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Economia

Entenda a PEC que dá autonomia financeira ao BC

Proposta está em discussão na Comissão de Constituição e Justiça do Senado


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Imagem ilustrativa da imagem Entenda a PEC que dá autonomia financeira ao BC
Proposta quer conceder autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira ao Banco Central |  Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado pode voltar a discutir nesta quarta-feira (17) —em sessão semipresencial na véspera do recesso parlamentar— a PEC (proposta de emenda à Constituição) que concede autonomia financeira ao Banco Central.

Na última semana, a votação foi adiada após o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que é contra a PEC, sinalizar a possibilidade de um acordo. Governistas articulam para que votação fique para o segundo semestre e não descartam abandonar a PEC e construir um novo texto, como um projeto de lei.

De autoria do senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), a proposta recebeu parecer favorável do relator, senador Plínio Valério (PSDB-AM), e conta com o apoio do presidente do BC, Roberto Campos Neto.

Desde 2021, o BC possui autonomia técnica e operacional assegurada por lei. A autoridade monetária, contudo, continua sem ter poder sobre o seu próprio orçamento. Entenda os principais pontos da proposta em debate.

ENQUADRAMENTO JURÍDICO

A PEC propõe transformar o BC –hoje uma autarquia de natureza especial– em uma instituição de natureza especial com autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira, "organizada sob a forma de empresa pública e dotada de poder de polícia, incluindo poderes de regulação, supervisão e resolução".

Conceder autonomia orçamentária ao BC significa que a instituição terá capacidade de elaborar, aprovar e executar o próprio orçamento, de forma independente do governo. Por autonomia financeira, entende-se a capacidade de utilizar receitas próprias, geradas por seus ativos, para custear despesas com pessoal e com investimentos, por exemplo.

SERVIDORES

A mudança do enquadramento jurídico afeta a relação de trabalho dos servidores do BC, que deixam de ser regidos pelas normas do RJU (Regime Jurídico Único) e passam a ser empregados públicos regulamentados pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Foram incorporados ao texto elementos para preservar a estabilidade dos funcionários da autoridade monetária, mesmo com a alteração na natureza jurídica do BC. Diferentemente de uma empresa comum, os trabalhadores da instituição só poderão ser demitidos em caso de "sentença judicial transitada em julgado" (ou seja, sem possibilidade de recurso) ou de "cometimento de falta grave" após apuração de processo disciplinar.

Também foram criadas regras provisórias para aposentadoria buscando mitigar os impactos negativos gerados pela mudança de regime previdenciário. Nesse sentido, a PEC determina ao BC arcar com os custos financeiros relacionados às despesas previdenciárias dos servidores, tanto daqueles hoje na ativa, quanto dos atuais aposentados e pensionistas.

Uma ala dos servidores, representada pelo Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central), rejeita a proposta em discussão. Já o grupo encabeçado pela ANBCB (Associação Nacional dos Analistas do Banco Central do Brasil) vê a PEC como uma saída para fortalecer a instituição, mas defende aperfeiçoamentos.

O governo também resiste à mudança. Parecer jurídico feito pela liderança do governo no Senado afirma que reenquadrar os servidores como trabalhadores sujeitos à CLT não tem precedentes e pode gerar impactos indesejáveis para outras categorias do serviço público.

QUESTÃO FISCAL

Conforme o texto da PEC, o BC deixa de ser considerado integrante do governo central (que compreende hoje o Tesouro Nacional e a Previdência Social, além da autoridade monetária) e passa a ser classificado como corporação financeira pública.

Em 2023, o resultado primário do BC foi um déficit de R$ 465 milhões. Se as novas regras já estivessem em vigor, a conta do governo central teria sido mais superavitária com a exclusão do resultado negativo da autoridade monetária.

Na metodologia atual das estatísticas fiscais, os fluxos financeiros entre o BC e o Tesouro Nacional não impactam as NFSP (Necessidades de Financiamento do Setor Público). Se houver a reclassificação do BC, os fluxos passam a ser considerados primários, como os das demais empresas públicas.

Isso significa que os resultados positivos ou negativos do BC seriam classificados como dividendos, gerando receitas ou despesas primárias, assim como as capitalizações do BC pelo Tesouro Nacional.

O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), diz temer o potencial impacto primário em caso de aporte do Tesouro para cobrir eventuais prejuízos do BC na gestão das reservas internacionais. Em linha com essa preocupação, a Casa Civil divulgou uma nota afirmando que a PEC ameaça a viabilidade do arcabouço fiscal com impacto primário de cerca de R$ 125 bilhões no PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2025.

Os defensores da proposta, por outro lado, argumentam que o impacto direto da PEC é de redução dos gastos primários em R$ 5,5 bilhões por ano.

JABUTI

Foi incluído no texto um jabuti —dispositivo que foge à temática original do projeto— blindando os cartórios de futuras inovações da autoridade monetária. A medida, contudo, poderia comprometer a implementação do real digital (Drex), que já está em fase de testes.

Diante da repercussão negativa, o relator mudou o texto e acrescentou um dispositivo adicional ressalvando "a operacionalização de novos produtos financeiros, que vierem a ser criados ou regulados pelo Banco Central, a partir da utilização de novas tecnologias no processo de criação de produtos do sistema financeiro".

DIVERGÊNCIAS

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, quer deixar a autonomia como legado de sua gestão (seu mandato termina em 31 de dezembro), mas a proposta enfrenta resistência do governo. O presidente Lula criticou reiteradas vezes a autonomia da instituição.

Segundo um parecer feito pela liderança do governo no Senado, a PEC do BC é inconstitucional, cria insegurança jurídica para os servidores e coloca em xeque a fiscalização de instituições financeiras.

Na semana passada, entretanto, Jaques Wagner e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmaram que a gestão petista não é contra a autonomia financeira do BC, mas sim contra a transformação da autoridade monetária em empresa pública.

"A autonomia financeira e administrativa do Bacen, não há nenhum problema conosco, nenhum. A forma de atingi-la é que nós não concordamos, de transformar o Bacen em uma empresa [pública]" disse Wagner na quarta-feira (10).

Para Haddad, é válida a autonomia financeira do BC, mas não a independência completa. "Nós entendemos que transformar o Banco Central em uma empresa, de direito privado, não vai ser bom. Entendemos que o caminho é outro", afirmou na sexta (12).

Parlamentares governistas não descartam ainda a possibilidade de abandonar a PEC em discussão e viabilizar a autonomia financeira do Banco Central por meio de outro instrumento legal, como projeto de lei.

TRAMITAÇÃO

Mesmo se a PEC for aprovada na CCJ, o tema não deve avançar rapidamente no Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que o momento é de "botar água na fervura" e que ainda não há perspectiva de colocar a PEC em votação no plenário –onde precisa do voto de ao menos 49 dos 81 senadores em dois turnos para ser aprovada.

Pacheco citou as "divergências" entre Lula e Campos Neto e disse que o debate deve ser "alongado", considerando a opinião do próprio governo federal, dos servidores do BC e do sistema financeiro.

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