O Teatro e o abre e fecha de cortinas que jamais morrerá
Leitores do Jornal A Tribuna
“O Teatro se finge de morto, só para ver quem é que vai ao enterro”. Confesso que desconheço a autoria dessa frase, que soa, para mim, tão emblemática. O fato é que ela chegou aos meus ouvidos, e com alguma agudeza, por meio de um amigo-ator.
De qualquer modo, essa afirmativa, especialmente neste momento de obscurantismo social, político e cultural brasileiro, num país enigma, catastrófico, vem travestida de uma esperança que, definitivamente, não tem nada de ingênua. Ao contrário, ela anuncia e aposta, com competência colaborativa e protagônica, que ele, o Teatro, mais uma vez, não sucumbirá.
No último dia 19 de agosto, no Brasil, comemorou-se o Dia do(a) Artista de Teatro. Ah, quantos saberes e quantos fazeres estão atrás das cenas que vocês (não) veem! Quantos(as) profissionais ajudam a levantar o espetáculo e manter viva a chama dessa Arte que se confunde com a história da nossa própria espécie!
O ofício de Artista de Teatro, indubitavelmente, é tão importante quanto qualquer outro. Uma pena que, por aqui, a gente não se comporte reconhecendo isso. Um dos exemplos é a maneira como nós, sociedade, geralmente, reagimos diante da fragilidade da implementação e execução de políticas públicas.
Quando faltam vagas nas escolas públicas, de quaisquer níveis, reclamamos. Quando faltam as, supostas, condições de segurança pública, reclamamos. Quando faltam leitos nos hospitais públicos, reclamamos. Reclamamos, legitimamente, de todas essas ausências.
Quando faltam espaços culturais, sobretudo públicos, dedicados às Artes, nós, que já sentimos falta de tantas coisas, nem sentimos mais falta e, por isso, não reclamamos. Assim, encolhemo-nos na nossa condição humana. Enquanto isso, aquelas e aqueles que se alimentam da nossa resignação com a coisa pública, ferozmente, se agigantam.
Hoje, mesmo que não fosse a pandemia provocada pela Covid-19, e ainda que se quisesse, seria praticamente impossível reverenciar, especialmente no Teatro, enquanto espaço cultural edificado – mas, evidentemente, não encerrado nele – aquelas e aqueles que, dedicados ao ofício, vieram antes de nós e que, sem dúvida, contribuíram e seguirão contribuindo para que o espetáculo, depois de nós, siga adiante.
Nessa direção, são muitos os nomes aos quais, pelas suas contribuições ao campo do saber-fazer teatral, devemos nossas reverências. Entre eles, e só para citar alguns: Amir Haddad, Antunes Filho, Augusto Boal, Grace Passô, José Celso Martinez Correa; e mais, Carla van den Bergen, Edson Nascimento, Erlon Paschoal, Fernando Marques, José Luiz Gobbi, Marcelo Ferreira, Margareth Galvão, Milson Henriques, Nieve Mattos, Paulo de Paula, Rejane Arruda, Robson de Paula, Vera Viana, Wilson Coêlho, Wilson Nunes, Wyller Villaças, e tanta gente.
Observemos, contudo, além desse potente elenco, nossos territórios. Quais e quantas são as companhias, coletivos ou grupos de teatro que conseguem se manter respirando?
Por essas e outras, de certo modo, a gente vai ao enterro! Nele, com alguma ponta de reflexão, olhamos para a grande caixa preta. Nesse instante, somos visitados por típica (in)certeza: – ele piscou, ele piscou para mim! Abramos nossos olhos, antes que as cortinas se fechem.
Lilian Menenguci é escritora e professora.
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