Tema de redação do Enem, envelhecimento preocupa governos no Brasil e no mundo
Segundo o Censo de 2022 do IBGE, 10,9% da população brasileira tem 65 anos ou mais — quase o dobro do registrado em 2000 (5,9%)
Estudantes que prestaram o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) no domingo (9) escreveram a redação deste ano sobre "perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira". No Brasil e no mundo, o crescimento da população idosa preocupa governos, que precisam adaptar políticas públicas a uma sociedade cada vez mais envelhecida.
Segundo o Censo de 2022 do IBGE, 10,9% da população brasileira tem 65 anos ou mais — quase o dobro do registrado em 2000 (5,9%). O crescimento acelerado, comparado ao de países europeus, que levaram mais de um século para alcançar o mesmo aumento, dificulta a implementação de políticas efetivas, afirmam especialistas. O modelo econômico brasileiro também é elencado como um entrave —mas, segundo pesquisadores, o SUS (Sistema Único de Saúde) é uma das vantagens nacionais.
As políticas para lidar com o envelhecimento populacional envolvem saúde, habitação e cuidado, além de ações de prevenção para que a população atinja idades maiores de forma saudável e ativa.
Jefferson Mariano, analista socioeconômico do IBGE, afirma que o Brasil enfrenta desafios semelhantes aos de países desenvolvidos para adaptar políticas ao envelhecimento, mas também convive com problemas típicos de nações em desenvolvimento. "Ainda temos desigualdades no atendimento à população negra e de baixa renda", diz.
A existência de um sistema como o SUS é uma vantagem por garantir acesso gratuito à saúde, diz ele. O principal entrave, contudo, é o orçamento limitado destinado às políticas voltadas à longevidade.
Jorge Felix, professor da USP e pesquisador da Fapesp em pós-doutorado no Centre National de la Recherche Scientifique, na França, ressalta que o investimento é essencial para avançar na prevenção, área em que a Europa é referência.
A prática regular de exercícios previne doenças como diabetes, hipertensão, problemas cardiovasculares e demência, segundo consenso médico. Por isso, os países europeus oferecem piscinas públicas, atividades físicas subsidiadas e campanhas de educação em saúde que precisam ser mais desenvolvidas no Brasil, segundo Felix.
A habitação, segundo ele, também é determinante. "Idosos precisam de moradias adaptadas à mobilidade reduzida", diz Felix. "Na Itália e na França, há políticas específicas para isso." No Brasil, o déficit de saneamento básico e a quantidade de construções irregulares ainda geram mortes evitáveis.
Outro ponto destacado pelo pesquisador é o cuidado, que "deve ser reconhecido como trabalho". O país avançou com a criação da Política Nacional de Cuidados, mas ainda precisa desenvolver serviços domiciliares para reduzir desigualdades e garantir envelhecimento digno. "A Europa conta com ampla rede de cuidado em domicílio, que combina voluntariado e trabalho público", explica.
Para Felix, o desafio brasileiro não está apenas na velocidade da transição demográfica, mas também no modelo econômico. Ele discute o tema no livro Economia da Longevidade – O envelhecimento populacional muito além da previdência (Editora 106).
Segundo o pesquisador, os países desenvolvidos envelheceram sob economias do pós-guerra baseadas no Estado de bem-estar social, com saúde e educação universais e políticas habitacionais robustas. O Brasil, ao contrário, envelhece em uma economia global financeirizada, que prioriza o capital financeiro e reduz empregos com automação e tecnologia, o que torna o processo mais precário.
O cenário é agravado por vulnerabilidades históricas e sociais: a "dívida da escravidão", que faz a população negra envelhecer em piores condições; o "fardo do cuidado", que recai sobre as mulheres; e as desigualdades regionais, que produzem múltiplas formas de envelhecer no país.
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