Mudança no Código Civil: nova lei vai legalizar “puxadinhos” e lajes
Projeto altera direito real de laje e permite a aquisição por usocapião de imóveis construídos sobre casas de terceiros
Escute essa reportagem
Construções erguidas sobre outras casas, realidade comum nas periferias urbanas brasileiras, podem finalmente ganhar status legal de propriedade independente.
Isso porque tramita no Senado um projeto que pode mudar o Código Civil e alterar, significativamente, o direito real de laje e permitir a aquisição por usocapião de imóveis construídos sobre casas de terceiros.
Hoje, pela legislação vigente, quem ergue uma residência sobre a laje de outra construção tem direito de uso, mas não a propriedade do imóvel.

A nova proposta muda isso ao reconhecer a laje como um terreno autônomo, possibilitando a transferência da posse por venda, herança e, sobretudo, usucapião, além de permitir o uso como garantia em financiamento.
“A lei tende a proteger quem age de boa-fé, mas é fundamental estar atento aos requisitos legais, principalmente no caso do usucapião”, explica o advogado e presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Serra, Ítalo Scaramussa.
Para o advogado Arnon Amorim, a proposta pode representar um divisor de águas. “O direito de laje, se regulamentado com clareza, permitirá que milhares de famílias possam registrar seus imóveis, acessar crédito, formalizar heranças e ter mais dignidade patrimonial”, diz.
Segundo Amorim, o texto em análise no Senado corrige distorções e aumenta a segurança jurídica para as famílias. “O mercado também será impactado, já que abre caminho para operações de financiamento, valorização de imóveis e estímulo à formalização patrimonial”, avalia.
“A regularização de moradias sobrepostas é uma questão de justiça social. Mas, para que funcione, é preciso que os municípios estejam preparados, os cartórios atualizados e a população bem informada sobre seus direitos”, conclui o advogado.
Já a advogada Kelly Andrade alerta para o risco de a aplicação da lei ser limitada, caso ela seja aprovada. “Será preciso integrar isso com políticas públicas de regularização fundiária e reestruturação dos registros imobiliários”, ressaltou.
Já o advogado Juliano Merçon alerta que os desafios serão mais burocráticos, primeiramente de regularização legal pelos municípios, e posteriormente, de registro junto aos cartórios, que também devem estar preparados para o acréscimo na demanda.
SAIBA MAIS
- Foi elaborada por comissão de 38 juristas, segundo o Superior Tribunal de Justiça (STJ). O colegiado teve a participação dos ministros do STJ João Otávio de Noronha, Isabel Gallotti, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze, além do ministro aposentado Cesar Asfor Rocha.
- Comissão foi criada pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), quando ele ainda era presidente do Senado.
- A presidência da comissão ficou a cargo do ministro Luís Felipe Salomão, vice-presidente do STJ.
- Juristas propuseram a alteração de 1.122 dos 2.046 artigos da versão atual da lei. Além disso, o projeto acrescenta mais de 200 dispositivos ao código.
- Tramitação da proposta, já protocolada no Senado, deve começar com a criação de uma comissão especial. Contudo, não há prazo para o colegiado ser criado e instalado.
- A comissão especial é a primeira etapa de tramitação. Uma vez aprovado lá, o projeto deve percorrer as comissões permanentes, como a de Constituição e Justiça (CCJ), para depois chegar ao plenário.
Puxadinhos
- Um dos pontos da reforma envolve os chamados “puxadinhos”, alterando significativamente o direito real de laje e pode permitir a aquisição por usucapião de imóveis construídos sobre casas de terceiros.
- Hoje, pela legislação vigente, quem ergue uma residência sobre a laje de outra construção tem direito de uso, mas não a propriedade do imóvel. A nova proposta muda isso ao reconhecer a laje como um terreno autônomo, possibilitando a transferência da posse por venda, herança e, principalmente, usucapião.
- A usucapião seria válida desde que o imóvel na laje tenha saída independente para via pública e identificação numérica ou alfabética.
- A ideia é garantir que construções sobrepostas possam ser reconhecidas legalmente como unidades distintas e aptas à regularização, mesmo quando construídas em áreas já ocupadas.
- O direito real de laje foi incluído na legislação em 2017, mas ainda gera interpretações divergentes nos tribunais.
- Algumas decisões reconhecem a possibilidade de usucapião, enquanto outras negam o direito por ausência de previsão legal.
- Com a proposta, a discussão tende a se pacificar, embora ainda dependa da regularização do imóvel original.
Promessa do governo de crédito para construções
O presidente Lula disse que pretende anunciar um programa de crédito para financiar pequenas obras e reformas nas casas dos brasileiros.
Ele comentou o assunto durante discurso em evento do governo federal na cidade de Sorocaba (SP), em março deste ano, mas não especificou quando será o lançamento nem os valores disponíveis.
“Uma outra coisa que eu quero anunciar logo, logo, é um crédito para reforma de casa. O cara que quer fazer um banheiro, um quartinho a mais para a filha, alguma coisa a mais na garagem, mais uma cozinha. O cara que quer fazer um puxadinho, ele vai ter crédito para fazer esse puxadinho. É assim que a gente vai recuperar a grandeza do povo brasileiro”, afirmou Lula.
O Presidente aposta na ampliação da oferta de crédito para recuperar popularidade e garantir um candidato governista competitivo na eleição de 2026 – ele ou outro nome escolhido pelo PT.
Em março, Lula assinou uma medida provisória (MP) com mudanças nas regras do empréstimo consignado do setor privado, para trabalhadores formais, contratados com carteira assinada via CLT.
Garantia maior para todos com mudança na legislação
O militar reformado e corretor de imóveis Nehemias Rodrigues de Lima conta que o sogro comprou um terreno, construiu a casa e, mais tarde, cedeu a laje para que ele pudesse construir em cima. A obra foi feita aos poucos, conforme as condições permitiam. Hoje, praticamente toda a família mora no mesmo espaço. Apesar dos anos vivendo ali e do esforço investido, ele não tem nenhum documento que comprove a posse da parte onde construiu.
“É um projeto interessante, pois dá uma garantia maior para todos. Além de mim, há uma outra laje, onde minha cunhada também mora”, conta.
SAIBA MAIS
Aumento de custos
- Contudo, a regularização não virá sem custos. O advogado Rafael Verdant, especialista em Direito Imobiliário, aponta para um provável aumento da carga tributária, “especialmente em relação ao IPTU”.
- Verdant explica que muitas dessas construções atualmente “estão fora do radar das prefeituras”. Com a legalização, “a tendência é que elas passem a ser tributadas individualmente, o que pode gerar cobrança adicional”, alerta.
- Apesar do potencial acréscimo de impostos, Verdant destaca as vantagens da formalização, como “acesso a crédito, regularização fundiária e valorização do imóvel”.
MATÉRIAS RELACIONADAS:




Comentários