Reforma tributária ao avesso
Leitores do Jornal A Tribuna
A proposta de reforma do Imposto de Renda, apresentada há alguns dias pelo governo federal, trouxe forte reflexo no mercado ao propor a tributação de lucros e dividendos – hoje isentos – e o fim da possibilidade de dedução dos valores de Juros sobre Capital Próprio (JCP) das bases de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL).
O governo erra não só no conteúdo, como na forma: ao descartar uma revisão ampla e propor uma reforma tributária fatiada, expõe-se ao risco desnecessário de aprofundar ainda mais as diversas assimetrias e contradições que caracterizam nosso sistema.
As medidas propostas pelo Executivo nesta segunda fatia da reforma não poderiam vir em pior momento, dado a crise da pandemia da Covid-19 no País, que certamente afugentará investimentos no Brasil.
O projeto prevê a tributação dos dividendos a uma alíquota de 20% na fonte pagadora e tributação sobre remessas de lucros ao exterior à alíquota de 20%, majorada em 30% se a remessa for para paraísos fiscais.
Há a previsão de uma isenção de até R$ 20 mil por mês a microempresas e empresas de pequeno porte.
O projeto também estabelece vedação à dedução dos valores de Juros Sobre Capital Próprio (JCP) das bases de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL).
A possibilidade é vista hoje como a maior vantagem deste instituto. Isso porque, apesar de serem tributados na fonte a uma alíquota de 15%, os JCP podem ser deduzidos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL por empresas no Lucro Real.
Ao tributar dividendos e JCP, o governo onera as duas principais formas de obtenção de retorno financeiro, afastando ainda mais os investidores.
A baixa carga tributária sobre tais rendimentos é um artifício utilizado para compensar nossos gargalos regulatórios e de infraestrutura que há décadas não conseguimos superar.
No momento em que sofremos com perda de investimentos e os mesmos geram liquidez para a economia, é inoportuna essa proposta agora, pois torna mais caro para o investidor colocar dinheiro em uma atividade produtiva ou mesmo investir no mercado financeiro brasileiro.
Atualmente tem-se uma tributação de 34% na pessoa jurídica e 0% sobre o acionista, sendo que o projeto estabelece tributação de 29% na pessoa jurídica e 20% no acionista, aumentando em muito a tributação, além de trazer mais complexidade ao sistema.
Nota-se, por exemplo, que ao se criar a faixa de isenção de R$ 20 mil, o que está se fazendo é aumentar assimetrias e desestímulo ao crescimento das empresas.
Em relação ao fim da dedutibilidade dos JCP, será a revogação do próprio instituto, justamente em um contexto de tentativa de recuperação econômica, de busca por melhores condições de mercado, mais competitividade e atratividade de investimento.
A reforma tributária, portanto, precisa ser realizada “ao avesso”.
Samir Nemer é advogado tributarista
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