Natal brasileiro
Artigo publicado na coluna Tribuna Livre, do Jornal A Tribuna
Leitores do Jornal A Tribuna
As coisas da vida passam – e passam muito depressa. Teria sido ontem que, peito inflado de entusiasmo, contemplava a aurora de um novo milênio? Não. Mais de duas décadas se passaram. Naqueles dias, li um fascinante estudo concebido pelo Conselho de Inteligência dos Estados Unidos, buscando prever a realidade de hoje – ou seja, a de algumas décadas à frente.
Sobre o nosso País, os pesquisadores norte-americanos indicaram que a partir de 2020 seria um dos maiores exportadores mundiais de alimentos e de petróleo – cenário que hoje torna-se real diante dos nossos olhos.
Anotaram, então, e com imensa lógica, que toda a riqueza daí advinda poderia ensejar um ciclo de desenvolvimento sustentável e de longo prazo que nos levaria, em pouco mais de uma década, aos portais do tão sonhado “Primeiro Mundo”.
A expressão “poderia” não veio por acaso. E assim porque havia um “dever de casa” a ser feito, qual o de reduzir-se o nível de corrupção e os índices de criminalidade. Caso negligenciada tal tarefa, haveria desperdício de riquezas tal que seguiríamos rumo a uma realidade de desigualdade e conflitos, deitando fora uma oportunidade ímpar.
A opinião dos autores do estudo foi no sentido de que não conseguiríamos.
Vou à janela. Contemplo o nosso Brasil tão desigual e dividido, tão violento e cruel, para, com infinita tristeza, reconhecer que realmente não conseguimos. Que minha geração fracassou. Que eu fracassei. Lanço um olhar ao passado. O que aconteceu ao longo das últimas duas décadas?
Inicio pelo tão celebrado agronegócio. Ao longo de 20 anos foi sendo paulatinamente transferido para grupos estrangeiros – um processo que segue a passos largos. Sim, países outros acreditaram nas previsões de que seríamos um dos celeiros do mundo e se anteciparam. Assim com o nosso petróleo, que passou e passa ainda pelo mesmo processo.
Paralelamente, no mais das vezes sob o nome de “reformas”, vimos ser desmontada ou inviabilizada vasta parcela do serviço público – principalmente aquela encarregada de reprimir as tais “criminalidade” e “corrupção”.
Eis como chegamos aos dias de hoje: com o melhor de nossa economia internacionalizada e padecendo sob vergonhosos índices de criminalidade e corrupção. Perdemos, inequivocamente, um dos mais promissores “bondes da história” que por cá arribaram.
De tudo isto resta-nos, ainda, a divisão: você tem opinião sobre alguma coisa? Então considere-se fascista ou comunista – não há terceira possibilidade. Insistimos na generalização e no radicalismo, passando o tempo a derrubar pontes e a construir muros.
Quem ganha com isso? A partir de um ponto de vista mais alto, superior à política, pergunte-se: quem, afinal, cavou o estranho fosso que nos separa? E quem verdadeiramente dele se beneficia?
Que neste Natal, com o coração desarmado, ao som dos que gemem sobre solo tão rico e à vista das riquezas que nos abandonam, compreendendo que somente nossa união nos salvará, possamos olhar para o lado e dizer que, afinal, somos todos brasileiros!
PEDRO VALLS FEU ROSA é desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo
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