Polícia investiga uso de fotos de menores adulteradas para golpes
Imagens retiradas de redes sociais são manipuladas para extorsão e bullying. Especialistas alertam para superexposição
Em todo o País, as polícias Civil e Federal investigam o uso de Inteligência Artificial (IA) para fraudar fotos de crianças e adolescentes. Segundo especialistas, as imagens são alteradas para extorsão, exposição por bullying escolar, humilhação pública em grupos ou comercialização.
No Espírito Santo, um caso de manipulação de imagem de uma adolescente é investigado na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). Após o fim do namoro com um adulto, o homem modificou uma foto enviada pela vítima e a divulgou com o nome dela.
“Com a investigação, que está em curso, estamos conseguindo comprovar que a foto foi manipulada pelo suspeito. Os pais precisam orientar seus filhos, pois é responsabilidade dos pais acompanhá-los e ajudar a evitar essa exposição”, afirmou o titular da DPCA, Marcelo Cavalcanti.
O advogado especialista em Ciências Criminais Marcelo Paiva observa que, em regra, os indivíduos coletam fotos ou vídeos comuns de uma pessoa, muitas vezes postadas pelas próprias vítimas ou seus pais em redes sociais abertas, e utilizam aplicativos de IA e bots que “despem” a pessoa digitalmente.
Outra possibilidade é, por meio dessas ferramentas tecnológicas, “recortar” o rosto da vítima de uma foto a que o indivíduo teve acesso e “colar” em um vídeo ou foto pornográfica, no lugar do rosto real, como se a vítima estivesse presente naquela situação íntima.
“Muitas vezes, as pessoas podem ser efetivamente levadas a acreditar que tais imagens são reais, o que pode causar um dano ainda maior às vítimas”, alerta Paiva.
O especialista em segurança pública e privada Emir Pinho observa que o enfrentamento desse tipo de violência exige mais que tecnologia; exige consciência social, diálogo contínuo e resposta rápida.
“A Inteligência Artificial continuará avançando, e a proteção de crianças e adolescentes dependerá da capacidade coletiva de transformar informação em vigilância preventiva e apoio efetivo às vítimas”, afirmou Emir Pinho.
Curso para flagrar crime cometido com uso de IA
Policiais federais de todo o País, incluindo os que trabalham no Espírito Santo, participaram de um curso sobre investigação de crimes praticados com o uso de Inteligência Artificial (IA). A informação é do chefe da delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos da Polícia Federal no Estado, Gustavo Buaiz.
“Policiais federais fizeram curso sobre esse tipo de investigação. No País, temos inquéritos de criminosos que pegam fotos de crianças vestidas e manipulam. Estamos nos dedicando a esse tipo de investigação”.
De acordo com o delegado, até este mês, foram 20 operações da Polícia Federal no Espírito Santo para combater o crime de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes.
O advogado e especialista em Ciências Criminais Marcelo Paiva explica que, sem abordar especificamente menores de 18 anos como vítimas, o Código Penal estabelece como crime o registro não autorizado da intimidade sexual, com penas de 6 meses a 1 ano, estabelecendo em seu parágrafo único que a mesma pena é aplicada para quem realizar montagem de qualquer registro para incluir pessoa em cena de caráter íntimo.
“Além disso, o art. 147-B, que tipifica o crime de violência psicológica contra a mulher, foi recentemente modificado para inserir uma causa de aumento de pena quando o crime é cometido por meio de recurso tecnológico que altere a imagem da vítima, como a IA”, afirmou Marcelo Paiva.
Em relação à proteção de crianças e adolescentes, ele destaca o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que tipifica o crime de simulação de criança ou adolescente em cena de pornografia por meio de adulteração, estabelecendo penas de 1 a 3 anos. Um projeto está em andamento no Congresso Nacional sobre crimes com IA.
Saiba Mais
Como os criminosos agem
Criminosos coletam imagens públicas ou compartilhadas em grupos de mensagens, capturam prints de vídeos ou obtêm fotos por meio de perfis falsos que se passam por adolescentes.
A partir de uma única imagem, softwares de IA reconhecem o rosto da vítima e o combinam a corpos sintéticos, produzindo montagens hiper-realistas que simulam nudez ou atos sexuais.
O que fazem com as fotos
As montagens são usadas principalmente para três finalidades:
Extorsão
O criminoso envia o nude falso para a vítima e ameaça divulgar o conteúdo caso ela não pague, não envie outras imagens ou não cumpra exigências impostas.
Exposição deliberada
Seja por bullying escolar, seja por humilhação pública em grupos da comunidade ou da própria escola, com danos sociais imediatos.
Comercialização
Redes clandestinas compram e distribuem fotos adulteradas como se fossem reais, mantendo em circulação conteúdos que perpetuam o abuso, mesmo quando a criança se torna adulta.
Principais riscos
Crianças e adolescentes, ao verem sua imagem falsamente sexualizada, entram em pânico e, muitas vezes, escondem a situação por medo ou vergonha.
O resultado pode incluir ansiedade, depressão, isolamento social, queda no desempenho escolar.
Mesmo falso, o conteúdo pode circular como verdadeiro entre colegas, familiares e desconhecidos.
Legislação
A Câmara dos Deputados aprovou, neste ano, projeto de lei que inclui no Código Penal o crime de manipular, produzir ou divulgar conteúdo de nudez ou ato sexual falso gerado por tecnologia de inteligência artificial e outros meios tecnológicos.
A pena prevista é de 2 a 6 anos de reclusão, com aumento caso a vítima seja mulher, criança, adolescente, pessoa idosa ou com deficiência. O projeto ainda está pendente de análise pelo Senado.
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