“Perdi a memória após uma parada cardíaca”, conta advogado de 39 anos
Osny Barbosa Neto estava jogando futebol quando se chocou com um colega e desmaiou. Ele precisou colocar marca-passo
Era uma sexta-feira de março, final de tarde, e como costume de quase toda semana, o advogado Osny Barbosa Neto, na época com 39 anos, saiu da academia e foi jogar futebol com os amigos.
Mas, naquele dia, um impacto com outro colega de campo mudou sua vida. Ele sofreu uma parada cardíaca e perdeu a memória.
“Não lembro do que aconteceu naquela noite, mas meus colegas contaram que 'trombei' com outro jogador, andei ainda um pouco em campo, caí, apaguei e comecei a convulsionar. Eu tentava buscar o ar. Segundo os relatos que tive, meu coração ficou parado 37 minutos. Quando acordei, tinha perdido a memória”, conta.
Os amigos do advogado, que o acompanhavam em campo, iniciaram a massagem cardíaca e o levaram para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) na Serra, onde os médicos continuaram o processo de reanimação e ele recebeu o primeiro atendimento.
Em seguida foi transferido para o Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes (Hucam), em Vitória.
“Fiquei cerca de 25 dias internado no Hucam. Cerca de 40 pessoas foram me visitar, e eu lembrava de apenas duas delas, que eram meu irmão e meu cunhado, que ficaram comigo bastante tempo”.
Osny relata que, por conta da falta de memória, até mesmo ler e escrever não sabia mais.
“A princípio, eu perdi a memória de tudo. Depois, comecei a lembrar mais de coisas do passado do que recente dos últimos meses. Eu não lembrava nem mesmo que tinha um apartamento”.
Hoje, com 40 anos, a memória do advogado está melhor, mas ele segue em tratamento. “Tomo diariamente cerca de 12 medicamentos e também tenho marca-passo no coração”.
Por enquanto, Osny ainda não pode voltar a praticar musculação e nem jogar futebol. “O médico me liberou apenas para caminhadas leves e andar de bicicleta”.
Estudo
Há menos de três meses ele voltou ao trabalho e, para auxiliar na recuperação de sua memória, está refazendo uma pós-graduação em Direito Civil, que havia feito três anos antes do episódio.
“Decidi que precisava fazer algo a mais para estimular meu cérebro. O que me perturba ainda é não poder trabalhar com todo afinco e qualidade que trabalhava antes, isso me deixa um pouco chateado. Mas tenho evoluído”.
Médico explica problema que afetou o advogado
Toda a situação vivida pela advogado Osny Barbosa Neto, de 40 anos, é classificada pela medicina como morte súbita abortada, conforme explica o cardiologista Leandro Rua Ribeiro, chefe do Setor de Paciente Crítico do Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes (Hucam) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
“Ele teve uma arritmia que desencadeou a parada cardíaca. A causa da arritmia – chamada de fibrilação atrial – não foi determinada. Pelo tempo que ele ficou sendo reanimado, quase 40 minutos, provavelmente, pelo baixo fluxo cerebral de sangue – ele ficou sem perfundir o cérebro por muito tempo – ele passou por esse déficit neurológico”.
Segundo o médico, a perda de memória apresentada pelo advogada está associada a esse período em que Osny ficou sem fluxo cerebral efetivo. “O que manteve ele vivo foram as reanimações, as massagens cardíacas. Se ele não tivesse sido massageado pelos amigos e depois por quem o buscou, provavelmente ele não teria resistido e teria evoluído com morte cerebral”, explica.
O cardiologista destaca ainda que é normal o paciente perder a memória da fase em que sofre a parada cardíaca.
“Há outra questão também é que ele ficou muito tempo sedado e entubado. Ele não foi reanimado e voltou logo, ele teve de ficar sob efeitos de sedativos e esses medicamentos têm interação que podem causar amnésia, que pode ser passageira ou permanente”.
De acordo com o especialista, existem arritmias de todos os tipos: benignas e malignas. E algumas são associadas à morte súbita. Agora, o que gera arritmia que é o problema”.
No esforço físico, segundo o médico, a grande causa da arritmia é o infarto mesmo, que é a morte súbita jogando bola.
“Porém, há outras causas. O paciente pode ter nascido com uma má-formação que gera arritmia. Pode ter alguma doença como a miocardiopatia hipertrófica, que é muito comum em atletas que morrem no campo jogando bola. Essas causas geram arritmias malignas que fazem o coração parar”.
O cardiologista alerta para a importância do check-up cardiológico após os 30 anos.
“Meu coração ficou parado 37 minutos”
Oito meses após ter sofrido uma parada cardíaca que resultou em uma perda de memória, o advogado Osny Barbosa Neto, de 40 anos, conversou com a reportagem de A Tribuna e contou como foi acordar sem recordar de sua vida.
A Tribuna — Você tinha algum problema cardíaco?
Osny Neto — Eu não tinha nenhum problema de saúde, mas era um pouco relapso em ir ao médico. Era bem saudável, praticava esportes e cuidava da alimentação.
Pode contar o que fez no dia do acidente?
Era uma sexta-feira. Acordei, fui trabalhar. No início da noite fui para a academia e na sequência fui jogar futebol.
Lá você foi atingido por uma bola? O que aconteceu?
O que vou relatar eu não lembro, mas, segundo meus amigos contam, eu tive um impacto com outro colega, nada forte, tipo uma trombada, até andei um pouco, mas caí, apaguei e convulsionei. Eles contam que meu coração ficou parado 37 minutos. Não sei te explicar, mas conseguiram me reanimar.
Lembra do momento em que acordou?
Não lembro o momento exato que acordei. Fiquei internado 25 dias. Durante um mês é como se meu cérebro tivesse “ido”. Cerca de 40 pessoas foram me visitar e eu lembrava apenas de duas pessoas, meu irmão e meu cunhado. Quando cheguei em casa e vi meus pais é que lembrei deles.
Eu não conseguia ler ou escrever. Me sentia como um pedaço de carne e osso na Terra.
Precisou fazer algo para voltar a ler?
Eu tentava forçar a minha mente. Minha cunhada me deu uma revista em quadrinhos, da Turma da Mônica, tentava ler aquilo. Mas um dia acordei e consegui ler. Hoje minha leitura está normal.
Quais acompanhamentos precisou fazer?
Fui em todo tipo de médico. Fiz acompanhamento com neurologista, faço terapia ocupacional e fiz terapia para acertar minha coordenação motora. Agora estou bem fisicamente.
Teve algum momento que te bateu um desespero?
Teve um momento que ficava pensando se voltaria ao que era antes, me questionava até se valia a pena viver daquele jeito. Mas isso serviu de aprendizado.
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