Caetano, Marisa Monte e Marina Sena cobram ética no uso da IA na música
Eles cobram um marco regulatório que exija transparência das ferramentas de IA e das grandes plataformas
Caetano Veloso, Marisa Monte e Marina Sena se juntaram a uma campanha de conscientização pela regulamentação do uso da inteligência artificial na indústria da música e das artes.
A ação é capitaneada pela União Brasileira de Compositores, a UBC, e a Pró-Música Brasil, de representantes da indústria fonográfica.
O mote da campanha é que "toda criação tem dono" e que "quem usa paga".
Segundo o texto de divulgação da campanha, o objetivo é que "a revolução da inteligência artificial aconteça com transparência, remuneração justa e respeito a quem cria".
Eles cobram um marco regulatório que exija transparência das ferramentas de IA e das grandes plataformas, "obrigando-as a declarar o uso de obras protegidas em treinamentos e ofertas de serviços", e a firmar contratos ou pagar licenças sempre que houver utilização.
Também defendem que titulares de direitos das obras possam autorizar ou proibir o uso de suas obras em treinamentos de IA, "que haja clareza total sobre quais fontes são utilizadas, quando e como as criações são usadas, e que, se uma música está treinando e alimentando padrões de algoritmos que geram lucro, seus titulares recebam parte desse retorno". "Em síntese, o pedido é que a tecnologia caminhe ao lado de quem cria, e não se sobreponha aos criadores."
A diversidade e a abundância da produção cultural brasileira fazem do país um pote de ouro para as ferramentas de treinamento da IA generativa. Reportagem da Folha de S.Paulo mostrou que pelo menos três empresas de americanas usaram livros de autores brasileiros para treinar seus sistemas sem pedir autorização ou pagar por isso, apelando a cópias piratas que circulam na internet. Pesquisadores da área chamam isso de extrativismo de dados.
Países e organizações internacionais têm feito uma corrida pela delimitação das quatro linhas, com o desafio de proteger, sem prejudicar o desenvolvimento da indústria, quem pode ser ameaçado pelo avanço da IA generativa —na cultura, não são poucos.
Apesar de a discussão ser recente, já é possível identificar algumas vertentes. Há quem defenda que os dados só poderiam ser utilizados mediante autorização prévia dos detentores dos direitos autorais da obra. Há quem visualize um modelo de remuneração coletiva. Muitos concordam com um sistema em que o detentor dos direitos teria de avisar caso não queira permitir o uso de seus dados pela ferramentas de IA, o que é chamado de "cláusula de opt-out".
Há ainda quem avalie que o uso para treinamento de ferramentas de IA não fere os direitos autorais da obra, ou que esse tipo de uso poderia ser enquadrado no conceito de "fair use", que abre exceções para uso de material protegido, como acontece em sátiras ou quando a parcela do material usada é considerada ínfima.
Quem saiu na frente em termos de regulação foi a União Europeia, com seu "AI Act", publicado em julho do ano passado —a primeira versão do projeto foi apresentada já em 2021.
O texto não se debruça longamente sobre remuneração a detentores de direitos autorais e prefere citar diretivas mais antigas sobre o tema, mas traz a inovaão de falar mais explicitamente sobre transparência dos sistemas de treinamento de IA. O "AI Act" determina que provedores de modelos de IA de uso geral devem disponibilizar publicamente um resumo "suficientemente detalhado" sobre o conteúdo usado para o treinamento da ferramenta.
No Brasil, houve a criação da Comissão Especial sobre Inteligência Artificial, em abril, na Câmara, que tem discutido o projeto de lei 2338/23, o chamado PL da IA.
No texto, há uma seção que se dedica aos direitos autorais e conexos, que caminha numa direção semelhante à da União Europeia. O artigo 62 diz que "o desenvolvedor que utilizar conteúdo protegido por direitos de autor e conexos deverá informar sobre os conteúdos protegidos usados nos processos de desenvolvimento dos sistemas de IA".
O texto afirma que não constitui ofensa aos direitos de autor a mineração de dados caso ela seja feita por instituições de pesquisa e educacionais, museus, arquivos públicos e bibliotecas, caso não haja fins comerciais. O acesso sempre precisa ser feito de forma lícita.
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