Mudanças nas famílias: união informal ultrapassa casamento civil e religioso
Número de casais que vivem união consensual cresceu nos últimos anos. Para especialistas, isso reflete uma mudança da sociedade
Pela primeira vez, a parcela de brasileiros que vive em união conjugal consensual supera a proporção de matrimônios religiosos e civis. Em 2022, 38,9% das uniões conjugais eram consensuais, ou seja, não contraíram o casamento.
Essa proporção era de 28,6% no ano 2000 e de 36,4% em 2010. A constatação está no suplemento Nupcialidade e Família do Censo 2022, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Diferentemente do cenário nacional, no Estado, o percentual de pessoas de 10 anos ou mais que viviam em união consensual (31,3%) não superou o das que estavam em casamento civil e religioso (47,2%).
No entanto, o número de uniões informais só cresce. De 2000 a 2022, cresceram os casamentos somente no civil (17,4% para 20,7%) e as uniões consensuais (25,9% para 31,3%) e caíram os casamentos no civil e religioso (55,5% para 47,2%) e os apenas no religioso (1,2% para 0,8%).
Para a advogada Bruna Lyra Duque, doutora em Direito e professora de Direito Civil da FDV, o crescimento das uniões consensuais reflete uma mudança da sociedade, sintetizada na ideia de “minha família, minhas regras”.
“Há uma crescente valorização da autonomia privada nos vínculos afetivos, fator que contribui para o afastamento dos modelos tradicionais de união”, salienta.
Ela também observa a diversificação de vínculos. “O Projeto de Lei 04/2025, que propõe a Reforma do Código Civil, enfatiza essa diversidade e permite uma maior contratualização das relações para fins patrimoniais, familiares ou sucessórios. Existe um posicionamento cada vez mais crescente de que o afeto e a convivência são suficientes para formar uma relação”.
Já pela percepção da advogada de Família Rebeca Nobre, o crescimento das uniões consensuais decorre da busca por menos burocracia e maior liberdade na vida afetiva.
“Muitas pessoas optam por esse formato quando não há interesse em formalizar a relação no cartório, especialmente em casos em que não existe patrimônio comum ou o casal ainda não pretende constituir família de forma definitiva”.
Por outro lado, ela destaca que, com o tempo, uma convivência duradoura e pública pode gerar efeitos jurídicos semelhantes aos do casamento, inclusive na partilha de bens e em direitos sucessórios.
“Por isso, é essencial que o casal compreenda o alcance legal dessa escolha e, se for o caso, formalize a união estável por escritura pública para evitar conflitos futuros”.
“A cumplicidade era o suficiente”
Juntos há 23 anos, os empresários Maria Teresa Vieira de Andrade, 56 anos, e Airton José Machado Ferreira, 62, decidiram formalizar a união para incluir a filha, hoje com 21 anos, no plano de saúde da família.
“Nós não víamos necessidade de formalizar nossa união. Acreditávamos que o amor e a cumplicidade eram suficientes. A formalização da união estável foi apenas para cumprir uma exigência legal que comprovasse que vivíamos em uma relação familiar. Achamos ótimo poder oficializar de uma maneira mais fácil e menos burocrática. O valor do papel (a certidão) nunca foi uma exigência para nós”, contou Maria Teresa.
Para ela, as mudanças nas relações interpessoais e o fato de muitas pessoas estarem mais voltadas para si mesmas e para a busca da própria felicidade podem estar contribuindo para o surgimento de relações menos duradouras e famílias com menos estrutura.
Raio X
No Estado
União conjugal
Em 2022, 53,1% da população de 10 anos ou mais do estado viviam em união conjugal. Em 2010, eram 52,3% e, em 2000, 51%.
Proporção
De 2010 para 2022, a proporção de pessoas na população de 10 anos ou mais que nunca viveram em união conjugal caiu de 33,5% para 28,3%.
Já a proporção dos que não viviam, mas já haviam vivido em união conjugal subiu de 14,2% para 18,6%.
De 2000 a 2022, cresceram os casamentos somente no civil (17,4% para 20,7%) e as uniões consensuais (25,9% para 31,3%) e caíram os casamentos no civil e religioso (55,5% para 47,2%) e apenas no religioso (1,2% para 0,8%).
Perfil
Em 2022, 1% do total de pessoas de 10 anos ou mais que viviam em união o fazia com pessoas do mesmo sexo (correspondendo a 17,4 mil pessoas), sendo que 62% (10,8 mil) eram mulheres e 38% (6,6 mil) eram homens.
O que elas dizem
União conjugal com menores
Mais de 34 mil pessoas entre 10 e 14 anos vivem em união conjugal no Brasil. Os dados fazem parte do questionário da amostra do Censo 2022, sobre nupcialidade e estrutura familiar. Desse grupo, quase oito em cada dez (77%) são mulheres.
Das pessoas entre 10 e 14 anos que viviam em algum tipo de união, 7% estão casadas no civil e no religioso, 4,9% só no civil e 1,5% só no religioso. Os outros 87% viviam em algum outro tipo de união consensual.
Casamento civil com menores de 16 anos é proibido no Brasil. O IBGE ressalta que os números se baseiam nas informações fornecidas pelos próprios moradores.
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