“Transplante salvou minha vida após vício em álcool”, diz aposentado
Diagnosticado com cirrose alcoólica, Jorge Cristovão precisou enfrentar quatro anos de espera até receber um fígado compatível

O aposentado Jorge Cristovão, de 62 anos, carrega uma história de superação marcada pelo vício e pela esperança. Diagnosticado com cirrose alcoólica, ele precisou enfrentar quatro anos de espera na fila do Sistema Único de Saúde (SUS) até receber um fígado compatível. O transplante aconteceu em 2005, quando tinha 42 anos, e lhe deu a chance de recomeçar.
Hoje, completando 20 anos de transplante, Jorge leva uma vida saudável, longe do álcool — que abandonou sete anos antes da cirurgia. Todos os dias, quando o tempo permite, ele nada 1.500 metros na Praia da Costa, em Vila Velha. “Depois que recuperei minha saúde, passei a valorizar muito mais a vida. O transplante me deu a oportunidade de viver novamente com qualidade”, afirmou.
A gratidão à família do doador é algo que ele não esconde. “É o maior ato de amor perante os olhos de Deus. Para o receptor, é a nova chance de viver”, disse, emocionado. Jorge reforça a importância do diálogo sobre a doação de órgãos com familiares, já que a autorização é fundamental para salvar vidas.
O relato de Jorge se soma ao alerta de especialistas. Segundo o cirurgião do aparelho digestivo e especialista em transplante hepático da Rede Meridional Alberto Stein, a recusa familiar ainda é o maior entrave para ampliar o número de transplantes.
“No Espírito Santo, a taxa de negativa familiar gira em torno de 50%, chegando em alguns casos a 58%. Se esse índice fosse menor, poderíamos praticamente dobrar o número de órgãos doados e, consequentemente, de transplantes realizados”, explicou.
De acordo com Stein, os desafios também passam por questões logísticas e técnicas, como o tempo de transporte do órgão. Ele lembra que mitos ainda afastam possíveis doadores, como o medo de desfiguração do corpo.
“A cirurgia de remoção é delicada, e os cirurgiões reconstituem o doador da melhor forma possível, permitindo uma despedida digna”, esclareceu.
A cirurgiã e especialista em transplante hepático Priscila Ávila reforça a importância de campanhas de conscientização, como o Setembro Verde, mês dedicado à divulgação da doação de órgãos no Brasil.
“O Setembro Verde é um momento de conscientização sobre a importância da doação de órgãos e um momento para que esse ato sublime de amor ao próximo seja normalizado na nossa sociedade.”
“Passei a valorizar mais a minha vida” - Jorge Cristovão, aposentado transplantado
A Tribuna - Você está completando 20 anos de transplante. Como essa experiência mudou sua vida?
Jorge Cristovão - Mudou muito. Depois da recuperação, passei a valorizar minha vida de forma diferente e atualmente levo uma rotina saudável, nadando cerca de 1.500 metros quase todos os dias na Praia da Costa.
- E como foi lidar com a espera de quatro anos na fila do transplante?
Foi angustiante, especialmente com dois filhos pequenos para criar. Mas sempre mantive pensamento positivo e esperança de que tudo daria certo.
- A necessidade do seu transplante foi consequência do consumo de álcool?
Sim, tive cirrose alcoólica. Sou um alcoólatra em recuperação e já estou há 27 anos sem beber.
- Que mensagem você deixa para as famílias sobre a doação de órgãos?
É uma oportunidade de salvar uma vida. Para o doador, é o maior ato de amor perante os olhos de Deus; para o receptor, é a chance de viver novamente com qualidade.
O QUE DIZEM ESPECIALISTAS
Desafio

“A elevada taxa de recusa familiar, que se mantém em torno de 50% no Estado, é o principal desafio. Outro ponto a ser aprimorado é a ampliação da oferta de transplantes, como os de pulmão, pâncreas e intestino.
Acredito que campanhas de conscientização e educação da população, desde o ensino fundamental e médio e outras áreas da sociedade, são essenciais para disseminar a importância da doação e os detalhes do processo de transplante. Somente através dessa mudança será possível aumentar o número de doadores.”
Nova chance

“A dor da perda é muito triste, é inesperado, e lidar com isso não é fácil. Mas a doação de órgãos possibilita transformar parte do sentimento de perda em algo transcendente. A morte encefálica é irreversível, mas doar os órgãos de quem faleceu é dar a muitas pessoas novas chances.
É dar a possibilidade de um pai ver um filho se formar, de uma esposa virar avó, de uma criança virar um adulto de valor, de uma pessoa qualquer continuar. Doação de órgãos é continuação da vida em outra vida! É consolo, é afago e é extraordinário!”
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