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Esportes

Neymara Carvalho: “Seria lindo competir até os 50 e depois me aposentar”

Multicampeã no bodyboarding, Neymara Carvalho aborda sobre carreira, futuro, dificuldades no esporte e expectativa para o Pan de Lima


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Imagem ilustrativa da imagem Neymara Carvalho: “Seria lindo competir até os 50 e depois me aposentar”
“Seria lindo competir até os 50 e depois me aposentar” |  Foto: Gustavo Foratini/AT

Neymara Carvalho é sinônimo de sucesso e resiliência. Pentacampeã mundial e dez vezes campeã brasileira de bodyboarding, a atleta capixaba, de 48 anos, é uma referência no esporte e será uma das representantes do Brasil no Pan-Americano de Lima, que começa na próxima semana.

Em entrevista ao Jornal A Tribuna, ela tratou sobre sua vitoriosa carreira e fez projeções para o futuro. Além disso, a multicampeã falou acerca dos principais desafios que uma atleta da modalidade precisa enfrentar.

Você tem 48 anos, acredita que até idade irá competir oficialmente no bodyboarding?

Hoje, tenho em mente que 50 anos seria uma data linda para me aposentar. Me sinto bem fisicamente e psicologicamente, e vejo minha filha trilhando seu caminho no esporte.

Mas não quero definir um momento para parar de competir. Enquanto eu puder fomentar o esporte e dar acesso a novas crianças, continuarei participando de competições, não apenas para vencer, mas para fazer algo a mais. Estou trilhando um caminho paralelo às competições de alto rendimento e acredito que, no futuro, farei ainda mais.

Já pensou ou planejou o que irá fazer quando se despedir das competições?

Estou testando minhas habilidades em novos mares, digamos assim, com a produção de eventos. Estamos indo para o quarto ano da etapa do Circuito Mundial que realizo aqui no Espírito Santo, junto com minha equipe. Penso em crescer com esse evento e na minha carreira como empreendedora de eventos, não apenas no Espírito Santo, mas também expandindo para o Brasil.

Essa oportunidade surgiu do meu desejo de trazer as meninas que competiram comigo para conhecer o Espírito Santo, e a forma que encontrei foi trazer uma etapa do Circuito Mundial. Isso já se tornou realidade, e estamos trabalhando para aumentar nossa atuação. Minha ideia é identificar onde podemos fomentar o esporte e como posso contribuir para seu crescimento e desenvolvimento

Com inúmeras conquistas, onde guarda seus troféus? É você mesmo quem cuida deles ou alguém ou mais pessoas ficam responsáveis por cuidar deles?

Estou fazendo uma reforma em casa e tive que, com muita dor, me desfazer de alguns troféus. Com o tempo, eles se deterioraram, e alguns eu nem lembrava mais qual campeonato havia vencido. Enviei alguns para reciclagem por apego sentimental, enquanto outros deixei para usar em campeonatos de biscoito e doação para o Instituto Neymara Carvalho. Na verdade, vou guardando, mas tinha tantos troféus que precisei me desfazer de alguns agora.

Qual é o troféu que considera mais bonito e qual deles tem maior significado para você?

Os troféus que trago comigo remetem aos locais que visitei, e acho todos muito lindos. Cada um tem uma beleza única, como os troféus das Maldivas, que são verdadeiras obras de arte.

O troféu do Wahine, por exemplo, tem a logo criada por um artista, enquanto a execução é feita pela Ana Paula Castro, simbolizando meu pertencimento ao Espírito Santo. Valorizo muito os troféus autênticos e guardo esses com carinho, cuidando e limpando eu mesma, sem deixar ninguém tocar.

O esporte te ajudou a conhecer quantos países? Qual deles gostou mais?

Conheci mais de 25 países graças ao esporte, e tenho uma gratidão enorme por ser atleta de bodyboard. Isso me proporcionou a oportunidade de explorar culturas, fazer amizades e vivenciar diferentes lugares.

Destaco alguns, como o Taiti, que achei sensacional, e Fernando de Noronha, no Brasil, que considero espetacular pela sua beleza natural. O Japão, com sua beleza tecnológica, me deixou muito feliz e espantada, como se estivesse dentro de um desenho animado, além de me permitir conhecer sua rica cultura.

Marrocos também me impactou muito, principalmente pela disparidade social, semelhante ao que vemos no Brasil: muita riqueza, mas também muita pobreza. Esse choque cultural me impressionou bastante

Há tempo para aproveitar e fazer turismo durante as competições?

Quando comecei a competir, meu foco era apenas o campeonato. Fui a Portugal mais de 25 vezes para o evento, mas só nos últimos 10 anos comecei a turistar. Antes, eu chegava às finais e não tinha tempo para mais nada; queria competir, descansar e treinar, pois meu objetivo era a vitória.

Com o tempo, fui amadurecendo e comecei a valorizar mais a cultura local e seus atrativos. Nos últimos dez anos, tenho feito isso, inclusive ensinando à Luna a importância de conhecer o lugar que visita, e não apenas competir e ir embora.

Como define seu estilo de bodyboarder?

Acredito que sou uma bodyboarder versátil. Tenho uma certa radicalidade, mas também fluidez, o que me permite me adaptar a todos os tipos de ondas. Vencer em Jacaraipe e no ArcelorMittal Wahine Bodyboard Pro é prova de que surfo bem em ondas cheias e pequenas. Vencer em Antofagasta, no Chile, e ter conquistado grandes vitórias no Havaí, como no Pipeline, mostra meu estilo radical.

Quando eu e Carla Costa despontamos nos anos 90 e 2000, éramos consideradas as radicais da época, em comparação com a geração anterior. Hoje, claro, há meninas ainda mais radicais do que eu. No entanto, consigo manter meu estilo, sendo radical e fluída, mandando bem em ondas pequenas.

Alguma atleta tem o estilo de bodyboarding semelhante ao seu?

A nova geração de atletas, especialmente no Brasil, precisa treinar mais em ondas como as de Jacaraípe, buscando mais fluidez e linha de onda. Isso inclui a Luna, que está desenvolvendo seu próprio estilo, e é lindo vê-la criando sua personalidade no surf. Estamos trabalhando nisso, já que ela só tem 18 anos e está se formando como atleta profissional, com grandes resultados, mas ainda precisa melhorar alguns detalhes para se destacar.

Outras atletas brasileiras também estão nessa fase. Algumas novas japonesas no circuito têm uma fluidez exemplar, mas sentem medo de ondas grandes, enquanto as brasileiras não têm esse receio. Acredito que todas ainda são novas e precisam evoluir.

Na sua opinião, quais são os destaques hoje do bodyboarding e quem deve surgir como novas estrelas do esporte, seja aqui no Espírito Santo ou fora do Estado?

Luna Hardman já mostrou a que veio, sendo bicampeã mundial Pro Júnior e terceira colocada no primeiro ano completo do circuito profissional. Sua ascensão foi meteórica, e como mãe, não é uma surpresa para mim, pois vemos sua evolução e determinação. A Bianca Simões, outra atleta do Espírito Santo e aluna do Instituto Neymara Carvalho, também está se destacando como atleta profissional.

Há várias meninas, como Isa Vidal, da comunidade da Rocinha, que foi campeã brasileira este ano em duas categorias, Júnior e Sub-14. Ela representa a nova geração de amadoras, e consegui acompanhar seu progresso ao longo do ano. Porém, não consigo acompanhar todas as meninas, pois muitas não têm apoio e patrocínio para viajar e mostrar seu talento no circuito.

No futebol, por exemplo, o auge do atleta, segundo especialistas, é entre 25 a 29 anos. No bodyboarding, existe uma idade específica? Em que idade considera que foi o seu auge na carreira esportiva?

Meu auge foi em 2003, quando fui campeã de todos os circuitos em que competi, incluindo o mundial e o brasileiro. Tinha 27 anos e também fui campeã europeia. Foi nesse ano que surgiu a “Neymáquina”, porque ganhei tudo. No entanto, outras atletas conquistaram títulos com 17, 18 ou 20 anos.

Hoje, sinto que estou levando minha carreira a um patamar inexplorado no bodyboard de alto rendimento. Embora ainda não tenha conseguido um título mundial, estou frequentemente chegando a finais e semifinais, como nas Maldivas este ano. Me sinto apta e plena para buscar mais um título mundial. Claro, preciso organizar meu tempo entre os treinos e minhas outras funções como empreendedora e palestrante, e estou fazendo isso

Quem são seus ídolos no esporte?

Rebecca Andrade é uma grande inspiração para mim. O carisma, a postura e a garra dela como atleta, além da preparação mental, são exemplos que sigo. Ela é super jovem, mas busco inspiração nas novas gerações para me sentir mais jovial e motivada.

Quando comecei no bodyboard, tinha referências como Stephanie Pettersen, uma atleta radical e campeã de Pipeline, que hoje mora na Austrália. Também admirava Mariana Nogueira, tricampeã mundial, e amava quando me confundiam com ela em algumas manobras. Daniela Freitas me inspirava pela fluidez. Busquei todas essas referências para moldar meu próprio estilo de surf, e admiro cada uma delas até hoje.

Pratica outro esporte além de bodyboarding?

Faço natação para complementar meu treino de bodyboarding, mas sempre tive medo de me machucar em outros esportes e ficar impossibilitada de fazer o que mais amo. Por isso, foco em musculação, natação e, ocasionalmente, corrida, sempre visando aprimorar meu desempenho.

Como é a sua rotina, aos 48 anos, para disputar as competições?

Procuro realizar todo o treinamento para o bodyboarding pela manhã. Hoje, por exemplo, já surfei e nadei. À tarde, dedico tempo às prescrições do meu médico, pois estou entrando na menopausa e há questões hormonais a serem consideradas, como sono e bem-estar. Faço esse acompanhamento há muitos anos com o Dr. Paulo Lessa. Reservei a parte da tarde para essas questões mais burocráticas.

Neste momento, estou trabalhando na construção do ArcelorMittal Wahine Bodyboard Pro 2025, dedicando uma hora para discutir isso com a associação mundial e as atletas. Saber dividir meu tempo é a minha maior missão hoje, e sinto que estou conseguindo fazer isso direitinho.

Você conta com uma equipe que ajuda na sua carreira?

Tenho psicólogo, assessoria de imprensa e treinador, que na verdade também é fisioterapeuta. Ele cuida da minha preparação física, além de me ajudar com soltura e relaxamento. Não tenho o corpo 100% como tinha nos meus 20 e poucos anos, então lido com lesões e dores musculares com frequência. Preciso dessa equipe para me sentir renovada a cada bateria de campeonatos.

Com que idade você começou a competir e o que você falaria para aquela Neymara que começou a "engatinhar" no bodyboarding?

Comecei a competir com 14 para 15 anos e mantive vivo o amor que sempre tive pelo esporte. Volto sempre ao início para me motivar, lembrando da menina que ajudava os pais em um restaurante no quiosque da Barra de Jucu e sonhava em ir para o Havaí. A alegria que sentia ao praticar o esporte e sonhar com o que tenho hoje é algo que carrego na memória.

Sinto uma grande gratidão e acho que diria: 'Que bom que você acreditou na sua carreira e no seu esporte, superando dificuldades e buscando patrocínio.' Hoje, estou desfrutando do melhor patrocínio da minha história e do prazer de viajar, inserindo minha filha no esporte mundialmente.

Se não fosse atleta, qual carreira teria seguido? Você tem alguma especialização?

Eu tentei fazer jornalismo, psicologia e educação física, mas não consegui finalizar nenhum curso. Acabei abandonando publicidade e propaganda também. Mas amo psicologia e estou sempre lendo algo para aprender e aplicar no esporte. Infelizmente, não terminei nenhum dos cursos.

“Pequena notável” e “Neymáquina” foram alguns dos apelidos que você recebeu na carreira. Como lidou com eles?

Eu sempre achei incrível o apelido Neymáquina. Foi resultado de um ano espetacular que tive. Hoje, brinco dizendo que a Neymara está precisando de uma 'gasolina turbinada', que não é mais a mesma, com tanta energia. Mas estou buscando me reinventar. Sempre gostei de ter apelidos; meu pai ainda me chama de ‘maroca’.

Por que você está disputando o Circuito Catarinense? Como avalia as competições realizadas no Espírito Santo?

O circuito capixaba está legal, embora tenha demorado muito para começar este ano. Fiz um contrato de patrocínio que me permitia não ter obrigação de correr o circuito estadual ou o brasileiro, mas, em contrapartida, eu faria algumas aulas pelo Brasil e participaria do circuito mundial na íntegra. Optei por isso.

O circuito catarinense é a realização de uma grande amiga minha, que acabou de assumir a federação, e estávamos planejando fazer uma aula lá, mas tivemos que cancelar devido ao frio. Agora, com a oportunidade de voltar, estou liderando o circuito e decidi que não vou desistir. Vou para a última etapa em busca do título catarinense, que seria inédito para mim. Estou determinada a conquistar esse título este ano.

Exceto no futebol, os atletas no Brasil não costumam ser bem remunerados e valorizados. Quanto você considera que uma bodyboarder de primeira linha deveria receber para se manter sozinha, somando os patrocínios?

Acho que sempre há dois lados. O atleta precisa se preocupar em apresentar uma boa proposta e ter uma equipe que realmente acredite nele, o que deve refletir em um salário. A profissionalização é fundamental no início da carreira. É necessário vestir a camisa de quem te apoia, mesmo que o apoio seja pequeno.

Além disso, sinto que falta visibilidade para os grandes feitos dos atletas de bodyboard, especialmente no Espírito Santo, na grande mídia e entre empresários. Acredito que um atleta com potencial para um título mundial deveria receber, no mínimo, 300 mil reais por ano. Esse valor permitiria que ela dormisse tranquila, pagasse sua assessoria, personal trainer, e ainda investisse em qualidade de vida, como despesas com carro e suplementos. Atualmente, essa realidade está distante. Se um atleta tiver esse suporte financeiro, poderá investir mais em sua equipe e gerar um retorno maior para os patrocinadores.

Como está a expectativa e preparação para o Pan-Americano de Surfe, que começa na próxima quarta-feira (02)?

Estou super treinando esta semana toda, desde a semana passada, me preparando tanto mental quanto fisicamente. Já defini todas as pranchas e estou realmente focada na avaliação das ondas, temperatura da água e tudo que é necessário para uma boa competição. Já participei de edições anteriores do Pan-Americano, e agora será um comeback.

É um retorno diferente, pois as competições estão em moldes mais atuais. Competir em equipe é muito especial, com uma vibração diferente da competição individual no circuito mundial. Vou com a equipe do Brasil, e, embora eu possa conquistar uma medalha individual, o principal objetivo é somar com o time de surf.

Temos um grande grupo de surfistas e quatro bodyboarders, e estamos unidos para trazer essa medalha para o Brasil. Claro, ficaria muito feliz em ter minha medalha individual, mas estou indo para colaborar com o time como um todo.

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