Pelada histórica: torcida do Santa Cruz celebra 110 anos com futebol e tradição
Evento está marcado para a data de aniversário do clube, no Pátio do Santa Cruz
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Os tricolores santacruzenses do Arruda têm um encontro marcado neste próximo sábado (3). Para comemorar os 110 anos do Clube, criado em 3 de fevereiro de 1914, os torcedores se preparam para uma tradicional pelada.
O evento, com bola rolando no meio da rua e barrinhas, visa lembrar as origens do Santa Cruz, que nasceu a partir de um grupo de jovens que se reuniam e jogavam em frente ao Pátio do Santa Cruz, no Centro do Recife.
Haverá pelada para todos os gêneros e crianças. A partida de futebol informal começa às 15h, após a realização de uma missa programada para às 14h, na Igreja do Santa Cruz, celebrada pelo Frei Aureliano, que é torcedor da Cobra Coral.
A pelada acontece há dez anos, desde o centenário do Clube. O encontro anual é uma mistura de fé, alegria e povo, características que marcam o Santinha, como é chamado carinhosamente pelos torcedores.
A pelada é um momento de confraternização, inclusão e fidelidade. Homens e mulheres que quiserem jogar só precisam chegar ao local a partir das 15h para se inscrever.
Não há mais nenhum critério, segundo um dos organizadores, o produtor cultural Lucas Pinto, 31 anos. Haverá um espaço especial para as crianças, tudo bem espremidinho naquele pátio histórico. Vale lembrar, contudo, ser importante estar bem de saúde, para ninguém cair duro no meio do jogo.
O extracampo
Prestes a completar 110 anos, o Santa Cruz tem marcos extracampo importantes. Foi o primeiro time de Pernambuco a dizer não ao racismo. O clube também foi o primeiro do Brasil a contratar uma mulher psicóloga para atuar na área de futebol masculino profissional, Santana Moura.
Foi construído, tijolo a tijolo, pelas mãos da torcida. Seja pelos trabalhadores, seja pelos contribuintes.
Diferentemente de outros times, o pilar do Santa Cruz não tem sido o futebol. A base do clube se tornou a própria torcida e suas demonstrações de resiliência, após duas quedas que deixaram o clube sem série.
Enquanto o futebol não mostra os resultados desejados, é no extracampo que outros jogos acontecem. Os tricolores de Pernambuco se reinventam como nação. Buzinam nas ruas sem se conhecer, se abraçam sem nunca terem se visto. Encontram-se para se verem refletidos no outro e dizer: 'você não está sozinho'.
Encontram-se para "tesourar" no Arruda, para ver o gramado crescer, para ver os refletores e chamá-los de sol, para ajudar na limpeza do Arruda e desenterrar sapos, para viajar a outros estados em meio a trovões e alagamentos.
A pelada realizada há 10 anos, afinal, é um novo marco de pertencimento. O Santa Cruz está fora de série e de campeonatos nacionais, disputando apenas o Campeonato Pernambucano de 2024. A pelada, portanto, é mais do que um racha e barrinhas no meio da rua.
““A pelada é um ponto de resistência e de ligação da torcida, com o fator fundamental do clube, que é aberto, popular, com ligação direta com a rua e com as pessoas”, disse Lucas. Lucas Pinto, Produtor Cultural
O torcedor coral continuou. “A gente criou essa pelada para celebrar o aniversário do Santa rememorando a atividade que fez o clube ser idealizado, uma pelada que os jovens organizavam em frente à igreja. A iniciativa criou um clube aberto e amplo, um clube do povo”, disse Lucas Pinto.
O palco
O produtor cultural contou que os jogos serão realizados na improvisação, porque tem um palco perto da Igreja do Santa Cruz, um time que tem uma igreja para chamar de sua, um templo religioso que distribui, todos os dias, comida para as pessoas mais vulneráveis do centro do Recife.
O palco no meio da pelada, aliás, parece que veio a calhar, na opinião de Lucas. Ele disse que os organizadores estão se movimentando para ter autorização e usar o espaço para algumas apresentações culturais. Eles dependem, no entanto, de um empurrãozinho do poder público, mas estão na luta.
“Todo ano a gente se abraça. Sempre chega muita gente da comunidade local, a torcida sempre está presente e a pessoa vai na secura”, declarou. Secura, aliás, é uma palavra conhecida pelos torcedores corais, mas eles parecem ter lágrimas para regá-la, para continuar e receber, sempre, novos torcedores.
Já dizia o poeta e filósofo norte-americano Henry David Thoreau (1817-1862). “Não há remédio para o amor, a não ser amar mais”. Os santacruzenses entendem bem esta frase.
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