e status para quem as possui. Essa é uma das principais estratégias da psicologia do consumo para tornar a marca mais desejável.
Em 2022, as vendas do mercado de luxo brasileiro cresceram 50%, em relação a 2021. O comércio eletrônico foi o principal responsável por esse crescimento.
Especialistas apontam que a pandemia mudou o comportamento em relação ao consumo de roupas e favoreceu o crescimento da moda de luxo de segunda mão.
As coleções de colaboração entre as grifes e as marcas esportivas, como a Adidas e a Nike, estão em alta.
Fonte: Associação Brasileira das Empresas de Luxo (Abrael) e especialistas consultados.
Análise
“Alternativas para minimizar os impactos da indústria”
“A principal macrotendência que vem ditando regra para o crescimento para o mercado de 'second hand' é a sustentabilidade.
A indústria da moda é a segunda que mais polui no mundo, e, por isso, surgiu a necessidade global de encontrar alternativas para minimizar seus impactos.
Os três principais pilares para combater o problema são: utilizar materiais biodegradáveis e processos menos poluentes, reduzir o consumo e reutilizar peças já existentes.
Visando o futuro desse negócio promissor, muitas marcas esportivas têm lançado collabs (colaboração) com grifes, para produzirem peças exclusivas que se tornarão fruto de desejo e raridade dentro do mercado de second hand.
Recentemente, marcas como Gucci & Adidas, Tiffany & Nike, Reebok x Pyer Moss, fizeram colaborações de sucesso. Elas trazem benefícios para os dois lados.
Aderir ao mercado de second hand, significa manter itens de luxo em circulação, estendendo o tempo de vida de cada peça e contribuindo para a economia sustentável no Brasil.”
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