Capital dos terremotos na Rússia ainda treme, diz morador
Afanasiev afirmou à Folha de S.Paulo que estava em casa na manhã quando houve um estrondo e tudo passou a balançar violentamente
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Conhecida como a capital dos terremotos na Rússia, Petropavlovsk-Kamtchatski passou esta quarta-feira (30) tremendo. "Nunca vi nada igual", contou o guia turístico Egor Afanasiev, 43, que mora há quase três décadas na cidade.
Afanasiev afirmou à Folha de S.Paulo que estava em casa na manhã quando houve um estrondo e tudo passou a balançar violentamente. O relógio batia 8h25 (17h25 de terça, 29, em Brasília), e o tremor de magnitude 8,8 durou mais de três minutos —o mais forte no mundo desde o de 2011, que causou o desastre nuclear de Fukushima.
"Estamos acostumados, mas foi o mais forte que já vi. Fiquei muito assustado e corri para a rua", disse, por mensagem no começo da noite, fim da madrugada no Brasil.
Por segurança, ele foi para sua datcha, as tradicionais casas de campo dos russos, perto da capital de 165 mil habitantes —dos 345 mil que moram em Kamtchatka. Todo ano, a península tem milhares de eventos sísmicos, 130 deles na casa da magnitude 4, e 16, na casa 6, segundo o serviço geológico da Academia de Ciências da Rússia.
Ao longo do dia, houve ao menos 30 réplicas do tremor, algumas bem fortes. "Tudo ainda treme. Ao lado de casa, parte de um prédio desabou", conta Afanasiev, em referência a uma creche vizinha. "É muita sorte ninguém ter morrido", disse, em referência aos feridos que a prefeitura local contou na casa de dezenas, nenhum muito grave.
O epicentro do tremor desta quarta foi a cerca de 125 km a sudeste da cidade, a uma profundidade considerada baixa, de 19,3 km. Isso amplificou sua potência e o colocou, segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos, em sexto lugar como o mais forte da história conhecida.
O tremor desencadeou ordens de retirada em todo o Pacífico, incluindo Havaí, Alasca, Califórnia, Canadá, Equador, Indonésia, Filipinas, México e Colômbia. Os temores de destruição generalizada, no entanto, não se concretizaram.
Pouco após o tremor, autoridades russas informaram que havia relatos de pessoas com ferimentos leves e prédios danificados no leste do país. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, afirmou que não houve vítimas devido à qualidade das construções na região e ao bom funcionamento dos sistemas de alerta.
O quinto lugar do ranking dos terremotos mais fortes da história também pertence a Kamtchatka. Em 1952, a região foi devastada por um terremoto de magnitude 9. Toda essa atividade é cortesia da posição geográfica da península, no Extremo Oriente russo, junto às falhas do chamado Círculo de Fogo do Pacífico, que circunda o oceano homônimo.
A região tem nada menos que 29 vulcões ativos, o local mais concentrado desse tipo de atividade geológica na Terra. Outros 160 estão dormentes. O sismo provocou uma erupção no maior vulcão ativo de toda a Eurásia, o Kliutchevskoi, que tem 4.750 metros de altura e tem atividade registrada desde 1697. Sua idade é estimada em 7.000 anos.
Só a cidade de Petropavlovsk tem três vulcões à sua volta, tão intensos que figuram no escudo da cidade. Se isso parece perigoso, também traz oportunidades. Afanasiev foi com o pai, militar, para a região pouco depois do fim da União Soviética. Ele é de Kaliningrado, 11 fusos horários distantes, no território mais ocidental da Rússia.
Acabou virando guia turístico, levando montanhistas e aficionados em natureza para ver os vulcões, lagos, trilhas e a fauna nativa —de tempos em tempos, um turista é morto pelos inúmeros ursos da região.
Com isso, o turismo passou a competir com a pesca como atividade econômica mais rentável da península, que durante os tempos soviéticos era fechada por sediar instalações militares estratégicas: há submarinos nucleares da Frota do Pacífico baseados por lá, e o campo de Kola é um dos principais alvos para mísseis intercontinentais lançados em testes do outro lado da Rússia.
O perfil do turismo mudou com a Guerra da Ucrânia, em 2022, e os japoneses que costumavam render bons negócios por sua predileção por usar helicópteros em deslocamentos de mais de US$ 700 desapareceram. Mas houve aumento do turismo interno, e em 2024 a península registrou 365 mil visitantes, ante 240 mil em 2019.
Petropavlovsk em si fica numa baía e tem sua parte habitacional principal, composta por medonhos e desolados blocos soviéticos, em um ponto mais alto. Assim, o tsunami que varreu Severo-Kurilsk, nas mais meridionais ilhas Kurilas, não atingiu a cidade.
Mas houve vários danos e sustos. Câmeras de circuito interno registraram uma das imagens mais impressionantes do tremor, uma equipe médica do centro de oncologia da cidade sendo surpreendida pelo terremoto em meio a uma cirurgia.
Os médicos seguram o paciente na mesa operatória durante o tremor, sem perder a calma, e continuam o procedimento na sequência. Segundo a agência Tass, o paciente passa bem.
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