A saúde mental do profissional de segurança pública
As impressões deixadas no subterrâneo desses profissionais é o que mais importa: a quantas andam suas saúdes mentais?
Leitores do Jornal A Tribuna
“Companheiro, vamos prosseguir para o endereço (...) a fim de atender uma ocorrência de vias de fato em família"! No local, os policiais militares se deparam com uma cena chocante: além dos empurrões e xingamentos, o casal morava num cômodo com crianças pequenas, cheiro forte de cachaça e comida em decomposição, um casal de idosos e tudo em desordem.
Cenas como essa ou piores se repetem variavelmente. As ações policiais militares não estão simplificadas a prisões e apreensões. Transcendem em muito essa visão midiática do senso comum.
As impressões deixadas no subterrâneo desses profissionais é o que mais importa: a quantas andam suas saúdes mentais?
Em meio a esse contexto, percebe-se muito há fazer. Não somente o tratamento psiquiátrico e psicológico pós-impactos decorridos, mas a prevenção e o acompanhamento desses ‘pilares ocultos’.
Esse termo se justifica em razão das constantes presenças nas situações críticas que se pode imaginar. As sombras imersas da sociedade adoecida chegam ao “190” e são exatamente esses profissionais que no exato local estarão, fazendo sol ou chuva nos 365 dias do ano. Quando a família, pilar principal, está desmoronada, geralmente é a PM que é acionada para realizar os atendimentos emergenciais de plurais circunstâncias conflituosas.
Jacqueline Muniz, em sua obra “Ser policial é, sobretudo, uma razão de ser” aponta que os “mundos que os PMs visitam e que constituem o seu próprio mundo policial são difíceis de descrever, são duros de explicar e, em boa medida, são desagradáveis de assistir e de frequentar por muito tempo. É preciso “ter estômago” para socorrer um homem anônimo caído na calçada sufocando-se em seu próprio vômito. É preciso segurar a sensação de náusea diante de cenas nas quais se encontram indivíduos mutilados, corpos baleados e cadáveres em decomposição”.
Segundo a Organização Pan-americana da Saúde, “Nenhuma das metas de liderança e governança eficazes para a saúde mental, prestação de serviços de saúde mental em ambientes comunitários, promoção e prevenção da saúde mental e fortalecimento dos sistemas de informação esteve perto de ser alcançada. Em 2020, apenas 51% dos 194 Estados Membros da OMS relataram que sua política ou plano de saúde mental estava em consonância com os instrumentos internacionais e regionais de direitos humanos, muito aquém da meta de 80%”.
No Estado percebem-se relevantes iniciativas como a Comissão Permanente de Atenção à Saúde dos Profissionais de Segurança Pública, Defesa Social (Copas) e Justiça e o PL 852/2021 que tramita na Ales referente à política de saúde mental dos profissionais de segurança pública.
Cuidar das mentes dos profissionais de segurança significa cuidar dos guetos adoecidos da sociedade. Se esses pilares não estão bem, como levar equilíbrio para ambientes inexoravelmente efervescentes? É efeito em cascata: humanos cuidando de humanos. Afinal, este é o nosso fim.
SANDRO ROBERTO CAMPOS é tenente-coronel da PM/ES e especialista em segurança pública.
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