Coreia do Sul pode fornecer armas à Ucrânia após acordo entre Rússia e Coreia do Norte
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O governo da Coreia do Sul afirmou nesta quinta-feira, 20, que considera enviar armas para a Ucrânia após a Rússia e a Coreia do Norte assinarem um acordo de segurança. O gabinete do presidente sul-coreano, Yoon Suk-yeol, condenou o pacto e alertou que teria consequências negativas nas relações entre Seul e Moscou.
O pacto entre a Rússia e a Coreia do Norte marca uma mudança política no leste asiático ao estabelecer a garantia de defesa mútua em caso de guerra. "É absurdo que duas partes com um histórico de lançar guerras de invasão - a Guerra da Coreia e a guerra na Ucrânia - agora prometam cooperação militar mútua com base na premissa de um ataque preventivo por parte da comunidade internacional que nunca acontecerá", disse o gabinete de Yoon.
Segundo observadores, o acordo também é a aproximação mais relevante entre os dois países desde o fim da Guerra Fria e reabre a discussão sul-coreana sobre enviar armas à Ucrânia. Seul, um crescente exportador de armas com um Exército bem equipado com apoio dos EUA, havia considerado essa possibilidade no passado, mas a ideia não se materializou por uma política antiga de não fornecer armas a países envolvidos em conflitos ativos.
Nos dois anos de guerra, o apoio de Seul a Kiev foi restrito ao fornecimento de ajuda humanitária e a adesão às sanções econômicas lideradas pelos Estados Unidos contra a Rússia.
De acordo com Jenny Town, pesquisadora sênior do Stimson Center, baseado em Washington, essa posição da Coreia do Sul já havia prejudicado as relações com a Rússia, mas o pacto atual pode elevar isso ao ponto limite entre os dois países. "Agora, eliminada qualquer ambiguidade da parceria da Rússia com a Coreia do Norte, como reage Seul?", disse. "Existe um ponto em que decida cortar ou suspender os laços diplomáticos com a Rússia ou expulsar o seu embaixador? Chegamos lá?".
Entenda o acordo de segurança
O pacto de segurança entre a Coreia do Norte e a Rússia faz parte de uma série de acordos firmados entre o líder norte-coreano, Kim Jong-un, e o presidente russo, Vladimir Putin, no encontro dos dois na quarta-feira, 19, em Pyongyang. Os dois descreveram os acordos como uma atualização de relações bilaterais que abrangem comércio, investimento e laços culturais e humanitários, além da segurança.
No que diz respeito à segurança, os termos publicados pela Agência Central de Notícias Coreana (KCNA) dizem que se um dos países for invadido e levado a um estado de guerra, o outro deve mobilizar "todos os meios à sua disposição sem demora" para fornecer "militares e outros assistência." O texto também reconhece que a ação deve estar em conformidade com as leis de ambos os países e com o artigo 51.º da Carta das Nações Unidas, que reconhece o direito de um Estado-membro da ONU à autodefesa.
Putin declarou que o acordo é "um documento verdadeiramente revolucionário", e que a Rússia "não descarta a cooperação técnico-militar" com a Coreia do Norte. "O tratado de parceria abrangente assinado hoje prevê, entre outras coisas, a assistência mútua em caso de agressão contra uma das partes do tratado", disse o russo em Pyongyang, a capital norte-coreana.
O líder norte-coreano, Kim Jong-un, prometeu total apoio à guerra da Rússia na Ucrânia antes de se reunir com Putin.
Desde a Guerra Fria não havia um pacto deste nível entre os dois países. Em 1961, a Coreia do Norte e a antiga União Soviética assinaram um tratado que, segundo analistas, exigia a intervenção militar de Moscou caso Pyongyang fosse atacado. O acordo foi descartado após o colapso da URSS e substituído por outro em 2000, que oferecia garantias de segurança mais fracas.
Há uma discussão sobre o quão forte é o compromisso de segurança que o acordo implica. Embora alguns analistas vejam o acordo como uma restauração total da aliança dos países da era da Guerra Fria, outros dizem que parece mais simbólico do que substancial. "O quadro geral aqui é que ambos os lados estão dispostos a colocar no papel e mostrar ao mundo até que ponto pretendem expandir o âmbito da sua cooperação", afirmou Ankit Panda, analista do Carnegie Endowment for International Peace.
Tensões em alta
Nos últimos meses, Kim fez da Rússia a sua prioridade ao promover uma política externa que visa expandir as relações com os países que confrontam Washington. Em paralelo, as tensões na Península Coreana estão no seu ponto mais alto em anos, com o ritmo dos testes de armas de Kim e dos exercícios militares combinados envolvendo os EUA, a Coreia do Sul e o Japão a se intensificarem num ciclo de retaliação.
As Coreias também se envolveram numa guerra psicológica ao estilo da Guerra Fria, que envolveu a Coreia do Norte a lançar toneladas de lixo no Sul com balões, e a Coreia do Sul a transmitir propaganda anti-Norte-Coreana com os seus altifalantes.
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