Entenda a proposta para acabar com a escala 6 X 1 no trabalho
Para ser debatida, a PEC precisa de, no mínimo, 171 assinaturas dos 513 deputados
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A escala de trabalho 6 X 1, na qual o descanso remunerado ocorre apenas aos domingos, virou alvo de uma proposta da deputada Erika Hilton (PSOL-SP), que quer mudar a Constituição para alterar a jornada dos trabalhadores.
Ela busca recolher número suficiente de assinaturas para seguir com a tramitação de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) a ser discutida na Câmara dos Deputados e no Senado.
Para ser debatida, a PEC precisa de, no mínimo, 171 assinaturas dos 513 deputados. Nesta segunda-feira (11), a deputada afirma já ter ultrapassado 100 assinaturas e acredita que, até o fim da semana, pode conseguir o total.
Há ainda um abaixo-assinado online, que pode ser assinado por quem defende a medida. Até as 17h desta segunda, o documento já passava de 1,6 milhão de assinaturas.
O texto da PEC propõe alterar o artigo 7º da Constituição, no inciso 8, que trata sobre a jornada de trabalho. A sugestão é de jornada de quatro dias semanais, medida adotada em alguns países do mundo e que chegou a ser testada no Brasil por algumas empresas.
O trecho passaria a vigorar da seguinte forma: "Duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e trinta e seis horas semanais, com jornada de trabalho de quatro dias por semana, facultada a compensação de horários e a redução de jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho".
Hoje, a Constituição determina jornada de trabalho limitada a "oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho".
À reportagem a deputada Erika afirma que a ideia surgiu a partir de uma provocação do Movimento VAT (Vida Além do Trabalho), encabeçado pelo recém-eleito vereador Rick Azevedo (PSOL-RJ).
A proposta foi protocolada por ela na Câmara em 1º de Maio, quando se celebra o Dia do Trabalho no Brasil e no mundo, ocasião na qual também a levou ao ministro do Trabalho, Luiz Marinho, mas passou a ter repercussão maior nos últimos dias.
"Abracei de imediato por compreender ser um debate importante, relevante", diz a deputada, que tem feito a defesa da medida na internet. Veja vídeo aqui.
Erika solicitou a realização de audiência pública na Câmara, já aprovada, mas que até agora não ocorreu. O que ela quer é dar início aos debates com toda a sociedade civil organizada, envolvendo não apenas trabalhadores, mas empregadores de vários setores.
"Dentro da Câmara essa era uma conversa que estava acontecendo mais no nosso campo, mas muito tímida. Agora isso mudou de figura, porque a PEC ganhou uma repercussão nacional, tem estado entre os assuntos mais comentados do final de semana."
A proposta de instituir jornada de quatro dias de trabalho já vem recebendo críticas. Segundo ela, no entanto, semana de quatro dias seria um ponto de partida para debater a redução da jornada.
"Estamos observando que outros setores estão tentando levar para outro lugar. Na política não existe texto cristalizados, temos a oportunidade de discutir os melhores caminhos. Estamos propondo algo para discutir não só com os trabalhadores, nós queremos ouvir os empresários, política se faz com negociação", diz.
A deputada afirma ainda ser simpática à antiga proposta das centrais sindicais, de redução da jornada de trabalho de 44 horas para 40 horas semanais, sem prejuízo do salário.
Ricardo Patah, presidente da UGT (União Geral do Trabalhadores) e do Sindicato do Comércio Varejista de São Paulo, que reúne 500 mil trabalhadores em sua base, diz que essa é uma "luta histórica das centrais sindicais".
Segundo ele, os trabalhadores de comércio e serviços seriam os mais beneficiados, mas deverá haver resistência do empresariado.
"Esse 6 X 1 hoje ele traz doença mental, depressão e várias outras questões porque é um verdadeiro exagero. Logicamente, vamos precisar da área empresarial. E num processo visto como oneroso eles vão para cima, mas vamos dialogar."
O advogado trabalhista Tercio Mourão, do Vieira e Serra Advogados, diz ser contra a medida. Para ele, a mudança poderá onerar empresas, que repassará os valores aos clientes. "Vai demandar mais mão de obra para execução do serviço e, com isso, aumento de custo e consequentemente repasse aos clientes".
Leonel Paim, presidente da AbraselSP (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de SP), afirma que, na prática, trabalhadores já demonstram exaustão com jornada do setor e, com isso, têm buscado alternativas.
"Não é uma questão de ser contra nem a favor. É quase uma coisa inevitável diminuir essa jornada de trabalho. Nossos trabalhadores e todos os outros estão procurando qualidade de vida. E isso também é possível hoje, porque tem muita opção de trabalho. Então, ficamos sem mão de obra. Tem que oferecer algo mais."
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O QUE PODE MUDAR?
Segundo o advogado Marcos Vinícius Nascimento, sócio do Nicoli Sociedade de Advogados, esse tema é bastante relevante e tende a ter grande apoio dos trabalhadores, mas requer muito debate e estudos.
A medida alteraria o texto da Constituição. Com isso, ele não vê necessidade de alterar a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), já que a Constituição se sobrepõe a ela, mas pode alterar a rotina de diversos setores, principalmente os que necessitam de trabalho 24 horas por dia.
Ele cita como exemplo segurança, vigilância, saúde e até mesmo algumas indústrias.
"Aumenta a empregabilidade, mas pode onerar o empregador, que terá mais encargos com empregos formais", diz.
Para o advogado Tercio Mourão, será preciso alterar a CLT depois de mexer na Constituição, caso a medida seja aprovada.
"Qualquer mudança na jornada de trabalho que altere as regras estabelecidas deve ser formalmente incorporada à Consolidação das Leis do Trabalho, uma vez que, atualmente, a jornada de trabalho está disciplinada nos artigos 58 e seguintes."
COMO É HOJE A JORNADA DO TRABALHADOR?
Pela regra atual da Constituição, a jornada de trabalho é de oito horas diárias, limitadas a 44 horas semanais, o que daria uma escala de trabalho 6 X 1 na maioria da categorias, mantendo a atividade de setores como comércio e serviços em supermercados, drogarias e shoppings centers, por exemplo.
O trabalhador com jornada de oito horas diárias tem direito a uma hora de intervalo para alimentação, o que, ao todo, o deixa cerca de nove horas à disposição da empresa.
Se ultrapassar as oitos horas diárias, o empregador deve pagar hora extra, caso não tenha outra forma de compensação, como banco de horas proposto em acordo ou convenção coletiva.
A hora extra de trabalho é paga no valor de 50% ao da hora de trabalho normal. O trabalhador tem de ter um descanso de 12 horas entre uma jornada e outra.
QUAL A JUSTIFICATIVA PARA A MUDANÇA?
As justificativas são duas: a saúde dos trabalhadores e a produtividade. Estudos feitos com base em jornadas menores em outros países demonstram que o trabalhador ficaria mais produtivo com mais tempo livre para descanso, vida em família, estudos e para cuidar de si.
Para Nascimento, no entanto, é preciso observar as peculiaridades da sociedade brasileira. "O ponto principal vai ser esse: hoje o Brasil tem maturidade para seguir como em outros países onde a jornada tem sido reduzida? No papel, é uma coisa, mas pode ser que se discuta a redução de salário do trabalhador."
Na justificativa para propor a mudança, a deputada diz que ser "de conhecimento geral que a jornada de trabalho no Brasil frequentemente ultrapassa os limites razoáveis", sendo "uma das principais causas de exaustão física e mental dos trabalhadores".
COMO FICARIAM AS OUTRAS JORNADAS?
O Brasil tem jornadas de trabalho variadas, como de seis horas diárias, por exemplo, de quatro horas para menores aprendizes e de 12 X 36 utilizada na área da saúde. O advogado acredita que, como já são exceção à regra geral constitucional, essas jornadas não devem mudar.
QUAL A MUDANÇA TRAZIDA PELA REFORMA TRABALHISTA DE 2017 NA JORNADA DE TRABALHO?
A jornada básica de trabalho constitucional, de oito horas por dia e 44 horas semanais, não foi alterada. Houve apenas a possibilidade de redução do intervalo para alimentação, que pode ser de 30 minutos, dependendo de acordo ou convenção coletiva.
A regra principal da reforma foi privilegiar o negociado sobre o legislado, ou seja, o que está em convenção ou acordo coletivo de trabalho pode valer mais do que a lei, desde que não seja esteja ferindo a Constituição.
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