Caravana no Sertão do Pajeú denuncia descaso e alta violência contra mulheres
Região tem altos índices de violência doméstica, mas não possui Delegacia da Mulher nem rede estruturada de proteção, segundo coletivos
A região do Pajeú será palco, nesta terça-feira (25), da II Caravana pelo Fim da Violência contra as Mulheres. Agricultoras, lideranças sindicais, coletivos feministas e organizações sociais de vários municípios se reúnem para denunciar a escalada da violência e cobrar políticas públicas permanentes.
A concentração ocorre às 7h30, no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Afogados da Ingazeira, e o ato segue às 8h. Depois da marcha, o público vai ao Cine São José para assistir ao documentário O Bem Virá, seguido de debate.
Violência crescente e cobrança por políticas públicas
A mobilização destaca a ausência de serviços essenciais, como Delegacia da Mulher e rede de acolhimento. “Estamos nas ruas para denunciar todas as formas de violência que atravessam as vidas de mulheres e meninas, e cobrar a presença efetiva do Estado, que continua ausente em questões que já apontamos há muito tempo”, afirma Graciete Santos, presidenta da Casa da Mulher do Nordeste.
Os números reforçam a pressão. Entre 2012 e 2024, Afogados da Ingazeira saltou de 77 para 478 casos de violência doméstica e familiar; Itapetim, de 30 para 1.013; e Serra Talhada, de 364 para 750.
Só entre janeiro e setembro de 2025, Afogados já soma 285 ocorrências. No Estado, a Secretaria de Defesa Social (SDS) registrou 71 feminicídios entre janeiro e outubro deste ano, aumento de 16% em relação ao mesmo período do ano anterior.
O caso Yasmin e a sensação de insegurança
A região vive episódios recentes que ampliaram o clima de medo. Em Carnaíba, Yasmin Pereira da Silva, 7 anos, foi encontrada morta após 40 dias de buscas. Edson Antônio da Silva, o “Tripa”, confessou o crime depois que exame genético confirmou a compatibilidade do material biológico colhido, conforme divulgado pela Tribuna Online.
A Polícia Civil informa que ele foi indiciado por homicídio qualificado, com agravantes. Preso em 9 de outubro, ele também é investigado diante dos indícios de violência sexual apontados pela família.
Dificuldades de acesso à proteção
Coletivos destacam as barreiras enfrentadas por mulheres da zona rural para registrar ocorrências, conseguir medidas protetivas ou acessar acolhimento adequado. “Falta uma Delegacia da Mulher no Pajeú, falta fortalecimento da rede e serviços que respeitem e acolham as vítimas”, afirmam. As reivindicações incluem ainda justiça climática, valorização do trabalho das mulheres nos territórios e divisão justa das tarefas domésticas.
Articulação regional
A Caravana é organizada pela Casa da Mulher do Nordeste em parceria com o Fórum de Mulheres do Pajeú, Centro Sabiá, Diaconia, Rede de Mulheres Produtoras do Pajeú, Fetape, Núcleo Jurema (via Baraúnas dos Sertões), Secretaria da Mulher de Afogados da Ingazeira e Raízes da Caatinga, com apoio da Misereor.
O retrato da violência doméstica no Pajeú: o que mostram os dados proporcionais
O levantamento proporcional do Tribuna Online PE revela um cenário mais crítico do que o indicado pelos números absolutos. Ajustando os registros de violência doméstica pela população estimada pelo IBGE para 2025, Afogados da Ingazeira aparece como a cidade com maior incidência: 74,3 casos para cada 10 mil habitantes, muito acima das demais.
A análise desmonta a ideia de que violência doméstica se concentra apenas nos municípios grandes. Brejinho, Calumbi e Santa Cruz da Baixa Verde — todos com menos de 12 mil habitantes — exibem taxas elevadas, mostrando que o problema se espalha por áreas onde a rede de proteção é ainda mais limitada.
O painel proporcional indica vulnerabilidades amplas: municípios pequenos, com pouca oferta de serviços, têm dificuldade maior de garantir acesso a canais de denúncia. É essa geografia do risco que os movimentos sociais têm destacado para reforçar a urgência de uma Delegacia da Mulher no Pajeú.
📍 Registros de violência doméstica de janeiro a outubro deste ano nos municípios do Pajeú
Segue o ranking proporcional (do maior para o menor), com casos — população — taxa por 10.000 habitantes (arredondada para uma casa decimal):
1 - Afogados da Ingazeira — 317 casos — 42.672 hab. — 74,3 /10.000 hab.
2 - Brejinho — 44 — 8.033 — 54,8 /10.000 hab.
3 - Serra Talhada — 540 — 98.816 — 54,6 /10.000 hab.
4 - São José do Egito — 176 — 32.508 — 54,1 /10.000 hab.
5 - Santa Cruz da Baixa Verde — 62 — 11.934 — 52,0 /10.000 hab.
6 - Itapetim — 72 — 14.236 — 50,6 /10.000 hab.
7 - Calumbi — 27 — 5.354 — 50,4 /10.000 hab.
8 - Carnaíba — 81 — 19.533 — 41,5 /10.000 hab.
9 - Tabira — 119 — 29.180 — 40,8 /10.000 hab.
10 - Triunfo — 58 — 15.141 — 38,3 /10.000 hab.
11- Iguaracy — 43 — 11.347 — 37,9 /10.000 hab.
12 - Tuparetama — 29 — 8.261 — 35,1 /10.000 hab.
13 - Solidão — 18 — 5.386 — 33,4 /10.000 hab.
14 - Flores — 58 — 20.776 — 27,9 /10.000 hab.
15 - Santa Terezinha — 28 — 10.487 — 26,7 /10.000 hab.
16 - Ingazeira — 8 — 4.975 — 16,1 /10.000 hab.
17 - Quixaba — 6 — 6.753 — 8,9 /10.000 hab.
Cálculo feito com base nos casos ÷ população × 10.000 (taxa por 10.000 habitantes).
Fontes usadas: números de violência da SDS e estimativas populacionais do IBGE 2025.
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