Maioria das vítimas de golpe vence bancos na Justiça
Levantamento mostra que consumidores venceram instituições em 82,15% dos 559 casos analisados entre 2019 e 2025
Instituições financeiras vêm sendo derrotadas em disputas abertas por consumidores que são vítimas de golpes. É o que mostrou levantamento da Juit, plataforma de pesquisa jurídica com inteligência artificial.
Pelo estudo, os consumidores venceram as instituições financeiras em 82,15% dos casos analisados no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) entre 2019 e 2025.
O advogado Carlos Augusto Pena da Motta Leal destaca que o tema tem sido alvo de intenso debate. “Diante de falhas na prevenção de fraudes — especialmente quando os prejuízos são vultosos e ocorrem em sequência — os bancos não podem simplesmente transferir o ônus para os consumidores”, diz o advogado.
Segundo a plataforma, entre os golpes que mais têm dado prejuízo aos bancos na Justiça está o chamado “golpe do motoboy”.
Nesta modalidade de fraude, os estelionatários entram em contato com o cliente se passando pela instituição financeira, informam que o seu cartão foi clonado e que um motoboy irá buscá-lo.
Eles solicitam ainda que, antes da entrega, o cliente digite a sua senha no telefone. O motoboy chega a quebrar o cartão na frente do cliente, mas deixa o chip intacto e consegue realizar compras.
Quando possível – como no caso do “golpe do motoboy”, por exemplo –, os bancos têm tentado repassar o prejuízo para as empresas de máquinas de cartão de crédito, mas não andam obtendo sucesso: perderam 81,15% das ações contra as “maquininhas”.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem discutido o tema, com decisões favoráveis tanto a bancos quanto a consumidores e, quando envolvidas, às maquininhas. Ou seja, não há consenso sobre o tema.
A Terceira Turma do Tribunal, por exemplo, têm tido entendimentos mais favoráveis aos clientes dos bancos em processos contra essas entidades. Já a Quarta Turma tem tido decisões favoráveis às instituições financeiras.
Ele ainda destaca que, além do golpe do motoboy estar dando essa interpretação na Justiça, outros tipos de golpe, em que a vítima não passou dados ou o cartão a estranhos, também tendem a resultar em processos vencidos por clientes contra bancos.
Já segundo o advogado José Antônio Neffa Junior, se o golpe foi efetivado por culpa exclusiva do consumidor, sem que o banco pudesse evitá-lo ou sem que o banco tenha faltado com seu dever de prestar segurança às transações realizadas, a responsabilidade da instituição será afastada.
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Decisões divergentes
O STJ tem tido decisões divergentes sobre o tema, com a terceira turma do Tribunal entendendo que os bancos têm responsabilidades, e a quarta turma entendendo que são os consumidores os responsáveis.
Em 67,5% das decisões nos processos de consumidores contra as instituições financeiras, o argumento utilizado é de falha na segurança do emissor.
A Justiça tem entendido que a fraude acontece porque o sistema do banco falhou ao aprovar transações fora do perfil do consumidor, com valores altos, sequenciais e em horários atípicos.
Deoclides Neto ressalta que justificativa da culpa exclusiva da vítima não tem muita aderência, e que ideia de responsabilidade do banco em não detectar fraude costuma prevalecer.
Ações de regresso
Esse cenário tem levado os bancos a buscar “ações de regresso” contra as maquininhas no Judiciário. As instituições costumam argumentar que, embora tenham autorizado a transação, a fraude só teria sido possível porque a intermediadora ofereceu a maquinha sem fazer uma verificação adequada do cliente.
Por outro lado, as empresas de maquininhas alegam que são prestadoras de serviços de tecnologia e não têm ingerência sobre a autorização de pagamento ou a guarda do cartão.
Fundador e CEO da Juit, Deoclides Neto, ressalta que a justificativa da culpa exclusiva da vítima, que também consta em decisões, não tem muita aderência e a ideia de responsabilidade do banco em não detectar fraude costuma prevalecer.
“Os bancos ficaram numa posição ruim, tendo que pagar a clientes e sem conseguir receber de volta”, afirma ele, acrescentando que há julgados importantes para os bancos no STJ, para “estancar a sangria”.
No STJ, a 4ª Turma já reconheceu que o banco tem direito de regresso contra a instituição credenciadora que forneceu o ponto de venda por meio do qual se praticou a fraude.
Para os ministros, o banco não adotou mecanismos de identificação da fraude e a credenciadora deixou de promover as diligências prévias à oferta do credenciamento ao falso lojista, que praticou a fraude, além de não ter mantido o registro das informações das transações.
Procurada, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) apontou que a prevenção a fraudes é competência de todos os participantes do arranjo, do emissor às maquininhas.
Já a Associação Brasileira de Internet (Abranet), que reúne empresas de meios de pagamento, disse que os bancos não obtêm êxito em mais de 90% das ações propostas em primeira e segunda instâncias.
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