Por que Pantanal era sonho de Kongjian Yu, arquiteto morto em acidente de avião: ‘Bioma-esponja’
Arquitetos e autoridades lamentaram a morte do chinês Kongjian Yu, um dos maiores arquitetos e urbanistas do mundo e criador do conceito de “cidade-esponja”.
Ele e dois documentaristas brasileiros — Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz e Rubens Crispim Jr. — morreram nesta terça-feira, 23, em um acidente de avião em Mato Grosso do Sul durante viagem ao Pantanal.
Kongjian Yu estava no País para participar da Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, organizada pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), e gravar cenas do documentário que realizava sobre as cidades-esponja, proposta voltada a combater enchentes e eventos climáticos extremos por meio da ampliação de áreas verdes e permeáveis.
Ele discursou por duas horas sobre o tema na última sexta-feira, 19, na abertura da bienal e partiu para o Pantanal para continuar as gravações.
A presidente do IAB, Raquel Schenkman, disse ainda estar em choque com a notícia. “Almocei com ele e os cinegrafistas na semana passada. Eles estavam superanimados justamente para ver o Pantanal. Ele queria entender como o conceito das cidades-esponjas se aplicava ali. É uma tragédia”, disse ao Estadão.
Outro que esteve com ele nos últimos dias foi o vereador paulistano e urbanista Nabil Bonduki (PT), entrevistado por Yu para o projeto audiovisual. “Era o sonho dele ir para o Pantanal, porque, para ele, esse era um bioma-esponja, estruturado exatamente pela regeneração das águas”, comentou.
“Ele teve uma importância enorme não só por defender a permeabilidade das cidades, mas por conseguir implementar essa política pública. Não é implantar um ou outro parque. É fazer isso de uma maneira ampla e generalizada”, acrescentou o vereador.
A presidente do IAB, Raquel Schenkman, lembra a importância que ele teve em Xangai, na China, e em outros centros urbanos. “Ele transformou esses cenários desocupando as margens de um rio doente, por exemplo, criando um parque na margem, implantando vegetação e, com isso, permitindo a retomada das águas na cidade”.
Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e curador da bienal, Renato Anelli afirmou que essa “é uma perda inimaginável para o mundo inteiro, ainda mais com o aquecimento global”. Anelli acompanhou Kongjian Yu na semana passada durante gravações do documentário na capital paulista. “Passamos pelos principais rios, pela Cidade Universitária, que tem bastante vegetação, na Casa de Vidro Lina Bo Bardi, rodeada pelo verde. Ele também quis conhecer o Vale do Anhangabaú, onde passava um córrego. E sempre trazia um comentário sobre o que poderia ser feito para melhorar a absorção das águas.”
Instituições e autoridades se manifestam
O IAB manifestou “profundo pesar” pela morte de Kongjian Yu. “Ele deixou um legado monumental e urgente para o enfrentamento das crises climáticas nas cidades. Sua contribuição transcende fronteiras e permanecerá como uma inspiração para as presentes e futuras gerações de arquitetos e urbanistas”, informou, por nota.
O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil também publicou nota de pesar. “Kongjian Yu foi uma das maiores referências do planejamento urbano sustentável, destacando-se por promover uma abordagem que integra gestão de águas pluviais, paisagismo resiliente e a convivência harmoniosa entre infraestrutura urbana e ecossistemas naturais.”
Kongjian Yu também esteve no Brasil no ano passado para um evento do BNDES. O presidente da instituição, Aloizio Mercadante, lamentou a morte do arquiteto. “Yu era um grande e estratégico parceiro do Brasil sustentável. Manifesto publicamente minha solidariedade a todos os familiares e admiradores do trabalho de Kongjian Yu. Estendo meus cumprimentos aos familiares e amigos dos cineastas e documentaristas brasileiros Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz e Rubens Crispim Jr. e do piloto Marcelo Pereira de Barros, também vitimados pelo acidente.”
O vice-presidente Geraldo Alckmin também comentou a morte do arquiteto. “Seu legado continuará inspirando todos que se dedicam à causa ecológica. Meus mais profundos sentimentos aos familiares de Yu e ao povo chinês, assim como aos amigos e parentes dos cineastas e do piloto.”
O jornal britânico The Guardian e a agência de notícias Reuters também repercutiram a morte de Kongjian Yu.
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