Veto a oferta de empréstimo por telefone a aposentados
Ao receber diversas ligações telefônicas, o aposentado Francisco Pimenta, de 67 anos, aceitou fazer a portabilidade de um empréstimo que tinha na Caixa Econômica para outro banco. Só que ele afirma que não foi informado que, além dos 20% de desconto oferecidos, as parcelas ampliariam o tempo de quitação.
Para evitar casos como esse, foi aprovado o Projeto de Lei (PL) 1.805/2021 no Congresso, que veta a oferta de empréstimo por telefone e prevê regras para ajudar superendividados a pagar seus débitos.
No caso do aposentado Francisco Pimenta, ele fez a portabilidade de um empréstimo de R$ 10 mil em 2019.
“Eles prometeram reduzir as parcelas em 20% e, como era vantajoso, eu aceitei. Mas não informaram que o período de pagamento seria ampliado de 40 para 80 meses”, reclamou.
A negociação foi toda por telefone, e diversos pontos do contrato foram fechados sem o conhecimento e a autorização de Francisco. Hoje, o aposentado enfrenta uma ação judicial para interromper as cobranças.
Com a nova legislação, o advogado Guilherme Machado, especialista em Direito Previdenciário, prevê que os golpes envolvendo empréstimos consignados a aposentados sejam reduzidos em 90%.
“Se a lei for sancionada, uma simples autorização por telefone não vai mais servir para fechar o empréstimo consignado”.
Se as ligações das instituições financeiras oferecendo o crédito persistirem depois que a lei for aprovada, os aposentados e pensionistas poderão registrar boletim de ocorrência.
“Essas medidas protegerão principalmente os mais vulneráveis, como idosos e analfabetos. Se o texto for sancionado, também será proibido fazer propaganda ou oferta de crédito ao consumidor com expressões enganosas, como ‘sem juros’, ‘gratuito’, ‘sem acréscimo’ e ‘taxa zero’”, acrescentou Rayane Vaz Rangel, advogada do consumidor.
O texto busca ainda reforçar as medidas de informação e prevenção do superendividamento, introduz a cultura da concessão responsável de crédito, estímulo à renegociação e da organização de planos de pagamento pelos consumidores. O projeto segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro.
Novas regras para facilitar negociação de dívidas
O projeto aprovado prevê ainda a possibilidade de negociar com vários credores ao mesmo tempo, com a garantia legal de que não mais do que 30% dos rendimentos do consumidor serão destinados ao pagamento das dívidas.
“O próprio consumidor poderá procurar o Procon e chamar todos os credores para negociar as dívidas simultaneamente, o que hoje ainda não é possível”, explicou a advogada Marta Vimercati, especialista em Direito do Consumidor.
O pagamento poderá ser feito em um prazo mais extenso, com juros menores e prazo maior pra pagar. Além disso, as parcelas serão menores, para garantir que, no máximo, 30% dos rendimentos do consumidor sejam direcionados ao pagamento das dívidas.
“Vemos muitas pessoas que recebem salário mínimo, e têm dívidas de 10 ou até 20 vezes esse valor. Dessa forma, o consumidor não terá que se sacrificar, não terá que abandonar gastos básicos, como alimentação, para pagar as dívidas”, ressaltou Marta.
A solução administrativa, com a ajuda do Procon, é mais simples, mas se algum ou nenhum dos credores aceitar a negociação, o devedor pode entrar com ação na Justiça.
“Sancionada a lei, o consumidor pode apresentar em audiência judicial um plano de pagamento com prazo máximo de cinco anos”, completou a advogada do consumidor Rayane Vaz Rangel.
ALGUMAS MUDANÇAS
O projeto
- O Senado aprovou esta semana o Projeto de Lei (PL) 1.805/2021, que cria regras para prevenir o superendividamento dos consumidores, proíbe práticas consideradas enganosas e prevê audiências de negociação de dívidas.
- Foram 73 votos a favor e nenhum contra.
- A matéria vai agora à sanção presidencial.
Principais mudanças
- O projeto traz mudanças no texto do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
- Segundo o texto aprovado, será proibido fazer oferta de crédito ao consumidor, seja em propagandas ou não, com expressões enganosas, como “sem juros”, “gratuito”, “sem acréscimo”, “taxa zero” ou expressões semelhantes.
- Também será proibido dizer que a operação poderá ser concluída sem consulta a serviços de proteção ao crédito ou sem avaliação da situação financeira do interessado.
- se a oferta envolver prêmios, será proibido assediar ou pressionar o consumidor para contratar crédito ou comprar produto ou serviço.
- Além disso, as empresas não poderão condicionar o início de negociações sobre dívidas à desistência de ações judiciais, pagamento de honorários advocatícios ou a depósitos judiciais.
- os bancos ficam proibidos de realizar ofertas de empréstimos, financiamentos e seguros por telefone. Haverá ainda ações de fiscalização, e as instituições financeiras que tiverem contratos nesses moldes serão punidas.
- Tanto os bancos e financiadoras quanto aqueles que venderem a prazo deverão informar o consumidor previamente e de forma adequada qual é o custo efetivo total, a taxa mensal efetiva de juros e os encargos por atraso, o total de prestações e o direito do consumidor de antecipar o pagamento da dívida ou parcelamento sem novos encargos.
- As ofertas de empréstimo ou de venda a prazo deverão informar ainda a soma total a pagar, com e sem financiamento.
- Conforme a gravidade da conduta de não fornecer as informações de forma clara ao consumidor, o texto prevê, judicialmente, a redução de juros e o aumento do prazo de pagamento, levando-se em conta a capacidade de pagamento do consumidor, sem prejuízo de ações por danos morais.
Renegociação de dívidas
- Antes de ir à Justiça pedindo um plano de pagamento por acordo com os credores, o consumidor terá acesso a uma fase de conciliação com os órgãos de defesa do consumidor, como os Procons.
- esse tipo de atendimento especial não será de obrigação desses órgãos.
- as conversas terão de ser com todos os credores e deve ser preservado o “mínimo existencial” do salário do devedor. O consumidor poderá comprometer até 30% de sua renda mensal para o pagamento das dívidas, para não deixar de contribuir com as despesas básicas.
- o consumidor também deve se comprometer a não fazer novas dívidas e adotar medidas para evitar o agravamento de sua situação.
Justiça
- Se o acordo com o Procon ou órgão competente não der certo, o consumidor pode entrar na Justiça.
- A pedido do consumidor superendividado, o juiz poderá começar processo de repactuação das dívidas com a presença de todos os credores.
- Na audiência, o consumidor poderá apresentar plano de pagamento com prazo máximo de cinco anos para quitação, preservadas as garantias originais.
- Se sair acordo com algum credor, o juiz validará o acertado. Deverão constar no plano: aumento do prazo de pagamento e redução de encargos; suspensão de ações judiciais e data de retirada do nome do cadastro negativo
Fonte: Senado e advogados Guilherme Machado, Marta Vimercati e Rayane Rangel
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