Legalização das drogas: contra ou a favor?
É preciso ter muita cautela e não romantizar a legalização das drogas
Um assunto que transita tanto no meio acadêmico quanto nas rodas de conversa mais informais ganhou mais ênfase com a inclusão em pauta de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do Recurso Extraordinário em que se discute a constitucionalidade do crime de porte de drogas para consumo próprio, o que significa que se estaria próximo de redefinir se porte, exclusivamente para uso próprio, é conduta que merece a atenção do direito penal.
Mas a verdade é que a discussão, de fato, deu lugar a uma enquete que se repete de tempos em tempos “legalização das drogas: contra ou a favor?”. Essa é uma pergunta que já foi objeto de inúmeras discussões nos mais diversos contextos sociais e a resposta, seja ela qual for, envolve desde a ambientação de princípios morais e aspectos religiosos, até questões de saúde pública, política criminal e econômica.
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O tema está presente em várias dimensões na vida contemporânea. Então não parece possível afirmar, ao menos não por hora, que haja uma resposta simples ou totalmente precisa, na medida em que é necessário levar em conta diversos fatores e circunstâncias empíricas, antes de se decidir por uma ou outra solução e, ainda que a mais apropriada seja escolhida, teremos um longo percurso de adaptação pela frente.
Surgem comparações com outros países, a maior parte delas, entretanto, sem levar em conta que enquanto sociedade estruturada, cada um se organiza e se legitima a partir de suas próprias convicções, rituais e culturas. Igualmente, se invoca os reflexos da legalização no tráfico, que, inegavelmente, absorve grande parcela da população jovem e sem recursos da sociedade brasileira.
No entanto, parece possível afirmar que esses jovens, ainda distantes do tráfico, seguirão desprovidos de todas as outras alternativas de renda que, necessariamente, só estarão disponíveis se houver políticas públicas eficientes, o que implica na probabilidade de que eles voltem a buscar alternativas à margem da legalidade.
As discussões são saudáveis, mas é preciso que se pretenda enxergar o real panorama social, econômico e cultural do nosso País, antes de se defender uma mudança drástica como esta. Ainda, pode parecer necessário voltar a atenção para desafios mais urgentes, como aqueles que envolvem o tratamento público conferido aos dependentes químicos, e o controle das drogas lícitas, como álcool e cigarro.
Parece extremamente necessário que, antes de se pensar em aumentar o espectro de drogas legais, tenhamos maior controle sobre as que já se encontram disponíveis, através da implementação de políticas voltadas a coibir o fomento da sua utilização. O volume de publicidade de drogas lícitas nos meios de comunicação é enorme e contribui para o aumento do consumo, principalmente pelo público jovem, quando o que se deveria objetivar é a redução do consumo.
É preciso ter muita cautela e não romantizar a legalização das drogas, a ponto de imaginar ser uma solução simples para o problema que envolve saúde pública e criminalidade.
Ana Maria Bernardes é advogada especialista em Direito Criminal
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