Penhora de aposentadoria e milhas aéreas para dívidas
Regra de cobrança tem sido aplicada por tribunais de primeira instância, com base na decisão do Superior Tribunal de Justiça
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Há um ditado que diz que para toda regra há uma exceção, e agora, esse princípio tem sido aplicado pela Justiça brasileira. Até bem pouco tempo, os valores pagos a título de aposentadoria e as milhas, consideradas um recurso limitado ao setor aéreo, não poderiam ser penhorados.
Agora, tanto a aposentadoria paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) quanto as milhas aéreas podem ser penhoradas para o pagamento de dívidas.
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Segundo dados do SPC Brasil, do mês de abril, o Estado tem 771.323 pessoas inscritas na lista de inadimplentes do serviço de proteção ao crédito.
Desse total, 34,34%, que correspondem a aproximadamente 264 mil, em caso de dívida, a depender do valor, podem ter parte da aposentadoria descontada em folha para quitar débitos em aberto.
A regra tem sido aplicada por tribunais de 1ª instância, com base na decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Corte tem determinado de maneira recorrente a penhora de salários e aposentadorias do INSS para o pagamento de dívidas. Antes, essa penhora só era válida para rendas acima de 50 salários mínimos. Agora, é possível reter percentuais de 10% a 30% da renda para ser penhorados.
Em um dos casos que determinou a penhora da aposentadoria, o juiz defendeu que o desconto de 30% não seria prejudicial à subsistência da família, já que o trabalhador continuaria recebendo 70% da renda do INSS.
Para o advogado Alexandre Puppim a decisão do STJ desfaz limitações antigas.
“Antes, decisões assim se limitavam aos salários de contratos com carteira assinada e agora alcançam aqueles com renda proveniente de trabalho autônomo e aposentadorias”, afirmou.
Essa tendência de penhora de salários e aposentadorias está se espalhando pelo País, com decisões judiciais em diversos estados. Porém, é fundamental que a análise seja feita caso a caso, considerando as particularidades de cada situação e garantindo uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família.
“É necessário buscar por outros bens penhoráveis e garantir os princípios de razoabilidade e proporcionalidade para não comprometer o devedor”, alerta Puppim.
Decisões ainda não são consenso
A lei mais antiga instituída no País é de 1892, mas desde lá, a legislação se adapta aos novos tempos. Com o “boom” das milhas aéreas, não há consenso se elas podem ser consideradas bem patrimonial.
Sem regulamentação específica sobre o tema, a Justiça, por exemplo, impediu a Caixa Econômica Federal de penhorar milhas de um cliente inadimplente.
O banco, que tem um cliente com dívida de R$ 59 mil em empréstimo, argumentou que as milhas têm valor econômico e podem ser comercializadas. O caso tramitou no Tribunal Federal do Sul do País e o magistrado que julgou a ação argumentou que a falta de legislação específica regulatória da venda de milhas exclui a possibilidade de sua conversão em dinheiro.
Advogado do consumidor, Norton Scalzer esclarece que mesmo que as companhias incluam cláusulas de inalienabilidade – quando o cliente fica impedido de vender o bem fruto do acordo – presentes nos regulamentos dos programas de milhagem das companhias aéreas, a Justiça pode derrubar o que foi firmado.
“Caso não haja nenhum outro bem, a penhora pode ser aceita, mesmo que só ao ser apreciada em instâncias superiores, é possível, sobretudo porque são comercializadas em diversos sites, o que permite a conversão das milhas em pecúnia”, disse Scalzer, destacando que há necessidade de análise de cada caso.
Direito a transferências
No Direito brasileiro existe a seguinte regulamentação: quando o pai ou a mãe morrem, os herdeiros têm direito aos bens, mas há um impasse na legislação.
Se as milhas aéreas podem ser vendidas e convertidas em dinheiro, elas podem ser consideradas parte do patrimônio do titular e transmitidas aos filhos?
Pensando nisso, uma das maiores companhias aéreas do País inseriu uma cláusula contratual que veda a transferência para terceiros, inclusive por sucessão ou herança, de milhas aéreas.
O caso foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu que não é abusiva a determinação da companhia aérea.
Na cláusula de companhia, a determinação proibia a transferência para terceiros, inclusive por sucessão ou herança, de milhas aéreas.
A Associação Brasileira de Defesa do Consumidor propôs ação civil pública contra a empresa, em virtude de cláusulas no contrato de adesão que regula o programa de fidelidade.
A decisão declarou a nulidade – quando a torna sem efeito – de cláusula para que os pontos acumulados não mais sejam cancelados com a morte do titular, para beneficiar os consumidores que perderam milhas em razão do cerceamento do direito de herança.
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