Brasileiros fizeram Fernanda Torres chegar ao Oscar, diz o presidente da Academia
Americano veio ao país para participar do Festival do Rio, que exibe mais de 300 filmes na capital fluminense entre esta semana e a próxima

A campanha barulhenta dos brasileiros nas redes sociais pelo filme "Ainda Estou Aqui" ajudou mesmo Fernanda Torres a chegar ao Oscar este ano, diz Bill Kramer, presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, entidade que elege os indicados e vencedores da premiação mais importante do cinema.
"O movimento certamente fez os votantes prestarem atenção no filme e na atuação dela", afirma ele ao receber a reportagem no enorme quarto do hotel de luxo onde está hospedado no Rio de Janeiro, à beira da praia de Copacabana. O americano veio ao país para participar do Festival do Rio, que exibe mais de 300 filmes na capital fluminense entre esta semana e a próxima.
Uma das sessões, na terça-feira, será de "O Agente Secreto", o filme escolhido pelo Brasil para tentar a sorte no Oscar do ano que vem. Dirigido por Kleber Mendonça Filho, o longa tem tido traçado boa trajetória nos festivais internacionais, mais ou menos como fez "Ainda Estou Aqui" -em Cannes, "O Agente Secreto" levou os prêmios de direção e de ator, para o protagonista Wagner Moura.
Kramer, porém, diz não poder comentar o filme nem qualquer outro que tenta uma vaga na corrida pelo troféu. Os indicados devem ser anunciados em janeiro.
Mas ele quis elogiar outra produção nacional. "'Ainda Estou Aqui' é uma obra-prima, lindo, cheio de coração. O tema do filme é relevante hoje para o mundo hoje. Fernanda é uma atriz excepcional, um ser humano adorável. Pude sentar com ela no último Oscar, foi uma noite maravilhosa."
Indicada ao troféu de melhor atriz, Torres perdeu para Mikey Madison, de "Anora". "Ainda Estou Aqui", entretanto, venceu a categoria de filme internacional, feito inédito para o Brasil, e rendeu ao país uma indicação ao troféu principal, de melhor filme, também pela primeira vez na história.
As conquistas foram celebradas pelos brasileiros, que enchiam as redes sociais da Academia do Oscar diariamente com pedidos pelas indicações, e depois, pelos prêmios.
"Ficamos sem entender o que estava acontecendo. Todos aqueles comentários em português, foi fantástico. Pensamos: 'é, estamos mesmo globais'", ele diz sobre a vez em que a Academia publicou uma foto de Torres no Instagram e recebeu 3 milhões de curtidas em poucos dias, muito mais que as imagens de celebridades como Demi Moore e Andrew Garfield. O perfil da premiação aproveitou para fazer graça e comentou na postagem que Torres "é mãe", um jargão de internet usado para elogiar artistas mulheres.
A brincadeira ilustra uma vontade profunda da Academia -a globalização. Hoje formado por mais de 11 mil membros, o grupo de votantes tem cerca de 20% de pessoas fora dos Estados Unidos, número que aumenta todo ano, numa tentativa de aumentar as chances de vitória para filmes internacionais. Esse movimento ganhou força com a consagração do sul-coreano "Parasita" em 2020.
É o oposto do que almeja o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Ele anunciou, na última semana, que vai impor tarifa de 100% para filmes feitos fora do país que queiram ser exibidos por lá. "A nossa indústria de cinema foi roubada por outros países, como quem rouba 'doce de criança'", escreveu em sua rede social, a Truth Social.
Questionado sobre o movimento, Kramer diz que "a forma como as pessoas estão fazendo filmes é de natureza global, isso não vai mudar, só aumentar", sem citar o nome do presidente.
Há cinco anos, o Oscar anunciou uma espécie de sistema de cotas para garantir que mais artistas não brancos, mulheres, LGBTQIA+, latinos e pessoas com deficiência estejam presentes em vários estágios de um filme que tenta concorrer ao prêmio, diante ou atrás das câmeras. As regras passaram a valer no ano passado.
Kramer veio ao Brasil com Meredith Shea, executiva que chefia essas iniciativas de diversidade da Academia. Perguntada sobre os efeitos das mudanças, ela foi positiva. "Estamos entusiasmados com a ampliação da nossa organização. É ótimo, por exemplo, estar um dia falando com um líder de festival de cinema brasileiro, que depois pode conversar com um editor de filmes de Nova York". Nesta sexta-feira, a dupla deu uma palestra no Rio sobre as ações de globalização e de atualização do Oscar.
Neste ano, a Academia criou uma regra que permite que cineastas refugiados, ou perseguidos politicamente, inscrevam seus filmes por meio de outro país sem perder a autoria ou identidade da obra.
Isso surgiu após o caso do diretor iraniano Mohammad Rasoulof, que fugiu do Irã e teve que inscrever "A Semente do Fruto Sagrado" como produção da Alemanha para concorrer ao Oscar de filme internacional. Mas o controle criativo ainda tem de estar nas mãos dos refugiados, a regra reforça.
Como checar isso na prática? "Estamos entendendo isso", diz Kramer. "Mas essa é uma alteração que vai ajudar quem está sob refúgio político, e queremos que as histórias deles sejam contadas."
MATÉRIAS RELACIONADAS:




Comentários