Polícia Federal investiga venda de dados de aposentados a golpistas
PF procura saber quem fornece as informações sigilosas, oferecidas em ligações, conforme relatou uma advogada
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A Polícia Federal investiga o vazamento de dados sigilosos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Independente de ter a aposentadoria aprovada, profissionais que disponibilizaram seus dados no sistema do instituto reclamam do uso indevido das informações.
Entre os casos, há segurados que tiveram a aposentadoria negada e receberam mensagens de supostos advogados oferecendo assessoria jurídica. E também quem teve a aposentadoria aprovada e recebeu ligações de financeiras, oferecendo dinheiro emprestado, antes de a carta do INSS chegar.
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Enquanto estelionatários compram dados para tentar angariar clientes, profissionais que não têm a mesma índole sofrem com este tipo de ação.
A advogada especialista em Direito Previdenciário Kenia Pacífico de Arruda revelou que também existe assédio para a compra dessas informações. “Aqui no meu escritório, já recebemos uma mensagem de um número desconhecido ofertando dados de segurados à venda. Nós bloqueamos o número”.
Ela contou que esse tipo de atitude é uma afronta muito grande aos ditames da ética de uma profissão que tem restrições na divulgação do trabalho, quando o cliente deve ir até o advogado e não ao contrário.
“Você ter acesso a dados de terceiros, sem autorização, já é uma violação à intimidade, à privacidade. Não se pode fazer isso, muito menos entrar em contato com o cliente.”
Golpistas assediaram três clientes do escritório da especialista em direito previdenciário Catarine Mulinari. “Um suposto advogado entrou em contato com elas. Na mensagem tinha o nome delas e o benefício que elas pediram e que foi negado pelo INSS, dizendo que ele estava disposto a buscar judicialmente essa reversão no INSS”.
Existe uma captação irregular.
“Um advogado não pode disparar mensagens para as pessoas dizendo que está disponível para o serviço. O mais assustador para mim é o acesso aos dados. As três clientes entraram em contato conosco e perguntaram se era do escritório. Explicamos que não e perguntamos se tinham procurado outro profissional. Elas disseram que não. Orientamos que bloqueassem o número.”
Assédio insistente após equívoco
A advogada previdenciarista Maria Regina Couto Uliana contou que o INSS disponibilizou uma nova ferramenta para benefício rural. “Testando as funcionalidades, acabei gerando, sem querer, um requerimento de aposentadoria por idade, que obviamente foi indeferido”.
Ela contou que dias depois começou a ser assediada insistentemente, recebendo ligações até de madrugada, de robôs representando supostos advogados oferecendo assessoria jurídica. “É uma abordagem extremamente invasiva, de alguém que tem na mão todos os seus dados”, revelou.
Aposentados sem descanso
O presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados no Estado, Jânio Araújo, contou que recebe no WhatsApp mensagens de empresas oferecendo dados de aposentados.
Segundo ele, a situação é tão absurda que sua mulher soube que se aposentou por
meio da ligação de uma financeira oferecendo consignado.
“A financeira ligou para ela oferecendo empréstimo antes mesmo do advogado dela saber que a aposentadoria dela tinha sido aprovada.”
SAIBA MAIS
Denúncia
Profissionais que buscam seus direitos junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) relatam que estão sofrendo assédio devido ao vazamento de seus dados.
Eles acontecem das mais diversas formas. Se o benefício é aprovado, vêm as ligações de financeiras oferecendo empréstimo consignado. Se o benefício não é aprovado, as mensagens vêm de supostos advogados oferecendo assessoria jurídica.
Empréstimo
Alguns aposentados relatam que ficaram sabendo da própria aposentadoria por financeiras, que ligaram oferecendo empréstimos.
Outros relatam que a partir do momento em que aposentaram não tiveram mais paz, recebendo ligações insistentes de bancos e financeiras oferecendo empréstimo consignado.
Assessoria jurídica
Vítimas relatam ter sofrido assédio de supostos advogados, por meio de mensagens de WhatsApp, oferecendo assessoria jurídica, para quem teve o pedido de aposentadoria ou outro benefício indeferido.
Advogados reclamam ter sofrido assédio de supostos advogados que querem vender dados de beneficiários do INSS ou trabalhadores que tentaram benefício junto ao órgão.
Guardião dos dados?
Os dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) são guardados pelo Dataprev. Por meio de nota, a empresa disse que “não fornece os dados hospedados e/ou mantidos pela empresa a terceiros”.
Informou ainda que “dispõe de várias medidas de segurança e rotinas que garantem a integridade de acessos dos seus sistemas, por exemplo a adoção do cofre de senhas – solução tecnológica que tem o objetivo de melhorar a governança e a segurança nos acessos aos ambientes monitorados e auditados”.
Investigação
A polícia federal já divulgou que investiga o assunto. Demandada no dia último dia 10 sobre o andamento da investigação, ela não respondeu até o dia 14. Disse que a demanda foi enviada para área técnica. Mas não retornou com a resposta, no prazo.
Responsabilidade
Apesar de haver muitas vítimas, a grande maioria delas não busca a Justiça para ter seu direito à privacidade respeitado. Por outro lado, há vários relatos de pessoas que estão sendo assediadas por estelionatários vendedores dessas informações.
Tanto advogados quanto o próprio presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados relatam já terem sido abordados por empresas querendo vender dados.
Condenação
Há condenação tanto do INSS quanto do Dataprev, por exemplo, em reação ao vazamento de dados pela turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. No caso, uma mulher buscou seus direitos depois de ter o benefício de pensão por morte pago, passando a ser assediada por financeiras que sabiam até o valor do benefício. Os valores das indenizações envolvendo esse tipo de processo variam. Neste caso foi de R$ 2.500 .
LGPD
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) estabelece as diretrizes para coleta, tratamento e processamento de dados pessoais e entrou em vigor em 2020.
É considerado tratamento de dados: coleta, produção, recepção, acesso, classificação, utilização, transmissão, distribuição, processamento, armazenamento, eliminação, extração ou difusão.
A autarquia Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais (ANPD) é responsável por fiscalizar seu cumprimento.
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