Motoristas têm trabalhado mais e ganhado menos
Estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas aponta que profissionais que atuam por aplicativos tiveram queda nos rendimentos
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O número de motoristas por aplicativo e entregadores no País têm crescido a cada ano, mas os profissionais que atuam nessas funções estão ganhando cada vez menos e trabalhando cada vez mais.
É o que revelou o estudo “Plataformização e Precarização do Trabalho de Motoristas e Entregadores no Brasil”, parte da 77ª edição do Boletim de Mercado de Trabalho, apresentado na última terça-feira (21) pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea).
Segundo o levantamento do Ipea, o número de motoristas atuando de forma autônoma no transporte de passageiros passou de 400 mil em 2012 para 1 milhão em 2022. Nos mesmos dez anos, o rendimento médio destes profissionais caiu de R$ 3.100 para R$ 2.400.
A partir de dados da Pnad Contínua, do IBGE, os pesquisadores Sandro Sacchet de Carvalho e Mauro Oddo Nogueira analisaram em que medida o crescimento da chamada “plataformização” do trabalho levou a uma precarização da rotina de motoristas de transporte de passageiros e entregadores.
A análise apontou que enquanto o número de motoristas não para de crescer na última década, a variação da renda média deles tem trajetória de queda. No pico da série histórica, a renda alcançou cerca de R$ 3.100, mas caiu a R$ 2.600 em 2017 e depois a pouco menos de R$ 2.200 em 2021. Em 2022, houve uma melhora no cenário.
Luiz Fernando Muller, presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativo do Estado (Amapes), relata que, no Espírito Santo, a situação está “complicada” e que há motoristas trabalhando de 3 a 4 horas a mais para conseguir ganhar o que ganhavam antes.
“Ontem (terça-feira, 21) eu mesmo deixei de rodar no dia porque os valores não estavam compensando. Desde que as conversas sobre regulamentação começaram, essa situação vem se agravando. Parece que o Uber pegou o valor mínimo por hora do projeto, e transformou no teto. Antes se fazia em média R$ 45 por hora, agora se faz cerca de R$ 34. Está complicado”.
O que diz a pesquisa
Remuneração caiu...
A análise do IPEA apontou que enquanto o número de motoristas não para de crescer na última década, a variação da renda média deles tem trajetória de queda. No pico da série histórica, a renda alcançou cerca de R$ 3.100, mas caiu a R$ 2.600 em 2017 e depois a pouco menos de R$ 2.200 em 2021. Em 2022, houve uma melhora no cenário, para R$ 2.400.
O mesmo aconteceu entre os entregadores. Assim como no caso dos motoristas de passageiros, a expansão de entregadores "plataformizáveis" está associada a uma redução da renda média, segundo os pesquisadores.
Em 2015, quando havia apenas 56 mil entregadores na atividade de malote e entregas, a renda média era de R$ 2.250. Seis anos depois, quando o país contabilizava 366 mil entregadores, a renda média recuou para R$ 1.650. Em 2022, o patamar foi a cerca de R$ 1.800.
...e jornada aumentou
Enquanto isso, a jornada destes profissionais aumenta ano a ano. Enquanto em 2012 21,8% dos motoristas de passageiros autônomos diziam trabalhar de 49 a 60 horas semanais, em 2022 a fatia saltou a 27,3%
Contribuição previdenciária
A contribuição previdenciária de motoristas também vai contra a tendência dos demais trabalhadores, tanto os sem carteira quanto os que trabalham por conta própria: enquanto estes passaram a contribuir mais ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), entre os motoristas autônomos o patamar caiu de 47,8% em 2015 para 24,8% em 2023.
O volume de entregadores que contribuem à Previdência Social também despencou, passando de mais de 60% em 2014 para 54,3% em 2016 e indo a pouco menos de 30% em 2020.
O que as empresas dizem
Sobre os dados da pesquisa e o relato de motoristas de aplicativo, a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec) informou que está analisando os dados divulgados pelo Ipea.
Ressaltou, ainda, que o levantamento do Cebrap, com base em dados administrativos das empresas, revela que os ganhos de entregadores e motoristas eram de R$ 3.039 e R$ 4.756, respectivamente, portanto, maiores que os R$ 1.800 e R$ 2.400 citados no estudo do Ipea e acima do valor pago a outros trabalhadores com mesma escolaridade.
Segundo a Associação, consideramos positiva a realização de estudos que ratificam a necessidade de um debate sobre inclusão previdenciária, ganhos mínimos para os trabalhadores e preservação da autonomia, pontos que vêm sendo defendidos pela associação na regulamentação do trabalho de motoristas e entregadores por aplicativos.
Fonte: Ipea, pesquisa A Tribuna e Amobitec.
Contribuição para o INSS despenca de 47% para 24,8%
A contribuição previdenciária de motoristas também vai contra a tendência dos demais trabalhadores, tanto os sem carteira quanto os que trabalham por conta própria: enquanto estes passaram a contribuir mais ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), entre os motoristas autônomos o patamar caiu de 47,8% em 2015 para 24,8% em 2023.
O volume de entregadores que contribuem à Previdência Social também despencou, passando de mais de 60% em 2014 para 54,3% em 2016 e indo a pouco menos de 30% em 2020.
Ao todo, 35,7% dos profissionais que prestam serviços por aplicativo contribuem para a Previdência Social, patamar bem abaixo dos 61,3% registrado entre os demais trabalhadores brasileiros, formais e informais, do setor privado.
O estudo calculou que o país tem 2,1 milhões de trabalhadores atuando em plataformas digitais.
Desse total, 1,5 milhão – ou 71% – são aqueles que prestam serviços por aplicativo, principalmente como motoristas de passageiros ou entregadores de comida e produtos. Mas esse grupo inclui também profissionais como tradutores e de TI e trabalhadores como encanadores, diaristas, pedreiros e qualquer um que ofereça seus serviços via plataformas.
Governo Lula insiste em criar legislação para a categoria
O governo federal persiste na tentativa de criar uma regulamentação para a profissão de motoristas por aplicativo, mas têm enfrentado diversos desafios no caminho.
Isso porque a proposta, apresentada em março pelo governo, gerou uma onda de protestos dos próprios trabalhadores e também enfrenta resistências no Congresso. Responsável pela elaboração do texto, o ministro Marinho tem sido cobrado a atuar para conter a crise.
A avaliação no governo é que o texto, feito em meio a ameaças às plataformas e rumores de que as empresas poderiam deixar o país, foi mal divulgado. Nesta quarta-feira (22), o presidente Lula se reuniu com o CEO global do Uber, Dara Khosrowshahi, no Palácio do Planalto. O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, também participou da reunião.
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