Nobel da Paz premia organização japonesa que atua pela abolição das armas nucleares
Entidade é formada por sobreviventes das bombas atômicas lançadas em 1945 pelos Estados Unidos sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki
Escute essa reportagem
O Nobel da Paz de 2024 premiou a Nihon Hidankyo, organização japonesa que atua pela abolição das armas nucleares. O anúncio, feito pelo comitê da premiação nesta sexta-feira (11), foi justificado pelo fato de que o tabu a respeito do uso de armas nucleares está sob pressão no mundo.
A entidade é formada por sobreviventes das bombas atômicas lançadas em 1945 pelos Estados Unidos sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, acontecimento que completará 80 anos em 2025. As explosões, com três dias de diferença, mataram mais de 200 mil pessoas, sem contar as mortes em decorrência da radiação. No Japão, os atingidos pelas bombas são chamadas de hibakusha.
"Os hibakusha estão recebendo o Prêmio Nobel da Paz por seus esforços para alcançar um mundo livre de armas nucleares e por demonstrar, por meio de testemunhos, que as armas nucleares nunca devem ser usadas novamente", disse o presidente do comitê do Nobel, Joergen Watne Frydnes, durante o anúncio. "Eles nos ajudam a descrever o indescritível, a pensar no impensável e, de alguma forma, a compreender a dor e o sofrimento incompreensíveis causados pelas armas nucleares."
O copresidente da Nihon Hidankyo, Toshiyuki Mimaki, afirmou que a vitória ajudará a organização a pedir ao mundo pela desnuclearização e, assim, "alcançar a paz eterna". "As armas nucleares devem ser absolutamente abolidas", afirmou ele em uma entrevista coletiva em Hiroshima.
O primeiro-ministro Shigeru Ishiba, que assumiu o posto no Japão há apenas dez dias, também se manifestou durante uma viagem a Laos. "É extremamente significativo que a organização que trabalhou para abolir as armas nucleares tenha recebido o Prêmio Nobel da Paz", afirmou.
Não é a primeira vez que o comitê norueguês joga luz sobre a questão —a mais recente demonstração de apoio à desnuclearização foi em 2017, quando premiou a Campanha Internacional para Abolir Armas Nucleares.
Antes disso, em 2005, quando a Agência Internacional de Energia Atômica, da ONU, foi a premiada, o comitê citou a Nihon Hidankyo pela sua atuação no tema. A entidade, aliás, já havia sido nomeada —em 1985 e 1994, o Gabinete Internacional Permanente para a Paz, vencedor de 1910, indicou a organização japonesa.
"Uma guerra nuclear poderia destruir nossa civilização", afirmou Frydnes. "Portanto, é alarmante que hoje esse tabu contra o uso de armas nucleares esteja sob pressão."
O presidente do comitê não citou nomes, mas a declaração é uma referência indireta às ameaças de uso desse tipo de arma por potências nucleares. De acordo com a Federação dos Cientistas Americanos, nove países têm arsenais atômicos no mundo: Rússia, EUA, China, França, Reino Unido, Paquistão, Índia, Israel e Coreia do Norte.
Em setembro, a Rússia, que constantemente faz menções ao possível uso desse tipo de armamento, usou a tribuna da Assembleia-Geral da ONU para renovar suas ameaças ao falar sobre a Guerra da Ucrânia, país invadido por Moscou em 2022 e que recebe amplo apoio do Ocidente.
"Os atuais estrategistas anglo-saxões não só não escondem seus planos de tentar derrotar a Rússia usando o regime ilegítimo neonazista de Kiev, mas também preparam a Europa para se lançar nessa campanha suicida. Nem vou começar a falar sobre a falta de sentido e o perigo de cogitar lutar contra uma potência nuclear, como a Rússia", disse o chanceler russo, Serguei Lavrov.
Ao todo, 286 candidatos haviam sido indicados à láurea neste ano, dentre os quais 197 eram indivíduos e 89, organizações. O número é menor do que o do ano passado, quando houve 351 indicações, e do que o de 2016, quando houve uma cifra recorde de 376 candidatos.
Mais curiosidades sobre a lista de indicados, no entanto, só poderão ser sanadas daqui a 50 anos. Os candidatos e aqueles que os indicaram —que envolvem, entre outros, líderes de países e quem eventualmente já foi laureado— ficam em sigilo por cinco décadas.
O Nobel foi concedido pela primeira vez em 1901. Inicialmente, eram cinco categorias: paz, literatura, química, física e medicina. Uma sexta —economia— foi adicionada décadas mais tarde, em 1969.
Até a metade do século 20, os laureados na principal categoria eram "políticos ativos que procuravam promover a paz internacional, a estabilidade e a justiça por meio da diplomacia e de acordos internacionais".
Desde o fim da Segunda Guerra, porém, o prêmio passou a reconhecer esforços nas áreas de desarmamento, democracia e direitos humanos. Na virada para o século 21, o foco foi ampliado para incluir iniciativas que tentem conter a crise climática causada pelo homem.
Conheça os últimos dez vencedores do Nobel da Paz
2023: A ativista dos direitos humanos iraniana Narges Mohammadi, 51, por apoiar a luta das mulheres pelo direito de elas terem vidas plenas e dignas.
2022: O ativista da Belarus Ales Bialiatski, o Memorial, grupo de direitos humanos da Rússia, e o Centro para Liberdades Civis da Ucrânia, por demonstrarem a importância da sociedade civil para a paz e a democracia
2021: Os jornalistas Maria Ressa (filipina) e Dmitri Muratov (russo), pela defesa que fazem da liberdade de expressão, pré-requisito para a democracia e a paz duradoura
2020: Programa Mundial de Alimentos (PMA), por atuar como uma força motriz nos esforços para prevenir o uso da fome como arma de guerra e conflito
2019: O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, que assinou acordo de paz que pôs fim a duas décadas de hostilidades com a Eritreia
2018: O congolês Denis Mukwege e a iraquiana Nadia Murad, que denunciaram a violência em relação a vítimas de violência sexual como arma de guerra
2017: Campanha Internacional para Abolir Armas Nucleares (Ican), por chamar a atenção para o risco de armas nucleares
2016: Juan Manuel Santos, ex-presidente da Colômbia que negociou o acordo de paz com as Farc
2015: Quarteto para o Diálogo Nacional da Tunísia, pela contribuição decisiva na construção de uma sociedade plural no país
2014: A paquistanesa Malala Yousafzai e o indiano Kailash Satyarthi, premiados pela defesa dos direitos das crianças e à educação
Comentários