Sou afro, tenho raízes!
Confira a coluna
Antes do jogo Brasil x Uruguai, no dia 19 de novembro, apropriadamente em Salvador, na Bahia, em ato de enorme simbolismo, Vinicius Júnior recebeu um “certificado de ancestralidade”, proporcionando que o País, o mundo e o próprio jogador tomassem conhecimento quanto à origem de sua ascendência: Camarões!
Decorre de um teste de DNA, em virtude de campanha da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), em parceria com uma empresa de rastreamento genético, voltada para pessoas negras.
Muito diferente da situação que abordei, há seis anos e dois meses, em artigo intitulado “O DNA do Afrodescendente” (A Tribuna, Vitória-ES, 9 de setembro de 2018, página 19): “(...) justamente quando se descortinava política mais definida para o afrodescendente, trazendo, dentre outras, a questão das cotas, mostrou-se forte o movimento para deslustrar a influência da cor da pele, firme na premissa de que “somos todos iguais”, divulgando-se, amplamente, o resultado de exame de DNA a que foram submetidas personalidades negras, na qual se constatava a porção europeia, ameríndia e africana”.
E ilustrei: “Pelo estudo, por exemplo, a ginasta Daiane dos Santos é mais europeia do que africana, o 'Neguinho da Beija-Flor' deveria ser conhecido por 'Branquinho da Beija-Flor'. (...) Ora, se é para efetivamente demonstrar que o negro é 'europeu', que nesse processo seja feito o difícil resgate de sua linhagem individual, até chegar à sua origem estrangeira, quando, infelizmente, se alcançá-la, possivelmente se deparará com várias histórias tristes quanto à sua 'porção europeia' (...)”.
Já no artigo escrito “Dupla Cidadania Africana” (A Tribuna, 26 de março de 2024, página 16), pontuei que tal estudo, “por certo, não objetivou e muito menos levará esse 'descendente europeu' a ser reconhecido, tratado e eventualmente beneficiado como tal”.
Contudo, no caso do jogador, embora não realizado o difícil resgate de cada etapa de sua linhagem individual, ao menos o objetivo e o resultado do teste não confundem um típico descendente africano como de origem europeia e nem incentivam ao oposto, deturpando o verdadeiro sentido das cotas.
Sendo certo que o conhecimento quanto à ancestralidade africana não perspectivará os mesmos benefícios do rastreio no que tange à europeia, não menos certo. Porém, que o tema deve pautar políticas públicas que garantam esse resgate histórico, não como ato isolado no que tange a certas personalidades, mas como direito de todo afro-brasileiro.
Razões sobram para isso, bastando exemplificar a forma como as raízes do afro-brasileiro foram arrancadas da África e cravadas aqui, transmitindo-se legado desde o início prejudicado, inclusive, mas não só, obviamente, no tocante ao conhecimento de sua própria história.
Ao lado disso, como não se trata de questão puramente econômica, o País deve melhor estreitar laços com essas nações africanas de origem, possibilitando que outras perspectivas se abram no dinâmico contexto das relações diplomáticas entre os povos, cuja identidade é atestada pelo próprio DNA.