Dia do Alcoólico Recuperado: "O álcool me levou ao fundo do poço"
Relato é de uma ex-alcoólatra que ingeriu álcool pela primeira vez aos 13 anos, mesmo dia em que tomou o 1º "porre"
Escute essa reportagem
“Em minha casa aconteciam festas constantes, e aquele primeiro contato com o vinho me trouxe uma falsa sensação de liberdade. Aos poucos, o consumo aumentou e o álcool me levou ao fundo do poço”.
O relato é de uma ex-alcoólatra, que ingeriu álcool pela primeira vez aos 13 anos, mesmo dia em que tomou seu primeiro “porre”.
Por anos, o álcool foi refúgio para traumas da infância e dores emocionais. Mas, aos 33 anos, um grave acidente de carro, causado em parte pelo alcoolismo, foi o ponto de virada.
“Meu ex-marido estava dirigindo, mas eu, embriagada, comecei a discutir com ele, e o acidente aconteceu. Minha mãe ficou no CTI, e eu percebi que estava destruindo minha vida e colocando todos ao meu redor em risco.”
Com incentivo do ex-marido, ela buscou os Alcoólicos Anônimos em 2009. Hoje, após 15 anos longe do álcool, celebra a reconstrução de sua vida. “A recuperação é possível. Com ajuda, é possível ser feliz e reconstruir sonhos”.
Assim com ela, muitos dependentes conseguem dar a volta por cima. Em comemoração, é celebrado, no dia 9 de dezembro, o Dia do Alcoólico Recuperado.
A data simboliza não apenas a superação individual, mas também a importância do apoio familiar e social no enfrentamento do alcoolismo, que é uma doença crônica caracterizada pelo consumo incontrolável de álcool.
Em muitos casos, a dependência, que é progressiva, apresenta os sinais iniciais ainda na juventude ou até mesmo na infância.
Aos 70 anos, outro ex-alcoólatra, que preferiu não se identificar, celebra 35 anos de sobriedade, mas seu caminho até aqui foi marcado por desafios.
“Comecei a beber aos 14, 15 anos, por curiosidade e para me enturmar. No início, era algo social, mas com o tempo perdi o controle. Meus amigos iam embora e eu continuava bebendo sozinho”.
A virada aconteceu quando ele foi suspenso do trabalho por estar embriagado. “A empresa me enviou para uma clínica no Rio de Janeiro, onde participei de um programa com psicólogos e conheci os Alcoólicos Anônimos.”
Desde então, os 12 passos dos A.A. guiaram sua recuperação. “Aprendi que posso me divertir sem álcool”.
Lívia Guimarães, presidente da Junta de Serviços Gerais de Alcoólicos Anônimos do Brasil, destaca que uma pessoa vítima de alcoolismo afeta indiretamente uma média de cinco pessoas no entorno dela.
“A família e os amigos também adoecem. A data é uma oportunidade para transmitir a mensagem da recuperação para o alcoólico que ainda sofre”.
“Sentia vergonha de andar na rua”
Até os 18 anos, o álcool era motivo de aversão para um ex-alcoólatra, que preferiu não se identificar. Ele conta que, por conta da doença, perdeu família e dinheiro, tendo vergonha até de passar pela rua.
A Tribuna - Como começou a sua relação com o álcool?
Participante do AA - Então, até os 18 anos, eu não havia nem experimentado álcool. Eu tinha um pai alcoólatra e isso machucava muito. Então, eu tinha uma rejeição ao álcool.
Por volta dos 18 anos, parece que foi como uma “libertação”. Comecei a tomar bebidas mais fracas e gostei do efeito. Foi progressivo. Quando entrei numa grande empresa, aos 19 ou 20 anos, meus colegas me levavam para lugares onde se bebia muito, e eu entrei nesse ritmo. A partir daí, não parei mais.
Você sentia que o álcool te ajudava a lidar com o estresse?
Exatamente. Comecei a enxergar o dia da folga como o dia de beber. Mas, aos 23 anos, a situação já estava ficando complicada. Minha esposa, com quem me casei aos 21, começou a perceber os problemas.
Nessa época nós já tínhamos uma filha, que nasceu logo após o casamento. Aos 23 anos, minha esposa me alertou: “Como vamos cuidar da nossa filha se você continuar assim?”. Ela foi procurar ajuda com uma assistente social, e eu acabei no Programa de Atenção ao Alcoólatra, no Hospital das Clínicas, que me indicou os Alcoólicos Anônimos.
Fiquei mais de 10 anos sem beber, estudei e me formei em dois cursos superiores. Mas, por volta dos 30 anos, voltei a beber. A doença é progressiva. Aos 40 anos, estava arrasado novamente, e o álcool abriu portas para outras drogas.
Perdi família, sanidade, juízo e a espiritualidade. Sentia vergonha de andar na rua, mas não conseguia parar. Perdi uma empresa que valia milhões de reais.
O que aconteceu para que buscasse ajuda novamente?
Aos 43 anos, minha ex-esposa e minha filha me internaram numa clínica. Passei dois meses lá. Quando saí, recaí em cinco dias e passei 15 dias de trevas. Foi nessa época que tive um despertar espiritual. Decidi voltar aos Alcoólicos Anônimos. Lá, encontrei um grupo que me acolheu e comecei a levar a recuperação a sério.
Comecei a fazer a programação dos 12 passos e prestar serviços no grupo. Depois de uns 25 dias, minha esposa foi ao grupo para me ver e reatamos. Ela hoje participa do Al-Anon, que é o grupo para familiares de alcoólatras.
Qual mensagem você gostaria de deixar para quem está passando por algo parecido?
Se o álcool está causando problemas, procure ajuda. Não vale a pena. O que dizem sobre o álcool na mídia é mentira. Ele causa perda de raciocínio, equilíbrio e destrói famílias. Não vale a pena criar problemas na sua vida e na dos outros.
Onde buscar ajuda
Vitória
A Unidade de Acolhimento Transitório Adulto será um espaço que tem como objetivo ofertar acolhimento e cuidados contínuos a pessoas com uso problemático de álcool e outras drogas.
A unidade será vinculada ao Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Álcool e Drogas e realizará o acolhimento temporário de adultos por um período de até seis meses.
A porta de entrada preferencial é pelo Caps AD, na rua Álvaro Sarlo, 181, Ilha de Santa Maria, e funciona de segunda a sexta, de 7h às 20h.
Cariacica
Conta com o Programa Municipal de Álcool e outras Drogas (Promad).
O programa atua na Unidade Básica de Saúde (UBS) de Jardim América, e inclui o atendimento psicossocial, oferecendo tratamento específico para usuários com o quadro de alcoolismo e outras drogas e apresentam o desejo em realizar o tratamento, na modalidade porta aberta, atendendo demandas espontâneas.
Vila Velha
O CAPS AD oferece tratamento gratuito e especializado para pessoas em uso prejudicial de álcool e drogas.
O serviço oferece acompanhamento psicológico, psiquiátrico e social, além de atividades terapêuticas em grupo. Atualmente acompanha cerca de 350 usuários.
Serra
Os pacientes que buscam serviços na área de saúde mental podem procurar a unidade de saúde mais próxima de casa.
Conta ainda com o Caps Álcool e Drogas (Caps AD), que são unidades especializadas que têm como finalidade a reinserção social pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários.
Estado
A porta de entrada da Rede de Atenção Psicossocial é nas unidades básicas de saúde nos municípios. Os casos graves são encaminhados para atenção especializada e são atendidos nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps).
A Secretaria de Estado de Governo (SEG) trabalham com a triagem e acolhimento de pessoas com dependência química no Centro de Acolhimento e Atenção Integral sobre Drogas (CAAD).
Alcoólicos Anônimos
É uma irmandade de pessoas que compartilham, entre si, suas experiências, forças e esperanças, a fim de resolver seu problema comum e ajudar outros a se recuperarem do alcoolismo. O único requisito para ser membro é o desejo de parar de beber.
São cerca de 75 grupos e 205 Reuniões de Recuperação realizadas semanalmente no Estado. As linhas de ajuda são: (27) 32237268 e (27)9999-33395.
Comentários