Vídeo mostra “Canibal de Garanhuns” convertido: “Vais trabalhar para Deus”
Gravado em presídio de Itamaracá, vídeo antigo mostra Jorge Beltrão ao lado de missionários dizendo ter encontrado redenção por meio da fé e da Bíblia
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Um vídeo que circula nas redes sociais desde o início desta semana voltou a chamar atenção para um dos crimes mais chocantes já registrados em Pernambuco: o caso dos "Canibais de Garanhuns".
Nas imagens, Jorge Beltrão Negromonte da Silveira, apontado como o líder do trio condenado por assassinato, ocultação de cadáver e canibalismo, aparece supostamente convertido ao evangelho e se apresentando como pastor.
A repercussão do vídeo reabriu discussões sobre a brutalidade do caso, que ganhou destaque nacional e internacional, e os limites entre doença mental, responsabilidade criminal e a possibilidade de reabilitação de autores de crimes hediondos.
Jorge Beltrão Negromonte sorria no vídeo, que é antigo. Algo que suas vítimas não mais poderão fazer.
O vídeo não deixa de levantar uma pergunta:os homens que estavam ao lado dele, no presídio, enaltecendo sua conversão, já deixaram suas filhas perto dele? (Veja o vídeo abaixo)
Seita, mortes e canibalismo: o que aconteceu?
Entre 2008 e 2012, Jorge Beltrão, sua esposa Isabel Cristina Pires da Silveira e a amante Bruna Cristina Oliveira da Silva formavam uma seita chamada “Cartel”, cujos membros diziam seguir uma missão espiritual de "purificação da humanidade" por meio da eliminação de mulheres que, segundo eles, seriam “impuras” ou “excessivas” na sociedade.
A primeira vítima foi Jéssica Camila da Silva Pereira, de 17 anos, assassinada em maio de 2008, em Olinda. O corpo foi esquartejado, e partes da carne foram congeladas e consumidas grelhadas pelo trio — algumas, inclusive, teriam sido dadas à filha da própria vítima, na época com um ano de idade.
Em 2012, dois outros crimes vieram à tona: Gisele Helena da Silva, 31 anos, e Alexandra da Silva Falcão, 20, foram sequestradas, mortas e tiveram partes do corpo usadas no preparo de salgados, como empadas e coxinhas, vendidos a moradores da cidade de Garanhuns. Clientes relataram, mais tarde, que os produtos tinham sabor estranho ou estavam muito salgados. Sem saber da origem dos ingredientes, consumiram carne humana.
Prisões, julgamentos e penas
A investigação policial descobriu os crimes após uma denúncia anônima. O trio foi preso em 2012, e os julgamentos aconteceram em duas etapas:
Em 2014, foram condenados pelo homicídio de Jéssica. Jorge recebeu 21 anos e 6 meses de prisão, enquanto Isabel e Bruna foram condenadas a 19 anos e 3 meses.
Em 2018, o Tribunal do Júri analisou os assassinatos de Gisele e Alexandra. Jorge foi condenado a 71 anos, Bruna a 71 anos e 10 meses, e Isabel a 68 anos de reclusão.
Em 2019, após recursos, as penas foram revistas e aumentadas: Somente pela morte de Jéssica, Jorge foi condenado a 27 anos, e as duas mulheres, 24 anos cada, além de um ano e meio de detenção.
Todos foram responsabilizados pelos crimes de homicídio triplamente qualificado, vilipêndio de cadáver, ocultação de cadáver e canibalismo — com agravantes por motivo torpe e uso de meio cruel.
Repercussão internacional
A brutalidade dos crimes teve repercussão fora do Brasil. Veículos como BBC, The Independent, Daily Mail e Le Monde publicaram reportagens sobre o caso, destacando o uso de carne humana nos salgados e a justificativa mística do grupo. Jorge chegou a declarar em entrevistas que acreditava estar em uma missão para “purificar a raça humana”.
Esquizofrenia e lucidez: os laudos psiquiátricos
Durante o julgamento, a defesa de Jorge alegou que ele sofria de esquizofrenia paranoide e, por isso, teria agido sem plena consciência. De fato, Jorge chegou a escrever um livro, "Revelações de um Esquizofrênico", no qual descreve suas alucinações desde a infância e o suposto papel espiritual de suas ações. No entanto, os laudos apresentados pelo psiquiatra forense da acusação afirmaram que os três agiram com total discernimento, planejamento e frieza. A tese de coação de Isabel e Bruna também foi rejeitada.
Do horror à conversão?
O novo vídeo que circula mostra Jorge em um cenário religioso, identificado como líder espiritual e referindo-se à Bíblia. Ele afirma estar “transformado” e pede perdão pelos erros do passado. A autenticidade da gravação foi confirmada por fontes ligadas ao sistema penitenciário. O condenado cumpre regime no Presídio Policial Penal Leonardo Lago, no Complexo Prisional do Curado, na Zona Oeste do Recife.
E a sua aparição pública reabriu o debate sobre a possibilidade de reabilitação de pessoas que cometeram crimes bárbaros. Nas redes, muitos reagiram com incredulidade e revolta, principalmente familiares das vítimas.
Um crime que não será esquecido
Mais de uma década depois, o caso dos "Canibais de Garanhuns" ainda é visto como um dos episódios mais perturbadores da crônica policial brasileira. Mais do que os crimes em si, o caso expõe feridas profundas sobre fanatismo, distúrbios mentais e os limites da justiça e do perdão.
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