De Freud a Einstein, sobre a guerra
Freud, em carta a Einstein, analisa as raízes da guerra e defende a civilização como caminho para sublimação da violência humana
No entreguerras, a Liga das Nações (1919-1946), precursora da Organização das Nações Unidas (1945), patrocinou uma publicação com cartas trocadas entre intelectuais de renome mundial convidados a falar sobre temas de interesse geral dos povos.
Um dos primeiros convocados, Albert Einstein escolheu Sigmund Freud como interlocutor. O tema: a guerra. “Por que a guerra?” é a resposta de Freud, datada de 1932.
Neste tempo em que vivemos em permanente “estado de guerra”, das desavenças íntimas que dilaceram famílias, passando pela violência urbana cotidiana, aos conflitos catastróficos que mancham de sangue o “planeta azul”, vale a pena recuperar um pouco do que o Pai da Psicanálise escreveu ao gênio da Física. Afinal, dissecar o mal é também uma via para combatê-lo.
Seguindo as interrogações de Einstein sobre como evitar a guerra, Freud aborda, primeiramente, que, como “em todo o reino animal”, em princípio, os conflitos de interesse e de opinião entre os homens se resolvem mediante emprego da violência. Mas pondera que o processo civilizatório criou alternativas aos litígios de aniquilação, como a política, a ética humanística, os arcabouços legais, o direito etc.
Ao assombro de Einstein pelo fato “de como é fácil mover os homens para guerra”, Freud, concordando, explica que há duas pulsões distintas nos humanos, a da vida – “que tende a conservar e unir” – e a da morte – “que procura destruir e matar”. “O prazer na agressão e na destruição é certamente um dos motivos” para o sim “à incitação à guerra”, pontua.
À intrigante pergunta “por que nos indignamos de tal forma com a guerra?”, Freud responde: “porque todos têm direito a sua própria vida, porque a guerra aniquila vidas humanas plenas de esperança, coloca o indivíduo em situações aviltantes”, entre outros absurdos. E arremata: nos indignamos porque somos pacifistas e simplesmente “não podemos deixar de fazê-lo”.
À constatação da agressividade estrutural, Freud contrapõe a potência de uma civilização que priorize a pulsão de vida e que, ao mesmo tempo, seja capaz de ofertar a seus membros alternativas de sublimação das pulsões destrutivas, desviando suas metas para a criatividade e a fruição artísticas, entre outros meios de simbolizar o mal que nos habita, sem que precisemos fazer passagens ao ato agressivo e mortífero, como é o caso das guerras.
“A condição ideal seria uma comunidade de indivíduos que tivessem sujeitado a sua vida instintual à ditadura da razão”, considera. Mas, enquanto esse tempo quimérico não é construído, Freud assevera: “uma coisa podemos dizer: tudo o que promove a evolução civilizacional também trabalha contra a guerra”.
A mensagem de Freud é evidente: não adianta negar a violência intrínseca à condição humana e o que precisamos é escolher em que tipo de civilização vamos investir, naquela presidida pela morte ou naquela tocada pela pulsão de vida. Guerras não são fatalidades, são constructos que revelam a face ambígua do humano – a espécie que sabe e que faz escolhas.
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