Jango Barros: o amor como bandeira carregado pelo menino do Arruda

O Recife dos anos 1970 guardava seus próprios segredos nas calçadas do Arruda, bairro da Zona Norte do Recife. Foi ali que um garoto de 13, 14 anos se esgueirava pelos muros baixos para espiar um espetáculo proibido para a sua idade.
“Eu ficava lá de fora, botava um tijolo para ver a Elza Show cantar com a voz dela”, lembra Jango Barros. Elza, transformista negra que atravessou décadas de resistência cultural, montava-se com vestidos, perucas e improvisos criativos. Para o adolescente, aqueles números eram mais que shows: eram revelações. “Elza Show me fez inspirar, amar os artistas que eu mais amo hoje.”
A história de Jango Barros, 57 anos, produtor da 3ª Edição da Parada LGBTQIA+ no Bairro da Boa Vista, é o tema da coluna Pernambuco que encanta desta terça-feira (2).
A herança de Elza Show

brilho de Elza Show não ficou restrito aos bares do Cantinho da Dalva de Oliveira, do Cacique, do Gesso, ou do antigo bar Skylab. Ecoou dentro de Jango, que anos depois criaria seus próprios espaços para artistas LGBT se apresentarem. “Hoje eu tenho um projeto que é a Noite das Estrelas, no Teatro do Parque, onde eu prestigio e homenageio muitos artistas. Elza foi minha inspiração, e até hoje ela é minha inspiração.”
Família e acolhimento
Jango nasceu em uma família numerosa do Recife, cujos pais são Jango Barros da Rocha e Marlene Ferreira de Souza. “Minha maior alegria da vida hoje é o dom da vida, o amor imenso que eu tenho por minha mãe e por essa minha família, que sempre me abraçou, sempre me apoiou, sempre estava ao meu lado.”
Foi nesse suporte afetivo que encontrou força para, na adolescência, reconhecer sua sexualidade e, mais tarde, assumir uma militância cultural em defesa da diversidade. Teve sete irmãos e dois partiram para Deus, segundo contou.
O produtor cultural

A trajetória que começou na calçada do Arruda se transformou em palco e produção. Nos últimos 30 anos, Jango construiu reputação como um dos principais organizadores de eventos ligados à cena LGBT em Pernambuco. Criou a Noite das Estrelas, que leva ao Teatro do Parque um elenco de transformistas, cantores e artistas da cidade, e fundou o Bar das Estrelas, na Rua Mamede Simões, onde apresentações acontecem literalmente na calçada, devolvendo vida ao Centro do Recife.
Entre a resistência e o preconceito
A visibilidade cobrada também cobra seu preço. “Preconceito a gente sempre tem. Recentemente enfrentei um que foi para a justiça. Já fui alvo de preconceito num hotel em Ponta de Galinhas. Mas é por isso que tem que existir essa força, essa união, dessa parada LGBT em todos os quatro cantos do Brasil e do mundo, para que a gente cada vez mais lute pelo nosso direito igual.”
A fé que resiste

Se a trajetória artística e militante coloca Jango no centro da cena LGBT, a fé o leva a outro espaço muitas vezes hostil: a Igreja Católica. Frequentador de missas, participante da comunhão, ele veste camisas com o nome de Jesus Cristo estampado no peito e um trancelim discreto com um crucifixo. Às vezes, parece até estar vestido como um padre.
“Deus está sempre em minha vida, é o ar que eu respiro, me dá inteligência e proteção divina. Ele está acima de qualquer coisa e de qualquer ação Jango Barros, Produtor da 3ª Parada LGBTQIA+
Para ele, não há contradição. “Tudo, você sabe, é feito com amor. Quando você ama de verdade, você gosta. O meu propósito em tudo isso é amor aos artistas, aos transformistas, a essa arte. E eu costumo dizer: essa luta de Jango Barros não é só minha. Essa luta é de todos nós.”
A voz que só vai longe com os outros

Jango não se coloca como protagonista isolado. “Eu costumo dizer a todo mundo que a minha voz não pode ir tão longe. Ela só pode ir tão longe se você compartilhar, comentar, chamar e divulgar. Essa luta não é só minha.” O convite é sempre coletivo, e o amor se transforma em chamado para a resistência.
Recife no mapa da diversidade
Se em São Paulo a Avenida Paulista se tornou símbolo, no Recife o bairro da Boa Vista, no Centro do Recife, guarda essa marca. Historicamente acolhedor da população LGBT, o bairro será novamente palco da Parada Boa Vista da Diversidade, no próximo 6 de setembro, a partir das 18h. Idealizada e organizada por Jango, a parada chega à sua terceira edição com shows de drags, transformistas, cantores e bandas.
Uma noite de festa e memória

No palco montado na Rua da União, nomes consagrados como Raquel Simpson, Christiane Falcão e João Victor serão homenageados. “Ser homenageada nesta parada da diversidade, para mim, é uma honra. Eu já sou idosa e envelhecer no palco é muito gratificante”, diz Raquel. Haverá espaço também para bandas, DJs e novíssimos talentos. Entre purpurina, música e discursos, o que se ergue é a reivindicação por igualdade.
A parada como política cultural
“Quero chamar a atenção da população para uma consciência mais tolerante sobre o direito de expressão de um segmento da sociedade há muito privado de exercê-lo de maneira mais visível e sem preconceitos de qualquer natureza”, resume Jango. A parada, para ele, é menos desfile e mais ato político-cultural, um gesto de ocupação do espaço urbano e de afirmação de uma comunidade.
O amor como método

Na fala de Jango, a palavra amor aparece repetidamente. É recurso retórico, mas também prática de vida. Ele insiste que não produz espetáculos apenas por produção, mas por afeto. “Você não consegue fazer um trabalho bonito, amar, sem fazer com amor. Tudo é feito com amor. Quando você ama de verdade, você gosta.”
Um guardião da memória LGBT
Ao falar dos artistas, Jango também evoca responsabilidade histórica. “Lembrando que são todos cidadãos, pagam seus impostos e têm seus direitos. A gente tem a lei de votar, de expressão, de falar e de fazer sua cultura da forma que você ama, dentro de você, de si próprio, das pessoas.” Seus eventos funcionam como guardiões de uma memória coletiva, garantindo que nomes como Elza Show não sejam esquecidos e que novas gerações encontrem palco.
Entre fé e diversidade

No Recife, onde o conservadorismo se fortalece, Jango Barros insiste em costurar duas identidades muitas vezes tratadas como opostas: a de homem gay e a de católico praticante. Essa convivência desconcerta, mas também ilumina um caminho. Ao lado da cruz e do terço, ergue a bandeira colorida. E o faz sempre com a mesma convicção: a de que amor é verbo coletivo, só existe quando partilhado.
CECON anuncia R$ 2 milhões em investimentos
O Pernambuco Centro de Convenções (CECON), em Olinda, anuncia investimento de R$ 2 milhões em retrofit, climatização e comunicação visual. A nova gestão, liderada por Antônio Peçanha, também iniciou conversações para transformar o antigo Parque Mirabilândia em uma área externa para megaeventos com capacidade de até 100 mil pessoas.
O objetivo é modernizar o espaço e consolidá-lo como polo estratégico de negócios, cultura e entretenimento no Nordeste, integrando-se a um setor que movimenta cerca de R$ 936 bilhões por ano no Brasil, equivalente a 13% do PIB nacional.
Novo livro celebra história de Olinda
O livro Olinda nos seus diversos momentos, do arquiteto e pesquisador José Luiz Mota Menezes (in memoriam), será lançado nesta sexta-feira (5), às 16h, no Instituto Histórico de Olinda (Av. Liberdade, 214, Carmo). O evento é aberto ao público e terá intérprete de Libras.
A obra retrata a arquitetura, a história e a arte de Olinda, destacando o conjunto arquitetônico tombado pelo Iphan e reconhecido pela Unesco como Patrimônio da Humanidade. Serão impressos mil exemplares, com 250 distribuídos gratuitamente em escolas e instituições para pessoas com deficiência visual. O livro também terá versão digital acessível e será vendido a R$ 40.
Recife recebe 500 computadores
O Recife recebeu 500 computadores recondicionados, entregues nesta segunda-feira (1º) pelo prefeito João Campos e pelo ministro das Comunicações, Frederico de Siqueira Filho, em cerimônia no Compaz Governador Eduardo Campos.
Os equipamentos serão destinados a escolas, laboratórios de informática e centros comunitários, fortalecendo a capacitação de jovens, trabalhadores e idosos em letramento digital.
A ação integra o programa Computadores para Inclusão, que também oferece cursos de informática básica e manutenção de computadores, promovendo qualificação profissional e inclusão tecnológica.
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