Capixaba celebra acesso com a Chapecoense: "Estou vivendo um sonho"
Fisiologista Breno Bonetti detalha os bastidores do ano que terminou com festa e projeta o que espera para 2026
Um ano depois de desembarcar em Chapecó para assumir a fisiologia da Chapecoense, o capixaba Breno Bonetti vive o ponto mais alto da carreira. Contratado em setembro de 2024 após se destacar por duas temporadas na Desportiva, o fisiologista de 31 anos coleciona agora um feito histórico: participou diretamente da campanha que recolocou a Chape na elite do futebol brasileiro.
Mestre, doutorando pela Ufes e integrante de grupos de pesquisa na área do futebol, o profissional que não figurava em nenhuma divisão do futebol brasileiro, hoje encerra sua primeira temporada completa na Chape celebrando o acesso, refletindo sobre o crescimento profissional e reafirmando o orgulho de representar o Espírito Santo no cenário nacional.
Nesta entrevista exclusiva ao Jornal A Tribuna, Breno revisita a trajetória recente, detalha os bastidores do ano que terminou com festa e projeta o que espera para 2026.
A Tribuna: O acesso finalmente veio! Como você descreveria esse momento pessoalmente e profissionalmente depois de uma temporada tão intensa?
Breno Bonetti: Estou vivendo um sonho com esse momento, foi uma temporada de muito trabalho e de superação, e graças a Deus deu tudo certo para o acesso à elite do futebol brasileiro.
Como foi o impacto da sua área (fisiologia) na campanha do acesso? Que dados ou indicadores foram decisivos para a preparação da equipe?
Assim como todos os demais departamentos no clube, a fisiologia foi fundamental e diretamente nesta campanha do acesso. Conseguimos gerar muitas informações de desempenho físico e da saúde dos atletas.
Acredito que os indicadores bioquímicos, exames de imagens termográficas, testes neuromusculares (salto vertical) e os feedbacks individuais dos atletas a respeito do bem-estar, que são realizados após uma partida, foram fundamentais para que pudéssemos passar informações precisas à comissão técnica.
O que mais evoluiu no seu trabalho desde que chegou à Chapecoense até agora?
A grande evolução foi o repertório que adquiri e o fato de ter a experiência de viver diariamente em um cenário de elite com profissionais renomados.
Quais foram os principais desafios físicos da equipe ao longo da Série B?
O grande desafio é manter o atleta apto a ter o máximo desempenho ao longo de vários jogos consecutivos.
Você chegou a Chapecó falando sobre a seriedade do clube e o calor da torcida. O que mudou na sua percepção ao longo desse ano? E como você se sente na cidade?
Sigo com a mesma percepção: a seriedade de todos os profissionais envolvidos no clube e a paixão dos torcedores são os responsáveis por todo o sucesso.
E o meu sentimento sobre a cidade de Chapecó é algo que me marca bastante, as pessoas são extremamente receptivas e a segurança é impecável. Tenho muito orgulho de morar com minha esposa nessa cidade do Oeste de Santa Catarina.
Como você vê hoje o papel da Chapecoense no futebol brasileiro, voltando à elite?
Vejo um papel de superação. É surpreendente o que esse clube passou ao longo da sua história, saindo de um cenário restrito à competição estadual e chegando às competições internacionais.
Em seguida, passou pelo trágico acidente de 2016, tendo que recomeçar tudo do zero para se reerguer e, hoje, voltamos à elite nacional com um clube extremamente responsável financeiramente.
Isso se deu porque a diretoria administra suas obrigações com excelência, passando por um processo de recuperação judicial que foi concluído com sucesso em setembro de 2025, sendo o primeiro clube de futebol brasileiro a atingir esse feito.
A torcida sempre carrega uma memória emocional muito forte por causa da tragédia de 2016. Como isso afeta o dia a dia no clube e o sentimento de responsabilidade no trabalho?
Todo jogo é dedicado a cada atleta e aos demais profissionais envolvidos no acidente. Temos muito orgulho de resgatar esse sentimento do torcedor e também das pessoas que já trabalhavam no clube na época da tragédia e estão até hoje. No dia do jogo do acesso, foram celebrados 9 anos da milagrosa defesa do goleiro Danilo, garantindo a classificação para a final da Copa Sul-Americana.
Você saiu da Desportiva sonhando com um salto na carreira. O acesso à Série A consolida esse capítulo como um divisor de águas?
Com certeza, esse acesso é um divisor de águas na minha carreira. “Ontem” estava em um time sem série no campeonato brasileiro e hoje estou na Série A.
O Espírito Santo ainda sofre para revelar profissionais para o futebol nacional. Acredita que sua trajetória pode inspirar outros fisiologistas e preparadores do Estado?
Minha trajetória já inspira outros profissionais, pois consegui deixar um legado marcante na vida de vários jovens que tentaram ser atletas profissionais na época em que eu trabalhava no futebol capixaba.
Hoje, tenho vários ex-atletas que cursam Educação Física e sonham ser professores e preparadores físicos.
Além disso, tenho vários colegas de profissão que lutam diariamente para alavancar suas carreiras e, consequentemente, o futebol capixaba.
Você costuma trabalhar diretamente com dados de carga física, desempenho e prevenção de lesões. Qual foi o maior case de sucesso desse acesso? Como manter o grupo fisicamente e mentalmente ativo?
Desde que mudamos de "piso", da grama natural para a sintética, a maioria dos nossos atletas apresentou quadro de dores articulares após as partidas. Isso exigiu demais de todos os departamentos (médico, fisioterapia, fisiologia e físico): tivemos que nos unir e buscar a recuperação mais rápida possível dos atletas para a partida seguinte.
Com certeza, a entrega dos atletas em condições de jogo para o treinador foi o grande caso de sucesso nesse acesso.
Também conseguimos manter o grupo bem fisicamente e mentalmente através do alto nível dos profissionais do staff e, claro, devido ao profissionalismo de nossos jogadores. Eles são, com certeza, os grandes responsáveis por isso!
A Chape será uma das cinco equipes da elite em 2026 que terá gramado sintético. Como isso pode beneficiar a equipe e o que muda com relação aos gramados naturais?
O benefício do gramado sintético é a regularidade do piso e a velocidade que a bola pode atingir durante a partida, tornando um jogo de ações rápidas e intensas.
Há alguma mudança na preparação física ou fisiológica ao subir da Série B para a Série A? O que muda de imediato?
Estudos científicos já corroboram a ideia de que quanto maior o nível de competição, mais intensa fica a partida, aumentando, por exemplo, o volume de ações de alta intensidade e sprints (parâmetros que os dispositivos de GPS nos fornecem).
Portanto, o nível físico dos nossos atletas precisa ser mais intenso e veloz. Dessa forma, buscaremos métodos de treino que nos proporcionem o desenvolvimento ideal dessas capacidades físicas.
Quais são suas metas pessoais agora que chegou à Série A? Segue na Chape para 2026, uma vez que seu contrato acabaria agora em dezembro?
Tenho contrato para a próxima temporada, pois me tornei um funcionário “CLT”. Minha meta pessoal é seguir na Chape nessa nova temporada, conseguir a permanência na elite do futebol para 2026.
Como você projeta o seu trabalho e o 2026 do time?
Será um ano desafiador, teremos 5 competições ao longo da temporada, um nível mais competitivo e adversários com maior poder financeiro.
Existe algum sonho específico dentro da profissão — disputar Libertadores, trabalhar na Europa, Seleção?
Todo profissional de qualquer área pretende chegar o mais alto possível. Eu gostaria — e vejo que é possível — disputar uma Libertadores e, como sonho, chegar à Seleção Brasileira.
Mas o que mais me encanta, de coração, é chegar à elite com um time do Espírito Santo, disputar a Série A e a Libertadores na nossa terra maravilhosa.
Se você pudesse mandar um recado para o Breno de um ano e pouco atrás — o que chegou da Desportiva cheio de expectativa — o que diria a ele agora, depois do acesso?
Valeu a pena a luta e cada momento dedicado ao meu futuro. Minha trajetória foi desafiadora e concorrida, exigindo muito estudo e trabalho.
O que me guiou foi a crença de que viver honestamente e com muita fé em Deus — valores ensinados um dia pelo meu falecido pai e pela minha guerreira mãe — daria certo hoje.
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