Silvio Costa Filho anuncia visita de Lula em meio a pressão contra Danilo Cabral
Ministro revela agenda de outubro para licitar lotes 4 e 7 da Transnordestina enquanto bastidores articulam saída do superintendente da Sudene
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Em outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desembarca em Pernambuco para assinar, oficialmente, a ordem de serviço para contratação das obras da Ferrovia Transnordestina em dois trechos. Paralisados desde 2016, os lotes 4 (Custódia–Arcoverde) e 7 (Cachoeirinha–Belém de Maria) serão licitados com investimentos de quase R$ 1 bilhão, assegurados pelo novo PAC federal.
A vinda de Lula foi anunciada pelo ministro Silvio Costa Filho, de Portos e Aeroportos, um dos ministros mais próximos do presidente, filho do ex-deputado Silvio Costa.
O anúncio veio seguido, curiosamente, com a disputa de bastidores orquestrada por lideranças do Ceará para tirar o superintendente da Sudene, Danilo Cabral, do cargo. A articulação vem sendo feita junto ao ministro mais poderoso do governo - Rui Costa - sob a alegação de que Danilo estaria travando os investimentos no estado cearense, o que não procede.
O próprio Lula esteve no Ceará no dia 18 de Julho para garantir investimentos na ferrovia, reafirmando a promessa de que ela vai sair do jeito que foi prometida.
“Eu assumi a responsabilidade de que nós vamos concluir essa ferrovia, custe o que custar. E vamos fazer ela igualzinho ao projeto. O Nordeste precisa dessa obra, o Nordeste deve ser respeitado, porque o Nordeste tem inteligência, conhecimento”, disse Lula.
Sem fantasmas arrastando correntes

A verdade é que a Sudene, cuja sede funcionava num antigo prédio na Cidade Universitária, era uma dor de cabeça para os governos federais - um elefante branco. Ninguém queria.
Em 2017, a sede do órgão foi transferida para a Avenida Domingos Ferreira, no bairro de Boa Viagem, longe dos fantasmas que arrastavam correntes dentro daquele imóvel. Mas nenhum superintendente conseguiu dar esse protagonismo à Sudene como Danilo. Claro, nada teria sido possível sem a liberação de recursos e sem a visão do governo Lula para o desenvolvimento do Nordeste. Mas poderia estar travada até hoje se tivesse caído em mãos erradas.
Por isso, toda a estranheza com essa pressão pela exoneração de Danilo quando a Sudene fica azeitada e ganha visibilidade. O que ninguém conseguiu antes, nem mesmo o ex-prefeito do Recife João Paulo, que já comandou o órgão, sem conseguir dar a visibilidade merecida.
Quando Silvio Costa Filho anuncia a vinda de Lula para os próximos três meses (muita antecedência para uma agenda presidencial) já dá a entender que o próprio presidente Lula deu um “se liga” para os pernambucanos se movimentarem. Lula tem o perfil de deixar os interessados entrarem numa queda de braço até um deles vencer.
A disputa pelo legado
O embate em torno do comando da Sudene ganha contornos de legado político: trata-se de quem dará um passo decisivo, ainda no mandato de Lula, a uma das maiores obras federais em execução no Nordeste. A maior depois da transposição do São Francisco.
A ferrovia Transnordestina não é apenas um projeto de infraestrutura; “é a obra mais importante do Nordeste para melhorar a logística e a geração de novos negócios e oportunidade de geração de emprego e renda”, como vinha dizendo Danilo.
É um símbolo da gestão Lula na região e, por isso, a escolha de seu gestor — responsável pela liberação de recursos, acompanhamento das licitações e coordenação operacional — define quem ficará encarregado de garantir que os trilhos cheguem a Salgueiro e Suape dentro do cronograma previsto até 2029.
Articulação institucional – Sudene em foco
A reintrodução de Pernambuco no projeto envolve articulação conjunta dos ministérios dos Transportes, da Integração e da Sudene. Sob a gestão do superintendente Danilo Cabral, foram mobilizados R$ 800 milhões em 2023 e R$ 1 bilhão adicionais em 2025, provenientes de recursos do FDNE e do Finor, para atualizar projetos executivos e licitar os dois lotes prioritários.
Audiências públicas já ocorreram em Salgueiro, com novos encontros previstos até novembro, reforçando o modelo de governança participativa que reúne setor produtivo, academia e movimentos sociais.
Rumores de substituição e disputa regional
Nos bastidores, circulam rumores de que o governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), teria acionado interlocução junto à Casa Civil para pleitear a saída de Cabral da Sudene, em um movimento que visaria favorecer o interesse do Estado vizinho no traçado ferroviário. Já estaria tudo certo, até a reação de setores importantes da economia e da política pernambucana.
A tensão, portanto, reflete uma disputa entre Pernambuco e Ceará pelo roteiro da ferrovia, com implicações diretas sobre os investimentos e o futuro logístico do Nordeste.
Manifesto das entidades pernambucanas

Em reação a essa tentativa de intervenção, cinco entidades com forte presença em Pernambuco – Federação das Indústrias (Fiepe), Centro das Indústrias (Ciepe), Atitude PE, LIDE PE e CREA-PE – divulgaram nota conjunta em defesa de Cabral, qualificando-o como parceiro estratégico do setor produtivo e destacando a importância de sua continuidade na Sudene para garantir a execução dos projetos estruturantes do Estado.
Resistência
Ao convocar o setor produtivo para a defesa de Cabral, as lideranças locais impulsionam um movimento defensivo, ainda que proclamado como demonstração de união política. Na prática, o manifesto sinaliza mais resistência às manobras cearenses do que um real alinhamento regional prévio, evidenciando que a coesão em torno da ferrovia depende antes da consolidação de consensos do que de declarações públicas.
Impactos econômicos e logísticos
Com a ordem de serviço prevista para outubro, a previsão é de licitar as obras no início de 2026, reduzindo custos de transporte ao substituir até 380 caminhões por cada trem em operação. Hubs logísticos devem se formar em Salgueiro e Altinho, conectando o Polo de Fruticultura do São Francisco à malha nacional e potencializando o escoamento de frutas exportadas.
Desafios à continuidade das obras
Apesar do impulso federal, a eficácia da retomada dependerá tanto da estabilidade política na Sudene quanto da solução da disputa entre estados. Todo mundo sabe do prejuízo de exonerações em momento não oportuno.
Qualquer substituição abrupta pode atrasar licitações, comprometer a liberação de recursos adicionais e fragilizar a governança local, em um momento em que o projeto precisa de articulação coesa para avançar dentro dos prazos estipulados.
Perspectivas de transporte de passageiros
Além do transporte de cargas, a Sudene e a Infra S.A. avaliam a reativação de trechos de passageiros em Pernambuco, como a ligação Recife–Caruaru, o que ampliaria o impacto socioeconômico da Transnordestina e atenderia demandas de mobilidade regional. Esses estudos ainda dependem da conclusão do contrato de concessão dos lotes e da estabilidade dos marcos regulatórios ferroviários.
Conclusão: articulação política e execução

O horizonte da Transnordestina em Pernambuco combina recursos federais garantidos, protagonismo da Sudene e mobilização do setor produtivo local.
Contudo, a materialização desse impulso passa pela articulação política capaz de neutralizar disputas regionais e assegurar a permanência de lideranças comprometidas com o projeto.
Após a licitação, as obras estão previstas para iniciarem em 2026 e serem concluídas em 2029.
A visita de Lula, além de simbolizar o ajuste político, precisa ser acompanhada por resultados concretos no cronograma de obras para que a ferrovia deixe de ser uma promessa e se converta em vetor de desenvolvimento para o Nordeste.
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