Debaixo d’água, nas montanhas
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Não é todo dia que começo um texto debaixo d’água. Mas foi assim, caro leitor, que essa história me fisgou. Câmera submersa, cardume em movimento e um silêncio que diz muito. Ali, entre tanques escavados nas Montanhas Capixabas, entendi que a tilápia tem mais a nos contar do que apenas números de produção.
A gente costuma associar peixe ao litoral. Ao mar aberto, às ondas, ao cheiro de sal. Mas o Espírito Santo tem mostrado que a piscicultura também sobe a serra. Em Domingos Martins, a tilápia encontrou espaço, técnica e gente disposta a transformar água em renda.
O que vi no campo foi rotina. Alimentação controlada, cuidado diário, manejo preciso.
Nada romântico, nada improvisado. Produzir tilápia exige atenção constante e paciência.
É um trabalho que acontece todos os dias, faça sol ou faça frio. E talvez por isso funcione tão bem: porque é levado a sério.
Em Alto Pena, Domingos Martins, acompanhei de perto uma despesca.
A família inteira reunida, rede no tanque, caixas subindo cheias de peixe. Cena simples, mas repleta de significado. Ali não tem espetáculo; tem resultado. Meses de trabalho concentrados em poucas horas.
Depois, o caminho segue para o beneficiamento na unidade da cooperativa da região — a Coopram (Cooperativa de Empreendedores Rurais de Domingos Martins).
Filetagem manual, retirada da pele, acabamento cuidadoso.
Um detalhe me chamou atenção: a linha de produção é conduzida por mulheres.
Mãos experientes, ritmo firme e um olhar atento para cada filé que sai dali. Por dia, cerca de duas toneladas de tilápia passam por esse processo.
Nada se perde. Antes de seguir para a câmara fria, a menos 20 graus, o peixe é espaldado para ficar bem apresentado.
Pode parecer detalhe, mas é esse tipo de cuidado que faz diferença quando o produto chega à mesa do consumidor.
A tilápia hoje responde por 99% da produção aquícola capixaba. Mais de sete mil toneladas por ano.
Mas, olhando de perto, esses números ganham outro peso. Viram história, viram família, viram cooperativismo.
Saí das montanhas com a sensação de que, às vezes, é preciso mudar o ponto de vista. Até porque, debaixo d’água, a gente enxerga melhor.
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