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TRIBUNA LIVRE

Dona Astrogilda, cabocla antiga, mandou chamar

Cíntia Braga | 18/03/2022, 10:50 h | Atualizado em 18/03/2022, 10:52
Tribuna Livre

Leitores do Jornal A Tribuna


Há pouco mais de uma década, a cantora Monique Rocha passava pela Vila do Riacho, município de Aracruz, e resolveu apresentar seu samba à Rainha do Congo Capixaba. Dona Astrogilda abriu as portas de seu Terreiro de Umbanda, onde atuava como liderança religiosa, reuniu a tradicional banda de congo “São Benedito do Rosário”, fundada em 1798, e ali mesmo, cercadas de totens, santos, imagens, oferendas, estandartes, casacas e atabaques, o encontro das duas gerações de mulheres se transforma numa hierofania, ou seja, numa experiência em que se manifesta o sagrado.

A sambista vagava e parava para descansar, sem saber aonde ir, até escutar o chamado da cabocla antiga. Numa alusão ao profano, quem estava perdida, vai ao encontro da tradição, sofre uma conversão espiritual, e é agraciada com a reza bendita. Reza e tradições marcadas pelo Sincretismo Religioso, tão característico de nossa Cultura Popular. Legítima expoente dessa cultura, Dona Astrogilda frequentava o Terreiro e a Igreja. Cultuava ídolos na Umbanda e louvava a Jesus na missa. Em ambos era figura cativante e atuante. No chão batido fazia sua oferenda à Iemanjá, despachando para Iansã e Ogum guardarem. Na ornada Igreja Católica de 1925, participava ativamente das festividades, orquestrando a banda de congo nos rituais de adoração à Cruz.

Dona Astrogilda manda chamar àqueles que creem na força da oração de São Benedito, bem como de todas as entidades e Orixás protetores dos desvalidos, aflitos e marginalizados.  Monique representa os súditos abençoados e acolhidos sob o manto sagrado da Rainha, guardiã das divindades que habitam seu altar. Uma proteção que precisa vir dos céus, já que no mundo o que sobra é lamento e abandono. O povo preto escuta a Santa chamar e parte em procissão, embalados pela oralidade dos Griôs e pela cadência da percussão redentora. A sambista revela a cultura afrodescendente em sua dimensão sagrada, homenageando um dos maiores ícones regionais do Espírito Santo.

O tempo passou e a composição de Monique Rocha serviu de suporte de memória do mágico encontro com Dona Astrogilda. Já o videoclipe projeta a experiência religiosa, responsável por manter viva, uma história de amor e devoção.  Segundo o historiador Mircea Eliade, nas sociedades tradicionais, as funções vitais são tratadas de forma sagrada, sendo assim, para aqueles que têm uma experiência religiosa, toda a natureza é suscetível de revelar-se como sacralidade cósmica.

Dessa Hierofania, Monique Rocha sai revitalizada e os caboclos da Vila lhe indagam: “Que luz é essa a te alumiar?” Quiçá, o sagrado, materializado na cultura popular: suas vestimentas, sua cantiga folclórica, seus instrumentos musicais, sua conexão com os mitos fundadores e seu respeito à ancestralidade. Essa luz reflete uma ontologia arcaica, um modo de ser que preserva o canto da tradição, que é também um canto de resistência e de libertação.

Cíntia Braga é doutora em História, mestre em Memória Social.


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