O lado suave da medicina
Crônicas e dicas do doutor João Evangelista, que compartilha sua grande experiência na área médica
Ao lidar com pessoas, o exercício da medicina envolve aspectos humanos, que ultrapassam os enfoques científicos. Recursos puramente técnicos perdem sua validade se desconectados do humanismo.
Com respeito, empatia e gratidão pelo paciente, narro algumas curiosas situações vividas durante meus cinquenta anos de atividade médica.
Recém-formado, eu trabalhava na rede municipal de saúde. Era uma tarde de sexta feira. Os pacientes formavam uma grande fila, aguardando-me chegar para atendê-los. Ao ver-me pedindo licença para alcançar a porta do consultório, um paciente interferiu: “Não vou deixar o senhor passar na minha frente?” Eu respondi que, se não passasse, ele não iria consultar. “Claro que vou!” “Sou o terceiro da fila e estou aguardando Doutor João”, completou. Informei que eu era o Doutor João. “Sério?”, disse ele”. “Nesse caso, o senhor pode passar”.
“Em caso de dúvida, procure orientação médica”. Essa advertência consta em toda bula de remédio. Medicamentos podem produzir efeitos colaterais, assustando pacientes e médicos. Diante de uma incômoda vertigem, prescrevi um antivertiginoso para Dona Norma. Dois dias depois, ela, com a caixa na mão, retornou ao consultório, dizendo: “Doutor, eu queria saber se vai ser preciso este medicamento me matar, antes de me curar. Se for assim, aqui está seu remédio e devolva minha tonteira”.
“Sr. Jaime”, disse minha secretária: “Seu cheque voltou?”. Ele respondeu: “Minha dor também”.
“Qual o valor da consulta, Doutor João?”. Quatrocentos reais, respondi. “O senhor tem remédio para dor no bolso?”, finalizou.
Consultando um simpático casal, ouvi: “Doutor, vamos viajar e precisamos fazer check-up para saber se está tudo bem?”
“Vocês estão indo pra onde, perguntei?” “Vamos à Paris”, respondeu a esposa. “Dizem que Paris é bom até com a mulher da gente”, adiantou o marido. A viagem foi cancelada.
Fui atender a sogra do humorista Juca Chaves, que estava se apresentando em Vitória. Durante a consulta, ao colocar o estetoscópio no peito da anciã, Juca advertiu: “Está perdendo seu tempo, João?” “Sogra não tem coração!”
Após ouvir eu dizer que ele tomasse o remédio após as refeições, um paciente respondeu: “Doutor, se eu comprar o remédio, não posso comprar as refeições?”
Embora goze de plena saúde, Dona Matilde, semana sim, semana não, aparece no meu consultório. “Gosto muito de saber se estou saudável”, exalta a contumaz paciente.
Lembre-se que a senhora passa tanto tempo no médico, cuidando da saúde, que não tem tempo de desfrutá-la, adverti. Quando o ruim fica bom, está pior do que nunca.
Lourival, um antigo paciente, queixou-se comigo, dizendo: “Doutor João, hoje eu não estou sentindo nada; será que isso é muito grave?”
Sorria, respondi. Rir é o melhor remédio.
Quando se passa a vida entre gargalhadas, se chega à velhice com os pulmões cheios de oxigênio.
A alegria não é um sentimento permanente, mas a alma tem necessidade de etapas felizes para se revigorar.
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