Mulheres ameaçadas de morte por cobrar dívidas de pensão do ex no ES
Segundo especialistas, após serem coagidas, muitas mulheres acabam fazendo acordos abrindo mão de direitos garantidos
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A pensão alimentícia é um direito dos filhos menores de 18 anos, ou daqueles que após essa idade ainda dependam financeiramente dos pais. Têm direito, ainda, mulheres que, após o fim do relacionamento, não tenham como se sustentar.
Porém, o que ocorre é que, muitas vezes, mulheres são ameaçadas de morte por cobrar na Justiça algo que é direito delas ou dos seus filhos.
O advogado de Família Jean Márcio Dias conta que atendeu este ano a um caso em que o ex-marido tinha uma condição financeira muito superior à da ex-mulher.
“Ele se recusa a pagar a pensão do filho com desconto em folha e alega que só faz o pagamento mediante a apresentação de nota fiscal”, explica Jean.
O advogado contou ainda que a mãe entrou com ação pedindo a pensão para o filho. “Ela foi ameaçada de morte pelo ex, mas seguiu com o processo”.
Segundo o advogado, as ameaças começam do momento em que se inicia o processo até as audiências na Justiça. “Na frente do juiz, ou da juíza, o autor da ameaça já diz que 'não quis dizer aquilo'”.
Flávia Brandão, advogada especialista em Direito de Família e Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) afirma que não são poucas as mulheres que, diante das ameaças e humilhações, acabam por aceitar propostas que diminuem ou retiram completamente os seus direitos, por medo real de algo acontecer contra suas vidas.
A advogada Ana Paula Morbeck, vice-presidente da Comissão de Direito de Família e Sucessões da Ordem dos Advogados Seccional Espírito Santo (OAB-ES), diz que há casos de ameaças para que as mulheres façam o acordo de pensão do jeito que os ex-companheiros desejam.
“E há pais que presenteiam filhos com iPhone e viagens, mas não cumprem obrigações de provê-los no seu dia a dia”, afirma.
Segundo a advogada da Família Kamilla Dias, normalmente, as vítimas de violência patrimonial são dependentes financeiras de seus parceiros, têm baixa autoestima e muitos impactos negativos na saúde mental.
“Por exemplo, quebra de cartão de crédito, mudanças de senhas para que a vítima não tenha acesso as finanças e a ocultação de patrimônio, são alguns dos exemplos dessa forma da violência, prevista no artigo 7º da Lei Maria da Penha”, explica Kamilla Dias.
Mais de 12 mil atendimentos na Defensoria Pública
Somente neste ano foram 12.602 atendimentos a pessoas em busca de resolver a situação relacionada à pensão alimentícia, de acordo com a Defensoria Pública do Espírito Santo. Em todo o ano passado, foram 17.903 atendimentos.
Segundo a advogada de Família Kamilla Dias, em processos para definir o valor de pensão alimentícia é comum que o homem queira indicar como vai pagar.
“Geralmente, não querem desconto em folha, querem pagar o plano de saúde, que já vem descontado no salário e a escola”, afirma Kamilla Dias.
O advogado de Família Jean Márcio Dias destaca que, quando as mulheres procuram a Justiça para pedir pensão alimentícia, tudo o que mais querem é paz.
“Quando o homem ameaça aquela mulher, muitas vezes, ela acaba cedendo ao acordo que ele pretende para ter paz. Não é o correto. Mas é a forma que ela encontra”, explica o advogado.
Ele orienta que a mulher entre com representação criminal contra o autor da ameaça nos termos da Lei Maria da Penha, para que seja punido com maior rigor.
Prestar contas é indevido
A desconfiança sobre como a pensão alimentícia está sendo utilizada é um dos questionamentos que vai parar na Justiça. Mas prestar contas não pode ser condição obrigatória para os pagamentos.
“Errado é condicionar a pensão alimentícia a prestação de contas, como se o recurso não fosse utilizado para os cuidados com o filho”, afirma a advogada Ana Paula Morbeck, vice-presidente da Comissão de Direito de Família e Sucessões da OAB-ES.
A especialista destaca que há casos que os pais saem do emprego para não terem a pensão descontada em folha de pagamento, constituem empresas em nome de terceiros para não realizar o pagamento dos valores devidos.
“Fica a busca da mãe para mostrar e provar na Justiça que o pai tem a possibilidade de fazer aquele pagamento”, afirma.
Ana Paula explica que a dependência econômica dos filhos em relação aos pais já é presumida. Mas que, ao completar 18 anos, é preciso fazer outra ação judicial.
“A pensão não cessa por si quando o filho completa 18 anos. É preciso fazer uma ação de exoneração de pensão alimentícia, caso não haja uma boa relação entre pai e filhos. Se a convivência for boa, eles podem entrar em um acordo”, explicou a advogada.
CASOS
Mudança de estado após ameaça
Após todas as ameaças emocionais antes do processo e depois de a Justiça decidir em favor da ex-esposa e dos filhos, uma mulher recebeu, por aplicativo de mensagem, ameaça de morte, caso não retirasse o processo.
“Com a ameaça, ela buscou a Vara de Violência Doméstica e Familiar, obteve medida protetiva extensiva para os filhos”, disse a advogada Flávia Brandão.
Ela acabou mudando de estado e o homem sumiu e não pagou mais pensão. Com a mudança de endereço tudo passou a ser processado no outro estado.
Problemas psicológicos
Uma dona de casa de Vila Velha desenvolveu problemas psicológicos após seu ex-marido, um estivador, com quem foi casada por 17 anos, passar a rondar a casa dos pais dela, onde ela foi morar com os filhos depois da separação.
“Ela não trabalhava fora de casa, pois se dedicou quase 20 anos ao casamento e à criação dos filhos. Foi o ex quem pediu o divórcio, e de forma litigiosa”, contou a advogada de Família Kamilla Dias.
De acordo com a advogada, o ex marido queria somente pagar a escola e o plano de saúde dos filhos. “Ele ameaçou deixá-la sem nada, tirou as senhas e o cartão do banco, fazia ameaças e ficava rondando a casa dos pais dela, onde ela morava com os filhos”, disse.
Além da ação de alimentos, a advogada ingressou com uma ação criminal contra o ex de sua cliente.
“O juiz concedeu medida protetiva, determinando que ele se mantenha a 500 metros dela e não frequente os mesmos ambientes e proibiu qualquer contato”.
Para a mulher, foi sentenciada uma pensão de dois salários mínimos por um ano e meio e de 30% do salário do ex para os filhos, por prazo indeterminado.
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